Competição
e circunstâncias
Pedro J. Bondaczuk
A competição, conforme tenho
observado nestas minhas quase sete décadas de vida, é uma lei da natureza.
Todos os seres vivos, de uma forma ou de outra, competem, e o tempo todo, da
concepção até a morte, por alguma coisa (na realidade por muitíssimas delas).
Até para se nascer ela é nossa realidade primordial.
Por esse princípio, só o fato de
estarmos vivos significa que somos vencedores. Somos produtos do único
espermatozóide que, competindo com alguns bilhões de similares, logrou vencer
todas as barreiras para fecundar um único óvulo, das centenas disponíveis. Não
vencêssemos essa corrida, não estaríamos aqui. Somos frutos, pois, de uma
competição em que saímos ganhando.
Mesmo que venhamos a perder todas
as disputas posteriores que teremos pela frente – e certamente as teremos aos
milhares, quiçá aos milhões – obtivemos pelo menos uma vitória e esta é
essencial: a de sermos. O sucesso ou o fracasso nas demais batalhas da vida
dependerá de uma série de fatores, muitos dos quais (temo que a maioria) não
dependerão de nós, ou seja, independem da nossa capacidade de adaptação, de
autopreservação e de competição. Esses fatores aleatórios, que determinam
vitórias ou derrotas, têm um nome: circunstâncias. Podemos (e devemos, quando
for o caso) lutar contra elas, se ou quando forem adversas e trazê-las ao nosso
favor, mas jamais poderemos determiná-las. Quem as determina? Sei lá! Cada qual
tem uma explicação para isso, sem que haja consenso.
Querem um exemplo de uma
circunstância negativa que pode comprometer, se não arruinar nossa chance como
competidores? Algum defeito genético. Ninguém sabe (a ciência ainda não
identificou as causas) a razão exata dessas falhas da natureza ocorrerem, mas
ocorrem. É certo que nem todos os que nascem com alguma deficiência física, ou
pior, mental, estão condenados ao fracasso. Mas, certamente, terão que se
superar para pelo menos acompanhar os demais. Há casos, até, em que os superam,
e não são poucos, mas os esforços despendidos para isso terão que ser muito
maiores. É injusto? Sim! Mas a natureza desconhece o conceito de justiça.
Há inúmeras outras circunstâncias
que, se forem as nossas, servirão como poderosos handicaps negativos,
obrigando-nos a nos desdobrarmos muito mais do que os demais para podermos
competir com chances, mesmo que remotas, de sucesso. Uma, por exemplo, é o lar
em que nascemos. Outra, a condição econômica e o grau de instrução dos nossos
pais. Outra, ainda, e esta fundamental, as oportunidades que tivermos (ou
deixarmos de ter) para nos instruir, para desenvolver nosso potencial e nossos
talentos inatos, para aplicá-los na vida prática, para garantir nosso sustento
e vai por aí afora.
Como se vê, a competição
raramente é justa. Diria que é liminarmente injusta. Os competidores não
partem, todos, para a corrida da vida, em rigoroso pé de igualdade. O homem,
todavia, como o único ser inteligente da natureza e dotado de vontade, tem
condições, posto que mínimas (diria ínfimas) de pelo menos melhorar um pouco
esse panorama. Pode, se não eliminar, pelo menos tornar menos feroz e cruel
essas desigualdades. Se quiser (e aí é que reside o “x” da questão) pode
transformar a competição em cooperação. Pode, mas raramente faz. Entrega-se ao
instinto, mesmo sendo o único ser vivo capaz de agir contra ele, quando se
mostrar perverso, e superá-lo.
Escrevi, certa ocasião, em uma
crônica, o seguinte (que é ainda o que penso a propósito): “Somos educados para
a competição, mas nem sempre (ou quase nunca) estamos dispostos a seguir
regras. Embora retoricamente condenemos essa atitude, na prática agimos achando
que os meios (lícitos ou não, éticos ou não, justos ou não) justificam os fins.
Corremos atrás de sombras. A substância não se faz presente. O homem abre mão do usufruto da beleza que
existe em tudo o que nos cerca, bastando apenas um pouco de atenção para ser
percebida e aproveitada – e onde reside a verdadeira felicidade – foge das
emoções sadias, para tentar conquistar o abstrato: fama, fortuna e poder.
Trilogia maldita que desgraça multidões! Sombras, fumaça, ilusões...”
Sei que este é um tema polêmico e
árduo, em torno do qual dificilmente (detesto usar termos, para mim
definitivos, como “sempre” e, principalmente, “nunca”) se obterá consenso.
Ainda mais quando discorrido por um mero “aprendiz de feiticeiro” da vida, num
texto tacanho, esboçado às pressas, sem muito tempo para raciocínio minimamente
profundo. Mas não deixa de ser um assunto digno de reflexão, até para propiciar
um tantinho que seja de auto-análise, em busca do desejável, embora não raro
traumático autoconhecimento. As divergências, aliás, desde que apresentadas
racional e civilizadamente, são não apenas desejáveis, mas até necessárias
para, do confronto de idéias divergentes e opostas, obtermos, mesmo que em
ínfima réstia, a desejável luz da verdade e da razão.
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