Perfil de um homem
exemplar
Pedro
J. Bondaczuk
As virtudes mais
admiráveis (e desejáveis) de qualquer ser humano, são (não necessariamente
nessa ordem): fé, esperança, caridade, bondade, justiça, solidariedade, amor ao
próximo, sensibilidade e talento, entre outras. Homens virtuosos, felizmente,
ainda os há, embora não na quantidade desejável. Contudo raros, raríssimos, reúnem
todas essas qualidades (e tantas mais) simultaneamente.
Sei, todavia, de uma
pessoa que reuniu, ao mesmo tempo, esse conjunto de virtudes. Refiro-me ao juiz
de direito, jornalista, advogado, poeta, escritor e acadêmico Dr. Alcy Giglioti
que, se vivo estivesse, completaria 82 anos de idade em 22 de dezembro deste
2012.
Contudo, parodiando o
escritor Guimarães Rosa, essa ilustre personalidade “ficou encantada” em 2007.
Ou seja, nos deixou para gozar das delícias do Paraíso destinadas aos que, em
vida, tiveram conduta retilínea e
exemplar. Tive o orgulho de partilhar da sua companhia na Academia Campinense
de Letras, onde ocupou, com dinamismo e distinção, a cadeira de número 31, que
tem como patrono Plínio Barreto e que teve, como antecessores, David Antunes e
Mário Pires. É, portanto, “imortal” no único tipo de imortalidade possível a
nós, humanos. Ou seja, o da memória.
Mas não foi somente a
essa destacada instituição que o Dr. Alcy honrou com sua presença e valorizou
com sua dinâmica atuação. Pertenceu, também, à Academia Campineira de Letras e
Artes, ao Centro de Ciências, Letras e Artes de Campinas (centenária entidade
que tanto serviço prestou e vem prestando à comunidade da nossa cidade), ao
Clube de Escritores de Piracicaba, à Casa dos Poetas de Campinas, à Associação
Campineira de Imprensa e ao Clube dos Poetas de Campinas. Ufa! Haja disposição
para tantas atividades artísticas e culturais.
Destacar sua atuação na
vida pública seria até redundante, porquanto é de conhecimento público. Atuou,
por exemplo, na magistratura paulista, com responsabilidade e afinco, onde
ingressou por concurso em 1966, sendo juiz de direito até a aposentadoria. Fora
da vida artística, foi, ainda, professor universitário, jornalista e até dono
de jornal. Foi, como se vê, homem “não de sete instrumentos”, mas de dezenas
deles, marcando seu desempenho, em todas as atividades que exerceu, com
competência, dedicação e proficiência. Como não admirar e não reverenciar um
homem assim, paradigma para todos os idealistas e os que lutam pela construção
de um mundo melhor?!
Sua atuação como
escritor foi tão relevante e memorável como nas outras atividades que citei.
Legou à posteridade os seguintes livros, entre poesias e crônicas: “Sonetos e
poemas para o amor”, “Poemas sem tempo”, “O seu Natal com amor”, “Palpites de
um palpiteiro feliz”, “Verdades”, “A morte na poesia” e “Gênese & Memória,
um livro sincero”. Além disso, organizou as obras “Poemas Olimpienses”, de sua
mãe Julia Blanco Giglioti e “Sete contos curtos”, do irmão (também jornalista e
escritor, que morreu prematuramente aos 50 anos de idade) Adir Giglioti.
Como se vê, foram
muitos e memoráveis feitos, todos de inestimável valor, que o Dr. Alcy legou à
comunidade, eu diria, à humanidade. Nenhuma dessas façanhas supera, no entanto,
seu maior legado para Campinas. Explicarei na sequência de qual se trata.
Antes, peço licença para uma ligeira consideração a título de preâmbulo.
Cada pessoa imagina o Paraíso de uma forma diferente, peculiar,
própria, de acordo com seus gostos e anseios. Para uns, trata-se de um lugar de
eterna alegria, de absoluta, completa e ininterrupta confraternização entre
todas as pessoas e todas as espécies, sem dores, injustiças e nem maldades.
Para estes, ali o leão é manso como um gatinho e brinca de apostar corrida com
o cordeiro e não há hierarquias ou poder. Ademais, ninguém pensa em passar quem
quer que seja para trás.
Para outros, porém, o Paraíso é uma festa sem fim, com as melhores
comidas e bebidas, onde tudo é perfeito e belo. As maneiras de pintar esse
lugar ideal, do qual a morte terá sido banida, como se vê, têm milhões, quiçá
bilhões de versões, materiais ou espirituais, dependendo de quem o imagina. Da
minha parte, às vezes sou tentado a projetar o Paraíso da mesma forma que Jorge
Luís Borges, que escreveu: “Sempre imaginei que o Paraíso será uma espécie de
biblioteca”. Quem sabe se não é?
Se o for, e até presumo
que possa ser, o Dr. Alcy Giglioti criou essa versão do Paraíso imaginada pelo
escritor argentino. Ao longo da sua produtiva e ativíssima vida, desde a
juventude, nos anos 50, colecionou livros e mais livros, dos melhores que já
foram editados, desde os clássicos até os lançamentos mais badalados do mundo
editorial, passando por obras raras e enciclopédias, dos mais variados assuntos
e autores. Conseguiu reunir um acervo considerabilíssimo, de 55 mil volumes. E
não foi só. Colecionou revistas, gravações musicais de artistas nacionais e
internacionais e diversos filmes em VHS.
E o que fez com tudo
isso? Vendeu? Afinal, reuniu um patrimônio artístico e cultural dos mais
invejáveis. Poderia, com a maior facilidade, obter alguns milhões na sua venda.
Mas o Dr. Alcy era idealista, homem virtuoso e, sobretudo, bom. Entre suas virtudes, a generosidade sempre esteve
em destaque. E mostrou-a na prática franqueando, gratuitamente, à comunidade
campineira, esse valioso acervo artístico cultural. Para ressaltar ainda mais
esse caráter generoso da sua personalidade, homenageou seu irmão, morto tão
prematuramente. Foi assim que nasceu a Biblioteca Adir Giglioti, que
administrou até sua morte e que hoje é administrada por sua filha Luciana.
Não exagero, pois, ao
exaltar suas virtudes. Se exagero há, é para menos, por não conseguir ser apto
o suficiente para encontrar palavras adequadas que definam com exatidão sua
grandeza moral e intelectual. O poeta e dramaturgo alemão, Bertholt Brecht,
escreveu, em certa ocasião: “Há homens que lutam um dia e são bons. Há homens
que lutam um ano e são muito bons. Há homens que lutam muitos anos e são
melhores. Mas há os que lutam toda a vida: esses são imprescindíveis”. É o caso,
certamente, do Dr. Alcy Giglioti, em cujo exemplo de vida busco me inspirar,
elegendo-o como paradigma de conduta.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment