O
maior desafio
Pedro J. Bondaczuk
O
escritor inglês, Aldous Huxley, escreveu, em 1931, instigante sátira sobre
hipotético futuro do Planeta, publicada em 1932 sob o título “Brave New World”,
traduzido, na edição em português, como “Admirável Mundo Novo”, que,
provavelmente, nem ele acreditava que algum dia seria sequer remotamente
parecido com o que descreveu. Todavia, hoje a situação descrita não somente é
possível, como, até, é provável. Há quem afirme, não sei se com base em fatos
ou apenas em suposição (em chute), que esse livro inspirou Eric Arthur Blair –
que assinava seus textos com o pseudônimo de George Orwell – a escrever seu
igualmente polêmico e ainda mais inquietador romance “1984”, escrito em 1948
(cujo título é mera inversão do ano que escreveu) e publicado em 1949.
Ambos
tratam, cada qual à sua maneira, de sociedades fechadas, ditatoriais, em que as
pessoas são vigiadas, controladas e manipuladas e não têm direito, sequer, de
ter, quanto mais de expressar idéias que não sejam as dos respectivos
dirigentes dos sistemas. No “inferno” que Huxley concebeu (que não fica nada a
dever ao de Dante Aligheri, em “A divina comédia”), os indivíduos são
pré-condicionados, em termos biológicos, e condicionados, no aspecto
psicológico, a viverem em plena harmonia. Fosse isso fruto da própria vontade,
seria o Paraíso na Terra. Mas não era. As pessoas, desse “mundo admirável”,
eram como marionetes vivas. Sempre que se sentiam inseguras, por qualquer
motivo, ou que tinham alguma dúvida a propósito de como eram governadas, eram
dopadas com uma droga chamada “soma” que, aparentemente, não tinha efeitos
colaterais.
Essa
sociedade, criada por Aldous Huxley, não tinha ética religiosa e nem os valores
morais que nos norteiam. O conceito de família também não existia. E a educação
sexual era ministrada às crianças desde que estas tinham um mínimo de
entendimento. Aparentemente, os habitantes deste mundo eram equilibrados e
felizes. Não eram, evidentemente. E havia rígido controle populacional, para
impedir eventual superpopulação.
Na
época em que o romance foi escrito, a realidade política, econômica e social,
em âmbito internacional, era muito diferente da atual. A Europa tentava se
recuperar dos horrores da Primeira Guerra Mundial, até então o mais sangrento e
perverso conflito armado da História. Essa barbárie foi responsável pela morte
de 19 milhões de pessoas (9 milhões de militares e 10 milhões de civis), além
de causar o colapso de quatro impérios e de promover mudanças radicais no mapa
geopolítico da Europa e do Oriente Médio. Isso sem contar os imensos prejuízos
materiais que causou. Foi, até então, a maior carnificina já ocorrida no mundo.
Dizia-se que, após essa guerra, os povos jamais voltariam a guerrear. Mas
voltaram. E apenas em escassas duas décadas.
Se
a Primeira Guerra Mundial foi considerada surreal e dantesca carnificina,
imaginem a Segunda, que teve seis vezes mais mortes que a anterior (cerca de 60
milhões)! Seus horrores foram incrivelmente maiores, com o Holocausto de judeus
e com o desenvolvimento, construção e utilização da mais arrasadora das armas
já inventada pelo homem, a bomba atômica. Não fossem esses dois conflitos, que
eliminaram, somados, 80 milhões de pessoas, o leitor já imaginou como o
problema da superpopulação seria muito mais grave hoje? Não que tenha a
gravidade atenuada, longe disso, mas certamente seria muitíssimo maior.
