Sunday, March 31, 2013


As boas e más entrevistas

Pedro J. Bondaczuk

As entrevistas tanto podem valorizar determinadas edições de jornais e revistas – e também de programas de rádio, televisão e de textos de sites da internet – como podem meramente preencher “buracos”. Muitas (e põe muitas nisso) não passam de “encheção de lingüiça”, como diz o vulgo, para caracterizar matérias que não dizem e nem desdizem, ou seja, que são ostensivo e escrachado preenchimento de espaço, sem o mínimo interesse para qualquer pessoa, por rigorosa falta de conteúdo. Poderiam ser substituídas pelo que em jornalismo apelidamos de “calhaus”, que são aqueles anúncios institucionais da própria empresa jornalística utilizados para tapar buracos sem que o leitor perceba. Isso, claro, no caso de jornais e revistas.

O sucesso de qualquer entrevista depende (e sustento que na mesma proporção), tanto do entrevistado, quanto do entrevistador. Perguntar também é uma arte e das mais complicadas de se exercer com inteligência e pertinência. Sócrates que o dissesse, já que seu método para chegar à verdade consistia exatamente nisso. Em fazer as perguntas mais claras, objetivas e precisas para arrancar respostas lógicas, exatas e esclarecedoras. E é isso o que um entrevistador competente precisa fazer. Ou seja, tem que saber perguntar o que o leitor (ou o ouvinte, ou o telespectador, dependendo da mídia) gostaria de saber. Nem todos sabem fazer isso. Aliás, sem nenhum exagero – baseado em minha experiência de editor – ouso afirmar que a maioria dos repórteres não sabe fazer perguntas já nem digo inteligentes, mas minimamente pertinentes.

Querem um exemplo bastante corriqueiro? Cito as perguntas que são feitas por determinados profissionais da área esportiva aos técnicos de futebol, ao término dos jogos transmitidos por rádio e TV. Algumas são tão idiotas e vazias a ponto de irritarem os mais fleugmáticos dos entrevistados. Imaginem quando estes são profissionais, digamos, mais temperamentais, como Muricy Ramalho, Luís Felipe Scolari ou o treinador da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 2010, o Dunga!

Claro que a escolha do entrevistado é fundamental. Não posso esperar, por exemplo, que um leigo em física me conceda uma entrevista minimamente útil ou pelo menos interessante sobre alguma nova descoberta neste campo. Não adianta eu ser gênio na arte de perguntar se a pessoa a quem minhas perguntas se dirigem não entender bulhufas do assunto sobre o qual é entrevistado.

Como também de nada vale tentar arrancar idéias novas e criativas, que não sejam redundantes ou alucinantes, de algum escritor reconhecidamente pífio. A cada questão que eu lhe formular, ele responderá, com certeza, com uma enxurrada de disparates ridículos, de tal sorte de se tornarem impublicáveis. Muitos editores, na pressa de fecharem edições, publicam essas baboseiras assim mesmo. Para a sua sorte, o leitor sequer repara nessas bobagens. Deixa de lado as tais entrevistas, por absoluta falta de interesse. E isso, apenas isso impede que tanto entrevistador quanto entrevistado caiam em ridículo. Às vezes, ambos não têm nem mesmo essa “sorte”.

E por que trago à baila esse assunto, da esfera quase exclusiva do jornalismo, neste espaço voltado à Literatura? Faço-o para valorizar as boas entrevistas feitas com determinados escritores (um tanto quanto raras, ou pelo menos não tão abundantes quanto as que envolvem políticos e/ou economistas, de quem, usualmente, não se arrancam senão conjuntos de clichês e de lugares-comuns) muitas das quais valem tanto (ou até mais) do que seus próprios livros. Há anos que as coleciono. Tenho algumas dezenas delas, recortadas de jornais e de revistas. E as declarações nelas contidas têm me fornecido preciosos subsídios para boa parte dos meus ensaios literários.

É certo que sou seletivo. Conservo, em meus arquivos, apenas entrevistas dignas de serem preservadas. Declarações vazias, ou óbvias, ou redundantes, ou mesmo estapafúrdias não são prerrogativas exclusivas de políticos e economistas. Muitos escritores, quando se metem a comentar o que não entendem, dizem cada uma! Como essas declarações não me trazem nenhum proveito, ignoro-as, já que meu intuito não é o de ridicularizar ninguém, mesmo que mereça ser exposto ao ridículo, mas a de me aprimorar na arte que á a minha paixão.

Tenho em meus arquivos várias entrevistas de Octávio Paz, de Carlos Drummond de Andrade, de Gabriel Garcia Marquez, de Mário Vargas Llosa e Jorge Luís Borges, entre tantos outros, e em nenhuma delas jamais encontrei qualquer disparate. Muito pelo contrário, elas constituem-se em preciosas fontes de esclarecimento a que frequentemente recorro, com enorme satisfação e proveito intelectual.

Um dos escritores bastante entrevistados e cujas entrevistas sempre me impressionaram, pela clareza nas respostas e pela lucidez das opiniões emitidas, é o norte-americano Philip Roth. Após a leitura de vários de seus livros – notadamente do “Complexo de Portnoi” – e dos conceitos por ele tratados com clareza e competência sempre que entrevistado, não consigo entender, de maneira alguma, quais os critérios adotados pela academia sueca para a outorga anual do Prêmio Nobel de Literatura.

Entra ano, sai ano, esse magnífico romancista contemporâneo é apontado como candidato natural à premiação. Contudo... Quando o resultado é anunciado, nada. Premiam-se obscuros escritores regionais (muitos nem tão bons assim), que na esfera internacional são ilustres desconhecidos, e se omitem nomes em torno dos quais há praticamente consenso mundial. Essa é uma crítica que não me canso e certamente nunca me cansarei de fazer. Não, pelo menos, enquanto um brasileiro não for reconhecido pela academia sueca como digno de um Prêmio Nobel de Literatura. Será que isso, algum dia, ainda irá acontecer? Espero (e confio) que sim.

Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk 

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