Acima de tudo poeta
Pedro
J. Bondaczuk
O escritor mexicano
Octávio Paz destacou-se não somente na poesia, gênero em que é tido e havido
como um dos maiores poetas hispânicos de todos os tempos. Foi, também,
brilhante ensaísta, abordando em seus ensaios praticamente todos os temas da
atualidade, quer políticos, quer econômicos, quer sociais e comportamentais.
Além de ser intelectual sumamente observador, adquiriu vasta experiência de
vida, convivendo com outros povos, em sua atividade diplomática, em que fez
carreira.
Sua vivência no
exterior começou muito cedo, ainda na infância, que passou nos Estados Unidos,
onde seus pais foram morar. De regresso ao México, cursou Direito e,
posteriormente, fez curso de especialização em literatura. Em 1945, ingressou
no serviço diplomático mexicano, o que lhe possibilitou viajar muito, entrar em
contato com outros povos e conhecer outras culturas. Viveu na Espanha, na
França (mais especificamente em Paris), no Japão e na Índia. As observações que
fez, em cada lugar em que passou, forneceram-lhe subsídios para memoráveis
ensaios, não somente sobre literatura, mas de cunho filosófico, político,
social e comportamental.
Todavia, quem lê sua
produção ensaística, e de “antena ligada”, vislumbra, sempre, o poeta que nunca
deixou de ser, mesmo quando tratou de áridos temas políticos que soube, por
causa dessa característica, tornar atrativos e compreensíveis até para “não
iniciados”. Alguns assuntos são recorrentes em sua obra em prosa (tanto em
ensaios, quanto em artigos para jornais e revistas e nas várias entrevistas que
deu) como a vida nas grandes cidades mundiais, como a tão propalada (e nem
sempre bem entendida) modernidade e como a necessidade premente da busca pelo
autoconhecimento, que considerava apenas remotamente possível, posto que
desejável.
Javier Gonzalez
caracteriza da seguinte maneira o cerne da temática de Octávio Paz: “O que
mostra a leitura do poeta mexicano é que o pensamento, de maneira análoga ao
Universo, não tem um centro verdadeiro; que todo centro é móvel e relativo. O
grande esforço de Paz se orienta em reafirmar a verdade conhecida desde sempre
por poetas e homens de sabedoria; que o centro do mundo se encontra no coração
de cada homem”.
E como o próprio
escritor caracteriza a motivação do ato de escrever, não apenas a sua, mas de
todos os demais? Declarou, neste trecho de um dos seus ensaios: “Escrevemos
para ser o que somos ou para ser aquilo que não somos. Em um ou em outro caso,
nos buscamos a nós mesmos. E se tivermos a sorte de nos encontrarmos – sinal de
criação – descobriremos que somos um desconhecido. Sempre o outro, sempre ele,
inseparável, alheio, com o seu rosto, e o meu, você sempre comigo e sempre só”.
Para Octávio Paz, as
cidades contemporâneas são tanto um bem, quanto um mal, dependendo do aspecto
em que a vida nessas selvas de asfalto e cimento seja encarada. A possibilidade
de fácil acesso aos bens indispensáveis à sobrevivência (e mesmo os supérfluos)
é o lado positivo, no seu entender. Quanto ao negativo, declarou o seguinte, em
entrevista publicada pelo jornal “O Estado de São Paulo”, em 1988: “É certo que
a vida em comum ameaça sempre nossa identidade, mas a cidade, com suas
multidões anônimas, também provoca o encontro com nós mesmos e, em certas
ocasiões provoca, até mesmo, a revelação do que está mais além de nós. Os antigos
tinham visões nos desertos e nos páramos, nós nos corredores de um edifício ou
numa esquina qualquer. A poesia da cidade é simultaneamente a poesia da perda
do ser e a poesia da plenitude”.
Afirmei que Octávio
Paz, mesmo quando escreve prosa, é sempre o poeta, quer na linguagem empregada,
quer na visão peculiar do que o rodeia. A propósito da vida nas grandes
cidades, encontrei dois poemas que, indiretamente, expressam a mesma coisa que
ele declarou na entrevista citada, publicada pelo “Estadão”. O primeiro leva o
título de “Certeza”, e diz:
“Se é real a luz branca
desta lâmpada, real
a mão que escreve? São
reais
os olhos que vêem o
escrito?
De uma palavra a outra
a que digo se
desvanece.
Eu sei que estou vivo
entre dois parêntesis”.
O segundo poema intitula-se
“Povo”. Nele, Octávio Paz declara:
“As pedras são tempo
o vento séculos de
vento
as árvores são tempo
as pessoas são pedras
o vento volta sobre si
mesmo e se enterra
no dia de pedra.
Não há água mas brilham
os olhos”.
Em outra entrevista,
esta concedida a Enrico Mario Santi, Octávio Paz afirmou: “Há aquilo que dizia
aquele historiador inglês Toynbee, que há um ritmo de saída e de regresso. É o
ritmo de todos os homens, é um ritmo humano. Saímos da matriz e voltamos à tumba.
Essa é a vida do homem e nossa vida pessoal. Como na vida das sociedades, esse
duplo ritmo de saída e de retorno se reproduz não uma, mas muitas vezes. Esse
ritmo de regresso e saída é fundamental”. Pense nisso!
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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