Em
1958, Aldous Huxley escreveu a continuação do romance que havia escrito em
1931, sob o título de “Volta ao admirável mundo novo”. A ênfase, agora, foi
centrada exatamente na explosão populacional, que tanto o preocupou na ocasião
e, aparentemente, aos governos de alguns países. A China, por exemplo, a
sociedade nacional mais populosa do Planeta, tentou impor aos casais a geração
de apenas dois filhos para cada família. Isso resultou em drástico
desequilíbrio populacional, com a dramática redução no número de nascimento de
mulheres. As meninas passaram a ser sacrificadas, antes mesmo do nascimento,
quando o feto tinha o sexo apurado nos exames pré-natais. Os casais queriam
porque queriam que sua cota de dois filhos fosse preenchida exclusivamente por
meninos. No fim das contas, esse pseudo planejamento resultou em enorme fiasco.
E hoje o país conta com população de 1,4 bilhão de habitantes, uma
exorbitância.
A
Índia, que por muitos anos dominou os noticiários internacionais por causa dos
periódicos surtos de fome de sua população, também tentou controlar a explosão
demográfica, mas por método diferente do chinês. Lançou campanha de incentivo à
vasectomia, para a população masculina, dando, a quem se dispusesse a se
submeter a essa prática, a título de incentivo, rádios de pilha. Isso,
igualmente, não funcionou e se constituiu por muito tempo em motivo, até, de
galhofa mundo afora. E hoje, em decorrência desse fracasso, o país ostenta o
segundo maior contingente populacional do Planeta, com mais de 1,1 bilhão de
habitantes.
Sobre
esse problema, Aldous Huxley escreveu, em determinado trecho do livro “Volta ao
admirável mundo novo”: “No
primeiro Dia de Natal, a população do nosso planeta contava perto de duzentos e
cinqüenta milhões de seres humanos – menos da metade da população da China
atual. Dezesseis séculos após, quando os peregrinos desembarcaram em Plymouth
Rock, o número de seres humanos subiu para um pouco além de quinhentos milhões.
Por ocasião da assinatura da Declaração da Independência, a população terrestre
ultrapassara a cifra de setecentos milhões. Em 1931, quando estava escrevendo o
Admirável Mundo Novo, apresentava um número próximo aos dois bilhões. Hoje,
apenas vinte e sete anos após, há dois bilhões e oitocentos milhões de seres. E
amanhã – quantos?” Isso ele escreveu em 1958.
A resposta à sua pergunta, a quanto chegaria a população mundial é: até
fins de 2012, havia chegado a 7,1 bilhões de habitantes. As projeções da
Divisão de População da Organização das Nações Unidas apontam três cenários
diferentes para 2100, que não tardará a chegar. O mais otimista, prevê redução
populacional espontânea, mediante queda na Taxa de Fecundidade, da média atual
de 2,5 filhos por casal, para 0,5. Caso permaneça a mesma, chegaremos a 2100
com 16 bilhões de habitantes. Se cair para 0,5, a população será reduzida para
6 bilhões. A probabilidade, na minha projeção (e tomara que eu esteja errado) é
que a cifra fique nos 12 bilhões ou algo próximo a isso.
Huxley
estava certo, pois, em suas previsões no livro “Volta ao admirável mundo novo”,
ao colocar a superpopulação como a questão mais aguda e mais urgente para a
humanidade equacionar num futuro próximo que, no final das contas, já chegou.
Escreveu, a propósito: “O problema dos números, que rapidamente se multiplicam
em relação aos recursos naturais, à estabilidade social e ao bem-estar dos
indivíduos, é a questão fundamental da humanidade; e permanecerá sendo o
problema crucial por outro século e talvez por muitos outros séculos no futuro.
Supõe-se que uma nova era se iniciou a 4 de outubro de 1957. Porém, no contexto
presente, toda a nossa exuberante conversa pós-Sputnik é irrelevante. Se
tomarmos como ponto de referência as massas de humanidade, a era vindoura não
será a Era do Espaço e sim a Era da Superpopulação”. Este é o gigantesco, o
complicado, o imenso desafio que a humanidade tem que vencer. O que fazer
diante disso? Sim, o que fazer? Fica uma mega interrogação no ar para todos
nós.
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