Desperdício do
essencial
Pedro
J. Bondaczuk
A humanidade desperdiça
entre 30% e até 70% dos alimentos produzidos no mundo, sendo que a média da
comida que vai parar no lixo, sem que ninguém a consuma, é de 50%. Ou seja,
entre 1,2 bilhão e 2 bilhões de toneladas de preciosos e indispensáveis
nutrientes são, simplesmente, jogados fora, sem trazer benefícios para ninguém,
a cada ano que passa. Essa constatação não é minha. Não se trata, portanto, de
nenhum chute. Foi feita pela “Institution of Mechanical Engineers” do Reino
Unido, num meticuloso estudo publicado por estes dias, intitulado “Global Food:
Waste not, Want not” (“Alimentos Globais: Não desperdice, Não queira”)
divulgado recentemente pelo portal UOL.
Já teci alguns
comentários a propósito, mas o tema, por sua relevância, exige maiores
considerações (e, sobretudo, reflexões), mesmo que resumidamente. O desperdício
de alimentos, por si só, já é gravíssimo, quando se sabe que milhões de pessoas
(quiçá bilhões) passam fome, pelo mundo afora ou se alimentam inadequadamente,
apresentando, por isso, quadros de desnutrição (em alguns casos, agudos e
bastante severos) ou de subnutrição. Essa carência alimentar é causa de
inúmeras doenças, agravando ainda mais os prejuízos, dados os custos dos respectivos
tratamentos, em hospitais na maioria públicos, desaparelhados, carentes e
superlotados, notadamente nos países subdesenvolvidos, em que o problema é mais
grave, tanto em quantidade quanto em gravidade.
Mas o desperdício de
alimentos está longe de ser um prejuízo isolado. São perdidos, também, outros
tantos recursos, preciosíssimos, e cada vez mais escassos, num Planeta cuja
população não pára de crescer, principalmente a água, a energia e, também,
áreas para a agricultura, cujos solos se degradam rapidamente face o contínuo
plantio, mas sem o retorno pretendido. Metade do que se planta neles é,
simplesmente, jogada fora.
Tim Fox, diretor da
instituição responsável pelo estudo, observa: “Isto é comida que poderia ser
utilizada para alimentar a crescente população mundial, além daqueles que
atualmente passam fome”. Poderia, sem dúvida. Mas não é. O relatório alertou
que, atualmente, 550 bilhões de metros cúbicos de água são desperdiçados na
produção dessa comida que vai parar no lixo.
A questão a ser encarada
não é sequer a econômica (embora essas perdas impliquem em imensos prejuízos
financeiros, arcados pelo consumidor, ou seja, por todos nós, já que tais
custos são incorporados aos preços finais dos alimentos que adquirimos). O
principal problema, no caso, refere-se ao crescente esgotamento do bem mais
precioso que o homem dispõe, sem o qual a vida é impossível: a água potável.
As reservas dessa
substância tão essencial, decrescem com rapidez assustadora. Isso acontece ou
em decorrência do aquecimento global, ou por causa da absurda poluição de rios,
lagos e fontes, ou, principalmente, por desperdício. Pelo fato das suas
reservas serem relativamente escassas (6% do total, dos quais 4% concentram-se
nos pólos, em, suas geleiras eternas), o aumento do consumo é preocupante, e
com razão. De acordo com o estudo da instituição inglesa, a demanda por água
potável, em 2050, chegará a 13 trilhões de metros cúbicos por ano,
principalmente por causa do crescimento da demanda por alimentos por causa da
superpopulação. E pensar que metade dessa comida, que para ser produzida
consome tanto desse líquido essencial à subsistência humana, vai, simplesmente,
parar no lixo!!
Para que o leitor
entenda o que significam essas projeções de aumento de consumo para os próximos
37 anos, basta dizer que elas representam 3,5 vezes mais do que a totalidade de
água potável consumida atualmente pela humanidade. Tim Fox aponta algumas das
causas desse absurdo desperdício de elementos tão essenciais à sobrevivência
humana: “As razões desta situação variam das técnicas insatisfatórias de
engenharia e agricultura à infraestrutura inadequada de transporte e
armazenamento, passando pela exigência feita pelos supermercados de que os
produtos sejam visualmente perfeitos e pelas promoções de ‘compre um e leve
outro grátis’ que incentivam os consumidores a levar para a casa mais do que
precisam”.
O estudo não leva em
conta as perdas de alimentos decorrentes das “sobras” em cada refeição na mesa
dos que os compram e consomem. Esses restos de comida que sobram no prato, no
almoço e no jantar, de nossas casas, de cada membro da família, a que não damos
a menor importância, são muito relevantes. Somados, alcançam, em média, um
porcentual estimado de 20% da produção anual de alimentos no mundo! E esse
desperdício pode ser ainda muito maior se levarmos em conta o que se desperdiça
em milhões de restaurantes através do Planeta.
Daí ser contestável a
afirmação de que não há riscos de uma até impensável “epidemia” de forme
mundial, em decorrência da superpopulação, já que a produção de alimentos é
muito mais do que suficiente para alimentar a totalidade das pessoas da Terra.
Produzir, até que se produz de fato (pelo menos até aqui). Mas...é aterrador
pensar que 70% dessa copiosa produção (50% perdida pelos produtores e 20% pelos
consumidores) jamais chega à boca dos que dela precisam e dependem dela para
sobreviver.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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