Thursday, October 29, 2015

Fracasso como motor do sucesso

Pedro J. Bondaczuk

O escritor francês Honoré de Balzac foi um sujeito do tipo em que as circunstâncias da sua vida rivalizam, em interesse, com a obra que produziu. E olhem que esta foi assombrosa, tanto em quantidade, quanto em qualidade. Foi gênio das letras e isso ninguém discute. Basta ver a quantidade de escritores que influenciou, a maioria hoje clássicos da Literatura mundial, entre os quais inclui-se o nosso Machado de Assis. O sujeito foi um fenômeno! Entre outras coisas, devemos-lhe a criação do Realismo nas letras mundiais. Notabilizou-se por suas agudas observações psicológicas, sobretudo das mulheres (mas não somente delas), que compreendia como poucos. Não por acaso, virou “adjetivo” das figuras femininas de determinada idade.

Quem nunca ouviu a expressão “balzaquiana”? Ela é utilizada, há muito tempo e o tempo todo, para caracterizar mulheres cuja idade seja igual ou próxima ou mesmo um tantinho superior aos trinta anos. Sua vasta obra mostra que as conhecia como poucos. Ousaria dizer, até, que como ninguém. Era um “expert” no universo feminino. Captou, e descreveu, gostos, temores, pensamentos, sentimentos etc. etc.etc. das fêmeas de diversas idades e condições econômicas e sociais, variando, apenas, em intensidade. A origem desse adjetivo é o primoroso romance de Balzac “A mulher dos trinta anos”, obra-prima sem igual. Nem precisava dizer. Afinal...

O que choca o estudioso de Literatura é a constatação que sua genialidade literária, sua incrível criatividade, seu incomparável poder de observação eram proporcionais à sua incompetência quando se tratava de fazer negócios. O sujeito era um rotundo, completo e absoluto fracasso quando o assunto era ganhar dinheiro. Metia-se em transações absurdas. Perdia fortunas num piscar de olhos. Era um verdadeiro “pato”, desses que uma criança de seis anos embrulharia com a maior facilidade, sem fazer qualquer esforço. Vivia, pois, endividado, atolado em contas a pagar sem quase nada a receber,  com a corda no pescoço, premido (ou espremido?) por credores, que não lhe davam trégua. Curiosamente, esses desastres financeiros, constantes, onipresentes e repetitivos transformaram-se em principal combustível para exercitar sua genialidade. Foi um homem que feza do fracasso (como negociante) o motor de seu sucesso (como escritor).

Tinha que escrever, escrever e escrever, incansável e doidamente, e publicar de imediato o que escrevia, para conseguir algum dinheiro para pagar dívidas, posto que seus ganhos fossem sempre insuficientes. Para sorte dele, tinha um talento absurdo, que talvez nem ele soubesse que fosse tanto e que, portanto, não valorizasse. Para que o leitor tenha uma idéia, a coleção de romances, novelas e contos que escreveu, intitulada “A comédia humana”, consiste de 95 livros, nos quais Balzac retratou todos os níveis da sociedade francesa do seu tempo. Porém, sabem o que mais? O escritor achou que não havia esgotado o assunto. Diga-se de passagem que nunca foi repetitivo. Todos esses livros são rigorosamente originais, geniais, únicos. Pois não é que Balzac ainda não estava satisfeito?!!! Seu plano era o de escrever mais, muito mais, pelo menos  o mesmo tanto de livros que já havia escrito, o que só não fez porque a morte não deixou. Morreu relativamente jovem (até para aquele tempo, a primeira metade do século XIX), em 18 de agosto de 1850, aos 51 anos de idade. Pudera! Nem mesmo máquinas, feitas de aço, resistem a tanta atividade.

Todavia, Balzac não se limitou, apenas, a escrever romances, novelas e contos. “A comédia humana”, por si só fenômeno de produtividade e criatividade, está longe, muito longe de se constituir em seu único legado às letras mundiais. Escreveu, também, "estudos filosóficos" (como “A Procura do Absoluto”, 1834) e estudos analíticos (como a “Fisiologia do Casamento”, que causou escândalo ao ser publicado em 1829). Foi “só” (como se isso fosse pouco)?!!! Longe disso! Escreveu “Du Droit d'aînesse” (1824), “Histoire impartiale des Jésuites” (1824), “Code des gens honnêtes” (1826), etc,etc.etc. E muitos eteceteras! É verdade que não fez fortuna com sua obra. Ao contrário, morreu devendo para Deus e o mundo. Porém conquistou algo que para qualquer escritor é o mais importante: o reconhecimento da posteridade. Influenciou romancistas, também geniais, como Eça de Queiroz, Gustave Flaubert, Marcel Proust, Henry James, etc.etc.etc. Segue influenciando milhares e milhares de escritores, mundo e tempo afora, mesmo que não reconheçam essa influência e sequer a identifiquem. Que sujeito mais estranho foi esse tal de Balzac!!!!


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