Personagens femininas
de Monteiro Lobato
Pedro
J. Bondaczuk
O escritor Monteiro
Lobato criou alguma personagem feminina inesquecível? Esta é a pergunta, em tom
de “pegadinha”, que mais tenho ouvido de uns tempos para cá. Esse
questionamento acentuou-se notadamente desde que passei a abordar o tema
referente ás mulheres protagonistas de grandes romances, contos e novelas na
literatura mundial. O assunto, por si só, é tão polêmico como este homem de
letras, adorado por gerações que leram seus livros voltados à faixa infantil
quando crianças e odiado por políticos e por pessoas que não aceitam opiniões
contrárias às suas e que tentam destruir quem as emite. A biografia de Monteiro
Lobato é tão rica que renderia uma infinidade de comentários que, certamente, gerariam
acalorados debates, com opiniões favoráveis e contrárias ao que foi e,
sobretudo, às suas ações. Esse, porém, não é o tema destas minhas
considerações.
Possivelmente algum dia
eu trate desse assunto, comentando seus êxitos e fracassos, seus acertos e
erros, que dão “pano para muita manga”. Por ora, todavia, me restringirei em
responder ao questionamento, em tom de “pegadinha”, que mitos me têm feito de
uns tempos para cá. Minha resposta à indagação é SIM!!! Monteiro Lobato criou
personagens femininas inesquecíveis, sobretudo em seus livros voltados ao
público infantil, que se constituem, apenas, em metade ou pouco menos de sua
vasta, eclética e copiosa obra literária. Por uma série de razões, que não irei
sequer mencionar (cada qual conclua por si), apenas suas histórias pára
crianças se impuseram e se popularizaram. A tal ponto que, os que nada sabem a
seu respeito, ou conhecem muito pouco, acham que ele não escreveu e não
publicou mais nada que não fosse literatura infantil.
E quais seriam essas personagens
femininas inesquecíveis? Quem leu a obra de Monteiro Lobato ou assistiu às
várias séries de televisão que ela ensejou (foram seis, se não me falha a
memória) cita-as de imediato, sem pestanejar. Aliás, à exceção de Pedrinho, do
Visconde de Sabugosa e do Marquês de Rabicó, nenhum outro protagonista
masculino ocupou posição que não fosse a de “meros figurantes”. Minha dúvida é
uma só: qual das quatro personagens femininas, presentes na quase totalidade
das histórias infantis que criou, é “mais” inesquecível?
É Dona Benta, a avó dos
meninos, que se destacou por seus educativos, edificantes e inteligentes
serões? É Tia Nastácia, em torno da qual girou (e ainda gira) absurda polêmica
sobre pretenso racismo do escritor, o que levou muitos a defenderem o banimento
dos livros de Monteiro Lobato das escolas públicas do País? É Lúcia, tratada
pelo apelido de Narizinho, por ter um nariz um tanto (e graciosamente)
arrebitado e que por isso passou a ser tratada assim? Ou é Emília, a boneca de
pano, feita por Tia Nastácia, que não só falava pelos cotovelos, mas tinha e
emitia surpreendentes opiniões, que à primeira vista pareciam enormes
disparates, mas que se revelavam de cristalina sabedoria? Para mim, não se
trata, sequer, de escolha. Por que tenho que escolher apenas uma, se as quatro
são absolutamente inesquecíveis?!!.
Os que fizeram o citado
questionamento, com intenção de que fosse “pegadinha”, exigem-me a exclusão de
Emília desse rol. Discordo. Meus questionadores argumentam que essa
protagonista não se trata de pessoa, mas de uma boneca de pano. Ora, ora, ora.
O tema em questão é sobre personagens femininas e não especificamente sobre
“mulheres”. Teriam razão, portanto, se essa protagonista fosse um “boneco”
(poderia ser, por que não?). Mas não é. Ademais, Emília tem todas as
características psicológicas femininas. Incluo-a,. sim, nessa relação. E mais
do que isso: destaco-a. Talvez (e notem bem, digo, apenas, “talvez”) a intenção
do escritor fosse a de destacar Narizinho.
E por que cheguei a
essa conclusão? Porque tudo começou para ele com o livro “A menina do narizinho
arrebitado”, que publicou em 1920, A partir daí, deu continuidade à sua
fantasia, dada a aceitação da história original pelas crianças, e deu no que
deu: a imortal saga (e não reluto em tratá-la assim) que foi a coleção “Sítio
do picapau amarelo”. Foi o sucesso junto à meninada que motivou Monteiro Lobato
a explorar, mais e mais e mais, esse tema. Deu no que deu, reitero. Li, pela
primeira vez, seus livros quando tinha por volta de dez anos de idade, na
biblioteca da escola em que estudava. Desde então, fiz tantas releituras, em
épocas as mais diversas de vida, que não saberia especificar quantas foram. Li,
por exemplo, cada um dos livros para meus quatro filhos. E planejo fazê-lo para
meu neto mais novo, o João Vítor, que já mostrou interesse pelas histórias
quando lhe mencionei o assunto.
Pra quem contesta que
Dona Benta, Tia Nastácia, Narizinho e Emília sejam personagens femininas
inesquecíveis, proponho que façam um teste. Perguntem às crianças que leram os
livros ou que assistiram à série “Sítio do picapau amarelo” na televisão, o que
elas acham destas quatro. Duvido que não tenham opinião semelhante, ou
parecida, ou igualzinha (o que é mais provável) à minha. Elas não irão mentir.
E nem dar a entender que sejam o que não são. A meninada tende a ser sincera.
Por isso, Monteiro Lobato decidiu escrever prioritariamente para elas. São
elas, e não o público adulto, que o tornaram “imortal” no cenário literário. O
escritor explicou, em certa ocasião, o motivo dessa opção: "De escrever
para marmanjos já estou enjoado. Bichos sem graça. Mas para crianças um livro é
todo um mundo". E estava errado? Eu também, se tivesse 1% do seu talento,
agiria da mesmíssima forma. Escreveria para a meninada e conquistaria seus
corações e mentes para sempre.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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