As boas e más
entrevistas
Pedro
J. Bondaczuk
As entrevistas tanto
podem valorizar determinadas edições de jornais e revistas – e também de
programas de rádio, televisão e de textos de sites da internet – como podem
meramente preencher “buracos”. Muitas (e põe muitas nisso) não passam de
“encheção de lingüiça”, como diz o vulgo, para caracterizar matérias que não
dizem e nem desdizem, ou seja, que são ostensivo e escrachado preenchimento de
espaço, sem o mínimo interesse para qualquer pessoa, por rigorosa falta de
conteúdo. Poderiam ser substituídas pelo que em jornalismo apelidamos de
“calhaus”, que são aqueles anúncios institucionais da própria empresa
jornalística utilizados para tapar buracos sem que o leitor perceba. Isso,
claro, no caso de jornais e revistas.
O sucesso de qualquer
entrevista depende (e sustento que na mesma proporção), tanto do entrevistado,
quanto do entrevistador. Perguntar também é uma arte e das mais complicadas de
se exercer com inteligência e pertinência. Sócrates que o dissesse, já que seu
método para chegar à verdade consistia exatamente nisso. Em fazer as perguntas
mais claras, objetivas e precisas para arrancar respostas lógicas, exatas e
esclarecedoras. E é isso o que um entrevistador competente precisa fazer. Ou
seja, tem que saber perguntar o que o leitor (ou o ouvinte, ou o telespectador,
dependendo da mídia) gostaria de saber. Nem todos sabem fazer isso. Aliás, sem
nenhum exagero – baseado em minha experiência de editor – ouso afirmar que a
maioria dos repórteres não sabe fazer perguntas já nem digo inteligentes, mas minimamente
pertinentes.
Querem um exemplo
bastante corriqueiro? Cito as perguntas que são feitas por determinados
profissionais da área esportiva aos técnicos de futebol, ao término dos jogos
transmitidos por rádio e TV. Algumas são tão idiotas e vazias a ponto de
irritarem os mais fleugmáticos dos entrevistados. Imaginem quando estes são
profissionais, digamos, mais temperamentais, como Muricy Ramalho, Luís Felipe
Scolari ou o treinador da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 2010, o Dunga!
Claro que a escolha do
entrevistado é fundamental. Não posso esperar, por exemplo, que um leigo em
física me conceda uma entrevista minimamente útil ou pelo menos interessante
sobre alguma nova descoberta neste campo. Não adianta eu ser gênio na arte de
perguntar se a pessoa a quem minhas perguntas se dirigem não entender bulhufas
do assunto sobre o qual é entrevistado.
Como também de nada
vale tentar arrancar idéias novas e criativas, que não sejam redundantes ou
alucinantes, de algum escritor reconhecidamente pífio. A cada questão que eu
lhe formular, ele responderá, com certeza, com uma enxurrada de disparates
ridículos, de tal sorte de se tornarem impublicáveis. Muitos editores, na
pressa de fecharem edições, publicam essas baboseiras assim mesmo. Para a sua
sorte, o leitor sequer repara nessas bobagens. Deixa de lado as tais
entrevistas, por absoluta falta de interesse. E isso, apenas isso impede que
tanto entrevistador quanto entrevistado caiam em ridículo. Às vezes, ambos não
têm nem mesmo essa “sorte”.
E por que trago à baila
esse assunto, da esfera quase exclusiva do jornalismo, neste espaço voltado à
Literatura? Faço-o para valorizar as boas entrevistas feitas com determinados
escritores (um tanto quanto raras, ou pelo menos não tão abundantes quanto as
que envolvem políticos e/ou economistas, de quem, usualmente, não se arrancam
senão conjuntos de clichês e de lugares-comuns) muitas das quais valem tanto
(ou até mais) do que seus próprios livros. Há anos que as coleciono. Tenho
algumas dezenas delas, recortadas de jornais e de revistas. E as declarações
nelas contidas têm me fornecido preciosos subsídios para boa parte dos meus
ensaios literários.
É certo que sou
seletivo. Conservo, em meus arquivos, apenas entrevistas dignas de serem
preservadas. Declarações vazias, ou óbvias, ou redundantes, ou mesmo
estapafúrdias não são prerrogativas exclusivas de políticos e economistas.
Muitos escritores, quando se metem a comentar o que não entendem, dizem cada
uma! Como essas declarações não me trazem nenhum proveito, ignoro-as, já que
meu intuito não é o de ridicularizar ninguém, mesmo que mereça ser exposto ao
ridículo, mas a de me aprimorar na arte que á a minha paixão.
Tenho em meus arquivos
várias entrevistas de Octávio Paz, de Carlos Drummond de Andrade, de Gabriel Garcia
Marquez, de Mário Vargas Llosa e Jorge Luís Borges, entre tantos outros, e em
nenhuma delas jamais encontrei qualquer disparate. Muito pelo contrário, elas
constituem-se em preciosas fontes de esclarecimento a que frequentemente
recorro, com enorme satisfação e proveito intelectual.
Um dos escritores
bastante entrevistados e cujas entrevistas sempre me impressionaram, pela
clareza nas respostas e pela lucidez das opiniões emitidas, é o norte-americano
Philip Roth. Após a leitura de vários de seus livros – notadamente do “Complexo
de Portnoi” – e dos conceitos por ele tratados com clareza e competência sempre
que entrevistado, não consigo entender, de maneira alguma, quais os critérios
adotados pela academia sueca para a outorga anual do Prêmio Nobel de Literatura.
Entra ano, sai ano,
esse magnífico romancista contemporâneo é apontado como candidato natural à
premiação. Contudo... Quando o resultado é anunciado, nada. Premiam-se obscuros
escritores regionais (muitos nem tão bons assim), que na esfera internacional
são ilustres desconhecidos, e se omitem nomes em torno dos quais há
praticamente consenso mundial. Essa é uma crítica que não me canso e certamente
nunca me cansarei de fazer. Não, pelo menos, enquanto um brasileiro não for
reconhecido pela academia sueca como digno de um Prêmio Nobel de Literatura.
Será que isso, algum dia, ainda irá acontecer? Espero (e confio) que sim.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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