Agressão gratuita
Pedro J. Bondaczuk
A indústria cinematográfica mundial vive, a exemplo de
tantas outras atividades (quer políticas, quer econômicas, quer artísticas ou
quer de várias outras naturezas) enorme crise de qualidade e, principalmente,
de criatividade, embora muitos, provavelmente, não comunguem dessa minha
opinião. Estão no seu direito. Não é por acaso que baboseiras do tipo
“Sexta-Feira 13” ,
“Rambo”, “Casa do Espanto” e tantas e tantas outras coisas tolas, embora
inofensivas, sejam produzidas em série, refletindo falta de imaginação
contundente, infelizmente aceita, passivamente, pelo público consumidor, como
suprassumo de “arte”.
Todavia, de uns tempos a esta
parte, uma nova tendência vem se manifestando devagarinho, quer no cinema, quer
na Literatura, com algumas características piores ainda: são perigosas, por se
brincar com coisas muito sérias, que alguns celerados não sabem respeitar.
Determinados produtores (e escritores), ávidos por publicidade, estão
investindo contra a religião como se fosse a atitude mais inocente e natural
que há. Misturam o sagrado e o profano em um único e podre balaio, sem medir
conseqüências, achando que com isso são “revolucionários” ou, no mínimo,
originais. Mas não são nem uma coisa e nem outra.
Que algumas pessoas não acreditem
em religiões e não queiram se vincular a nenhuma das milhares que há por aí,
tudo bem. Estão no seu direito. É questão de foro íntimo que tem que ser
respeitada. Que existam os que não crêem nem mesmo em Deus (não importa o nome
que Lhe dêem) e interpretem todos os fenômenos do universo por ótica
rigorosamente mecanicista, atribuindo a origem e o funcionamento de tudo o que
há ao acaso, a um suposto big bang ou coisa que o valha, também é um direito de
cada um e que tem que ser respeitado.
O que não concordo é a tentativa de
alguns de impor seu pensamento mediante algum tipo de coação, psicológico,
artístico ou, principalmente, físico. E disso discordo com a máxima veemência.
Sou contrário a qualquer forma de proselitismo, quer de deístas, quer de ateus,
e ainda mais utilizando a arte como instrumento. As pessoas podem acreditar no
que quiserem, desde que reservem a crença apenas para si. Podem discordar da fé
alheia e considerá-la crendices e superstições, mas sem ridicularizá-la. E
muito menos utilizando o pretexto de “fazer arte” com isso, até porque, a
reação de quem é ridicularizado pode ser imprevisível e de intensidade extrema.
Ademais, há milhões de temas a serem explorados em literatura, pintura,
escultura, cinema, teatro etc. que não seja o referente à crença.
Entendam, não sou, nunca fui e
jamais serei favorável a nenhum tipo de censura e nem poderia ser. O que
defendo é que o artista tenha bom-senso (e por que não dizer, bom gosto) e
estabelecer distância de assuntos cuja exploração pode ser interpretada como provocação,
mesmo que não seja esta a intenção. A crença e a descrença, reitero, são
questões estritamente pessoais. A rigor, ninguém tem certeza de praticamente
nada num universo complexo e misterioso. Há que se fazer distinção entre o que
se acredita e o que de fato é. Certeza, certeza mesmo, não temos praticamente
de nada. O que temos são teorias em profusão e só isso. Pode acontecer que
aquilo que nos aparente ser absurdo e ridículo hoje se comprove, mais tarde,
ser a verdade, e vice-versa.
Depois da controvérsia em torno
do filme “Je vous Salue Marie”, por exemplo, que causou tanta celeuma entre
nós, na década de 80 do século XX, a indústria cinematográfica partiu para uma
agressão ainda mais ostensiva contra metade da humanidade, que professa o cristianismo.
Produziu, e rodou, nos Estados Unidos, obra que denominou de “The Last
Temptation of Christ”. A propósito do quê? Apenas para gerar a polêmica que
gerou? Sim, porquanto sequer sucesso de bilheteria os dois filmes foram. O que
questiono é: o que obras dessa natureza (ou similares) têm a acrescentar às
artes, à cultura ou até mesmo à verdade histórica? A rigor, nada, absolutamente
nada!
Há limite para tudo, inclusive
para a ganância, para a burrice e para a falta de senso de determinados artistas
que adoram brincar com fogo. Se os produtores desses dois filmes que citei, por
exemplo, não acreditavam em nada, eles que guardassem sua descrença para si.
Que não tentassem confundir ainda mais a cabeça, já tão confusa, de bilhões de
alienados, de inocentes úteis, de robôs, vazios, que vegetam no Planeta, tão
desesperançados que só encontram refúgio nas drogas, nos mais ignóbeis vícios,
quando não no suicídio. O mesmo vale para Salman Rushdie, com seus “Versículos
satânicos”; para Dan Brown, com o “Código da Vinci” e para o caricaturista que
publicou caricatura do profeta Maomé em um jornal dinamarquês, que gerou
revolta e violência no mundo islâmico. Reputo suas decisões de explorar os
temas que exploraram de “apelação”, embora condene também, e de forma veemente,
as reações dos que se sentiram ofendidos com essas obras.
É sabido que o mundo abriga mais
de 10 milhões de loucos, a maioria absoluta dos quais à solta nas ruas e até
desconhecendo sua doença. Fanáticos de todos os tipos e graus de fanatismo há
em profusão. Para quê lhes dar pretexto para suas manifestações de insanidade e
de delírio? O papel da arte não é este. Não considero, pois, as obras citadas
como “artísticas”. O homem pode ter progredido tecnologicamente e, de fato,
progrediu demais, não há como negar. Produziu maravilhas, que no passado jamais
passaram pela mais alucinada fantasia dos sonhadores. Mas, em termos morais, de
profundidade de pensamento, de riqueza interior e de respeito às opiniões
alheias, caminhou (e muito) para trás. E alguns indícios demonstram que
regrediu aos tempos anteriores até ao de seus ancestrais das cavernas, que
cultuavam divindades e distinguiam, pelo menos, o sagrado do profano. E hoje?
Parece que ninguém está disposto a respeitar quem quer que seja, sem medir
consequências. Pobre mundo sem rumo...
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