Thursday, May 23, 2013


Pausa para refletir

Pedro J. Bondaczuk

O papa João Paulo II inicia, hoje, a sua segunda visita à América Latina e a 31ª de seu pontificado de oito anos, levando, como a todo o lugar que foi, uma mensagem de paz e de conciliação aos colombianos que, dada a violência que impera nesse país, quase que continuamente, desde 1948, bem que precisa de alguém, com a estatura moral do Pontífice, para abrir os olhos do seu povo quanto aos caminhos equivocados que essa sociedade vem trilhando.

A despeito de se tratar de uma viagem de caráter pastoral (como todas as anteriores), certamente determinadas questões que angustiam o homem moderno deverão vir novamente à tona. Ganharão espaço nas manchetes, análises dos comentaristas e ampla divulgação. E isto é bastante saudável, num momento aparentemente tranqüilo, mas na verdade sumamente tenso, pelo qual passam os povos.

Certamente questões como o aborto, a nobreza e dignidade do trabalho, o papel do cristão no mundo moderno, a corrida armamentista, a exploração de multidões de desassistidos, "usados" sem pudor em sua humilde alienação pelos poderosos e sobretudo a violência, centralizarão a maior parte de suas homilias.

Mas é necessário que suas palavras não sejam meramente ouvidas e lidas para logo a seguir serem esquecidas. É indispensável que as pessoas parem para um momento de grave reflexão sobre seu conteúdo, enquanto a marcha dos acontecimentos ainda permite mudanças de rumo. E que procurem, sobretudo, atuar decisivamente na realidade. Tentar transformar tanta coisa que está errada e que assim permanece em virtude da alienação, do "laissez-faire" da maioria.

João Paulo II, a despeito de exigir uma delimitação rigorosa entre a atividade sacerdotal e a prática política dos membros da sua igreja, "dando a César o que é de César", foi, certamente, o Pontífice que maior número de pronunciamentos fez a propósito da nada agradável realidade do nosso tempo. Esteve nos países mais problemáticos que se possa imaginar, muitos dos quais vivendo terríveis ditaduras à época em que os visitou (como no caso das Filipinas, da Argentina e outros), e nem por isso procurou agradar os poderosos do dia. Sempre soube "colocar o dedo" nas mais dolorosas feridas, não no sentido de as arruinar, mas para que o seu possuidor procurasse curar tais chagas.

Não há como negar que nestes contínuos e prolongados giros, que já o levaram a praticamente todos os continentes, enfrentou enormes riscos. Presenciou manifestações de desagrado de diversas comunidades, inclusive católicas (como ocorreu na Holanda, no ano passado) sem que isso chegasse a abalar as suas convicções. E nem que o desestimulassem a prosseguir alertando os povos a propósito de tudo o que incomoda a tanta gente, que no entanto nada faz para alterar (ou pelo menos empreender alguma tentativa) tais situações distorcidas.

É por essa razão que o papa João Paulo II pode ser encarado, sem favor algum, como a autêntica consciência do mundo moderno, aquela que quando nos acusa por nossas falhas, tentamos, às vezes, calar, principalmente por sabermos que ela está sempre certa em suas reprimendas. E que, quando a seguimos, nos conduz à paz gerada pela certeza do dever cumprido.

(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 1º de julho de 1986)

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