Esperando o melhor
Pedro
J. Bondaczuk
Hoje acordei
predisposto a evitar, a todo o custo, pensamentos e temas negativos. Não se
trata, aviso de antemão, de nenhum súbito surto de alienação, até porque os
meios de comunicação, com seu noticiário sombrio, e a função que exerço, de
comunicador, não me permitem assumir essa postura. Decidi, porém, dar a mim
mesmo – e a você, precioso leitor, que me privilegia com sua honrosa leitura –
apenas uma trégua. A empreender momentânea fuga do lado feio da realidade e atentar
para seu aspecto benigno e agradável, que ela também tem, mas ao qual raramente
atentamos. Estamos condicionados, intoxicados, viciados em negativismo face ao
que estamos continuamente expostos.
Mas hoje não quero, e
nem vou escrever sobre tema árduo, tenso, negativo, ruim. Evitarei abordar
crises, violência, taras e desvios de conduta que, gostemos ou não, se
constituem em matérias-primas de uns 80% ou mais da Literatura. Essa decisão me
lembra a conduta que adotava com freqüência em uma empresa em que trabalhei, há
já algumas décadas. Tínhamos reuniões periódicas para debater problemas de
trabalho, complexos e urgentes, que nos mantinham durante longas horas em
estado de desgastante e desagradável tensão. Era terrível!
Eram comuns debates
acalorados, em que muitos de nós ficávamos exasperados, à beira de um ataque de
nervos, em decorrência da oposição (lícita, por sinal) que alguns dos colegas
faziam às “soluções” que propúnhamos, não raro até óbvias, posto que não
consensuais. Afinal, como diz o surrado, porém pertinente clichê, “em cada
cabeça há uma sentença”. E como há!
Naquele tempo ainda não
havia o veto (oportuníssimo) que há atualmente ao ato de fumar em ambientes
fechados. Essas reuniões tinham como participantes entre oito a dez
pessoas, todas chefes de suas
respectivas seções. Éramos todos fumantes. Havia quem fumasse um charuto
fedorento, que empesteava o ambiente e nos sufocava. Quando esses encontros
terminavam, havia dez cinzeiros com pirâmides imensas dos restos desse veneno
derramando-se nas bordas: cinzas e muitas, muitíssimas pontas de cigarro, mal
cheirosas e insanas. Imaginem como era o ar que circulava naquela sala
relativamente pequena e sem janelas. Havia uma cortina de fumaça tão densa que,
exagerando um pouco (mas não muito), dava até para ser cortada com uma tesoura.
Era um horror!
Como ninguém é de
ferro, tínhamos, após duas horas de intensas discussões, quinze minutos de
pausa. Alguns, iam à copa da empresa para se dopar de cafeína, que estimulava
ainda mais o consumo de nicotina. Outros se dirigiam ao sanitário, sem
interromper, contudo, os debates que os empolgavam. Contígua à sala de
reuniões, porém, a empresa tinha bem cuidado jardim, com vários canteiros de
flores e algumas árvores, com banquinhos debaixo delas. Esse era,
invariavelmente, meu destino – à exceção dos dias de chuva.
Ali, eu aproveitava as
pausas para “limpar a mente”, para não pensar em nada, mas apenas respirar ar
puro, contemplar as flores, ouvir a algazarra dos pássaros, em suma, para
recarregar as baterias mentais, nesse breve, porém eficaz contato com a
natureza. E a estratégia funcionava. De regresso à reunião, era tiro e queda.
Invariavelmente, era eu
que apresentava as soluções, finalmente adotadas, para os problemas que nos
exigiam tantas discussões e tensão. Não, leitor, não sou nenhum gênio e muito
menos um poço de sabedoria. Era, porém, o “único” a aproveitar, de maneira
racional, os intervalos. Limitava-me, tão somente, a dar oportunidade ao
subconsciente de atuar. E ele atuava. Vislumbrava as soluções que estavam
diante dos olhos de todos, mas que ninguém enxergava. Muito menos eu, diga-se
de passagem, antes dos intervalos das reuniões. Firmei prestígio na empresa por
causa disso e obtive várias promoções.
Essa pausa benfazeja
funciona, também, em nosso cotidiano (a menos que a encrenca em que nos
tenhamos metido seja de tal sorte que não tenha saída positiva). A vida
ensinou-me (não raro de maneira dramática, severa e até dolorosa) que não
existe problema sem solução. Às vezes (aliás, muito frequentemente), esta não é
a que desejávamos e que nos seria benigna. Mas, em boa parte das vezes, quando
damos trégua à tensão, quando “limpamos” a mente e quando deixamos o
subconsciente agir, esta se mostra tão simples e direta que chegamos a sentir
raiva por não a havermos percebido antes, de imediato, poupando tanto desgaste
e sofrimento.
A vida é muito mais
simples do que ousamos admitir. Nós é que a complicamos, com nossos medos,
preconceitos e, sobretudo, pessimismo. Esperamos o pior – de nós mesmos e
principalmente dos outros – e essas expectativas são tão intensas e
recorrentes, que ele, de fato, acontece. A esperança tende a ser,
metaforicamente, “faca de dois gumes”. Se for voltada para o factível, o
viável, o realizável e acima de tudo o positivo, multiplica nossas forças
(físicas e/ou mentais), e o que era esperado se realiza, não raro de forma
muito melhor do que eram nossas expectativas. Caso contrário... É inesgotável
fonte de decepções, angústias, frustrações e sofrimentos. Pense nisso.
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