Thursday, May 16, 2013


Agressão gratuita


Pedro J. Bondaczuk

A indústria cinematográfica mundial vive, a exemplo de tantas outras atividades (quer políticas, quer econômicas, quer artísticas ou quer de várias outras naturezas) enorme crise de qualidade e, principalmente, de criatividade, embora muitos, provavelmente, não comunguem dessa minha opinião. Estão no seu direito. Não é por acaso que baboseiras do tipo “Sexta-Feira 13”, “Rambo”, “Casa do Espanto” e tantas e tantas outras coisas tolas, embora inofensivas, sejam produzidas em série, refletindo falta de imaginação contundente, infelizmente aceita, passivamente, pelo público consumidor, como suprassumo de “arte”.

Todavia, de uns tempos a esta parte, uma nova tendência vem se manifestando devagarinho, quer no cinema, quer na Literatura, com algumas características piores ainda: são perigosas, por se brincar com coisas muito sérias, que alguns celerados não sabem respeitar. Determinados produtores (e escritores), ávidos por publicidade, estão investindo contra a religião como se fosse a atitude mais inocente e natural que há. Misturam o sagrado e o profano em um único e podre balaio, sem medir conseqüências, achando que com isso são “revolucionários” ou, no mínimo, originais. Mas não são nem uma coisa e nem outra.

Que algumas pessoas não acreditem em religiões e não queiram se vincular a nenhuma das milhares que há por aí, tudo bem. Estão no seu direito. É questão de foro íntimo que tem que ser respeitada. Que existam os que não crêem nem mesmo em Deus (não importa o nome que Lhe dêem) e interpretem todos os fenômenos do universo por ótica rigorosamente mecanicista, atribuindo a origem e o funcionamento de tudo o que há ao acaso, a um suposto big bang ou coisa que o valha, também é um direito de cada um e que tem que ser respeitado.

O que não concordo é a tentativa de alguns de impor seu pensamento mediante algum tipo de coação, psicológico, artístico ou, principalmente, físico. E disso discordo com a máxima veemência. Sou contrário a qualquer forma de proselitismo, quer de deístas, quer de ateus, e ainda mais utilizando a arte como instrumento. As pessoas podem acreditar no que quiserem, desde que reservem a crença apenas para si. Podem discordar da fé alheia e considerá-la crendices e superstições, mas sem ridicularizá-la. E muito menos utilizando o pretexto de “fazer arte” com isso, até porque, a reação de quem é ridicularizado pode ser imprevisível e de intensidade extrema. Ademais, há milhões de temas a serem explorados em literatura, pintura, escultura, cinema, teatro etc. que não seja o referente à crença.

Entendam, não sou, nunca fui e jamais serei favorável a nenhum tipo de censura e nem poderia ser. O que defendo é que o artista tenha bom-senso (e por que não dizer, bom gosto) e estabelecer distância de assuntos cuja exploração pode ser interpretada como provocação, mesmo que não seja esta a intenção. A crença e a descrença, reitero, são questões estritamente pessoais. A rigor, ninguém tem certeza de praticamente nada num universo complexo e misterioso. Há que se fazer distinção entre o que se acredita e o que de fato é. Certeza, certeza mesmo, não temos praticamente de nada. O que temos são teorias em profusão e só isso. Pode acontecer que aquilo que nos aparente ser absurdo e ridículo hoje se comprove, mais tarde, ser a verdade, e vice-versa.
        
Depois da controvérsia em torno do filme “Je vous Salue Marie”, por exemplo, que causou tanta celeuma entre nós, na década de 80 do século XX, a indústria cinematográfica partiu para uma agressão ainda mais ostensiva contra metade da humanidade, que professa o cristianismo. Produziu, e rodou, nos Estados Unidos, obra que denominou de “The Last Temptation of Christ”. A propósito do quê? Apenas para gerar a polêmica que gerou? Sim, porquanto sequer sucesso de bilheteria os dois filmes foram. O que questiono é: o que obras dessa natureza (ou similares) têm a acrescentar às artes, à cultura ou até mesmo à verdade histórica? A rigor, nada, absolutamente nada!

Há limite para tudo, inclusive para a ganância, para a burrice e para a falta de senso de determinados artistas que adoram brincar com fogo. Se os produtores desses dois filmes que citei, por exemplo, não acreditavam em nada, eles que guardassem sua descrença para si. Que não tentassem confundir ainda mais a cabeça, já tão confusa, de bilhões de alienados, de inocentes úteis, de robôs, vazios, que vegetam no Planeta, tão desesperançados que só encontram refúgio nas drogas, nos mais ignóbeis vícios, quando não no suicídio. O mesmo vale para Salman Rushdie, com seus “Versículos satânicos”; para Dan Brown, com o “Código da Vinci” e para o caricaturista que publicou caricatura do profeta Maomé em um jornal dinamarquês, que gerou revolta e violência no mundo islâmico. Reputo suas decisões de explorar os temas que exploraram de “apelação”, embora condene também, e de forma veemente, as reações dos que se sentiram ofendidos com essas obras.

É sabido que o mundo abriga mais de 10 milhões de loucos, a maioria absoluta dos quais à solta nas ruas e até desconhecendo sua doença. Fanáticos de todos os tipos e graus de fanatismo há em profusão. Para quê lhes dar pretexto para suas manifestações de insanidade e de delírio? O papel da arte não é este. Não considero, pois, as obras citadas como “artísticas”. O homem pode ter progredido tecnologicamente e, de fato, progrediu demais, não há como negar. Produziu maravilhas, que no passado jamais passaram pela mais alucinada fantasia dos sonhadores. Mas, em termos morais, de profundidade de pensamento, de riqueza interior e de respeito às opiniões alheias, caminhou (e muito) para trás. E alguns indícios demonstram que regrediu aos tempos anteriores até ao de seus ancestrais das cavernas, que cultuavam divindades e distinguiam, pelo menos, o sagrado do profano. E hoje? Parece que ninguém está disposto a respeitar quem quer que seja, sem medir consequências. Pobre mundo sem rumo...

Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk

No comments: