Thursday, October 01, 2015

Empréstimo compulsório


Pedro J. Bondaczuk

O decreto que instituiu o empréstimo compulsório sobre os preços dos combustíveis, carros novos, semi-novos (com entre um e dois anos de fabricação) e os usados (com até quatro anos), além de passagens aéreas e venda de dólares para turistas que viajavam para o Exterior, completou, ontem, exatos dez anos. No entanto, pouquíssimas pessoas viram a cor desse dinheiro a que tinham (e têm) direito. E estão destinadas a nunca ver.

Os que conseguiram receber, recorreram ao Poder Judiciário. Os demais? Estão a ver navios. Apenas serão reembolsados caso tenham condições e disposição para recorrer à Justiça. São R$ 7 bilhões, transformados e corrigidos para a atual moeda. Importância nada desprezível, como se observa.

É maior do que a prevista para ser arrecadada pela Contribuição Provisória (que ganha ares de permanência) sobre Movimentação Financeira, o imposto que supostamente vai tirar a saúde do buraco. Dessa forma, o "empréstimo" ficou, na verdade, caracterizado como mero confisco.

O decreto de Sarney previa a devolução do dinheiro em três anos. O tempo foi passando, as "experiências" econômicas foram se sucedendo, e fracassando uma a uma, e nada do mau pagador devolver o que emprestou. Sequer juros ou correção monetária foram pagos.

No governo do presidente Itamar Franco bem que se tentou alguma coisa nesse sentido. O próprio Planalto encaminhou, em 1993, um projeto ao Congresso, aprovado nas duas casas, regulamentando a devolução. E por que o dinheiro não foi devolvido? Por recomendação do então ministro Fernando Henrique Cardoso. Itamar vetou a medida. Tudo voltou à estaca zero.

"E o que se fez com toda essa bolada?", indaga o paciente credor, até já conformado com o calote, desde que este tenha servido para uma boa causa. Virtualmente nada. Possivelmente foi utilizado para custear a perdulária e nem sempre (ou quase nunca) eficiente máquina do governo.

O objetivo do presidente da época, José Sarney, era dos mais ambiciosos, pelo menos no que se referia à retórica. Junto com o empréstimo compulsório, o decreto instituía o Fundo Nacional de Desenvolvimento, destinado a financiar o "Plano de Metas da Nova República". E este, por sua vez, seria a "arrancada para que o Brasil tivesse nível de vida da Europa Mediterrânea".

Passados dez anos, continuamos patinando na rota do subdesenvolvimento, com a maior concentração de renda do mundo e com Índice de Desenvolvimento Humano abaixo dos da Costa Rica, Panamá, Colômbia, Venezuela, etc. O pior é que o projeto do governo de reforma tributária prevê novos empréstimos compulsórios, quando necessários. Mas não pagaram sequer o de 1986!


(Artigo publicado na página 3, Opinião, do Correio Popular, em 23 de julho de 1996)

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