Plágio
e citação
Pedro J. Bondaczuk
Os
direitos autorais deveriam ser sagrados para todo o mundo e, por isso,
respeitados sempre. Nem sempre o são. Eles valem não apenas para as artes, mas
para todos os tipos de criação intelectual. Contudo, a pirataria come solta por
aí, apesar do empenho das autoridades policiais para coibi-la. Esse ato de
apropriação ilícita e, portanto, indébita, de softwares, de gravações (CDs,
DVDs etc.) e de tantos e tantos produtos patenteados, traz graves prejuízos não
apenas para seus legítimos donos, mas para a economia, as artes e a cultura
entre outras atividades. Um desses danos é o de desestimular as pessoas
criativas a empenharem-se para produzir idéias e desenvolverem-nas,
beneficiando milhões e milhões de consumidores.
Em
Literatura, essa apropriação indébita recebe o nome particular de plágio. Muita
gente, porém, confunde esse crime, condenável sempre e em qualquer
circunstância, com citação. Quando cito algum escritor, não estou, em absoluto,
plagiando-o e nem me apropriando de suas idéias. Pelo contrário, estou
manifestando meu respeito por sua inteligência e criatividade e contribuindo
para a divulgação do que escreveu. Para que esse procedimento não se configure
em plágio, no entanto, tenho que dar, “sempre”, o devido crédito ao verdadeiro
autor, citá-lo no contexto em que ele escreveu e, para tornar mais clara ainda
a autoria, grafar o texto citado entre aspas, ou em negrito, ou ambos.
Já
o plágio é a apropriação (indébita, claro, reitero) de algum texto alheio (não
importa se na íntegra ou se apenas algum trecho do mesmo), e isso no caso da
Literatura, que é do que estou tratando. O plagiador age como se aquilo fosse
escrito por ele. Não raro não se dá, nem mesmo, o trabalho de alterar uma única
vírgula. Busca tirar vantagem (e não importa se material ou se apenas
intelectual) do que não fez, do que não despendeu o mínimo esforço para
produzir. Esse ato equivale a furtar algum bem tangível da vítima: sua
carteira, seu cartão de crédito, seu carro etc.
Ao
contrário da citação, em que se valoriza quem escreveu; em que se manifesta
respeito, admiração e até reverência ao seu talento; em que se o divulga e não
raro, até, o resgata do esquecimento e do ostracismo, quem plagia está
“roubando” o que o verdadeiro e legítimo autor tem de mais caro: sua memória,
sua experiência de vida, seus sonhos, seu talento e suas esperanças. Todo bom
escritor, em algum momento da carreira, cita outro, a quem admire, e em
determinado contexto em que a citação seja pertinente. Fá-lo, porém, não apenas
lhe dando o devido crédito, como, não raro, exaltando-o e reverenciando-o. Mas
jamais comete plágio, sequer por descuido. Não precisa disso. É criativo o
suficiente para merecer a designação, para mim nobilíssima, de escritor.
É
certo que determinados temas são, virtualmente, inesgotáveis e, por mais que
sejam abordados, e por mais criativos que nos achemos, salvo raríssimas
exceções (se é que elas existam), nossas idéias a propósito podem coincidir com
as expressadas por outros, não importa de onde ou de quando. Mas dada a
personalidade de cada um e as variadas circunstâncias, as semelhanças de
abordagem jamais se configurarão em igualdade. E isso não é plágio. Não se
trata de copiar o que alguém escreveu e dar a entender ou afirmar que fomos nós
que o fizemos. Isso, sim, é crime. Reitero, equivale a qualquer outro tipo de
furto. Trata-se de abordar um tema comum, mas sob nossa ótica estritamente
pessoal.
Afirmar
que determinada idéia foi criada por nós, que ninguém, em tempo algum, pensou nela,
é, no entender do escritor alemão Johann Wolfgang Göethe (e no meu,
evidentemente) arrogância. E mais: é inconsciência. Claro que sou tentado a
achar que estas minhas reflexões estão revestidas, se não por completo, pelo
menos parcialmente, de absoluta originalidade. Mas estariam? Como posso saber?
O
que conheço de literatura universal? Qual o escritor uzbeque que já li? Ou
bengali? Ou paquistanês? Ou hutu? Ou dos milhares de povos que há, espalhados
mundo afora? Todos eles têm Literatura. Todos têm lá seus escritores. Como me
achar original e inventivo depois de 13 milênios de civilização, com um número
incontável de pessoas que já passaram pelo Planeta, que refletiram, estudaram e
escreveram páginas e mais páginas que nunca chegaram e nem chegarão ao meu
conhecimento?!
Mas
essa impossibilidade de ser original não me libera, e nem a ninguém, de me
apropriar de produções alheias. De tornar-me ladrão de textos, procurando
ostentar perante a sociedade um talento que não tenho e nem nunca tive. E, não
raro, o plagiador age dessa forma vil sequer para auferir vantagens econômicas.
Faz o que faz por pura e exacerbada vaidade. E esta, quando incontrolável, cega
as pessoas.
O
escritor Matias Aires, nascido em São Paulo no século XVIII, escreveu a
propósito, no livro “Reflexões sobre a vaidade”: “Dura mais (a nossa vaidade)
do que nós mesmos, e se introduz nos aparatos últimos da morte. Que maior prova
do que a fábrica de um elevado mausoléu? No silêncio de uma urna depositam os
homens as suas memórias, para com a fé dos mármores fazerem seus nomes
imortais: querem que a suntuosidade do túmulo sirva de inspirar veneração, como
se fossem relíquias as suas cinzas”. E antes que algum desavisado, que confunde
as coisas por ignorância ou por má fé, fique tentado a me questionar, aviso que
isto acima é citação e não plágio. Estas reflexões sobre a vaidade são de
Matias Aires e não minhas.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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