Sombras
sobre o Rio
Pedro J. Bondaczuk
A violência urbana, o tráfico de drogas, a corrupção
e a insegurança generalizada dos cidadãos estão mudando o perfil do Rio de
Janeiro. Não faz muito, a cidade era caracterizada por suas belezas naturais,
pela alegria e cordialidade do seu povo, por sua hospitalidade e pelo positivo
espírito crítico do carioca.
Atraía gente de todo o País e do mundo, pelo encanto
de suas praias, pelo Cristo Redentor, pelo Pão de Açúcar, pela Baía da
Guanabara e por tantas outras coisas positivas. Poetas e compositores
imortalizavam a sua magia em poemas e canções inesquecíveis. Tais virtudes, é
óbvio, não se acabaram (ainda). Mas uma sinistra sombra paira sobre a cidade,
espantando os que pretendem usufruir das suas delícias.
O crime organizado estende, cada vez mais, seus
terríveis tentáculos sobre o Rio, dominando comunidades inteiras, desafiando a
polícia de armas nas mãos e transformando num inferno a já por si só difícil
vida dos moradores de suas favelas.
Traficantes estabeleceram ali um poder paralelo,
contando com um arsenal de fazer inveja a qualquer agente da lei. Os bandidos
dispõem de armamentos sofisticadíssimos, alguns de última geração, com os
quais, literalmente, escravizam, sem o mínimo escrúpulo, aterrorizados pais de
família, semeando o vício, a insegurança, a morte e a dor.
A Cidade Maravilhosa, em conseqüência disso,
transformou-se em “perigosa”, num lugar altamente arriscado para se viver ou se
visitar. É verdade que seu encanto e sua magia são tão grandes, que mesmo numa
situação anômala, é impossível a quem a visite não se apaixonar por ela.
É por isso que a restauração da ordem e da segurança
no Rio deve ser uma bandeira não somente de seus habitantes, mas de todos os
brasileiros, pelo que ele representa em termos de histórias, de cultura e de
turismo para o País. Da mesma forma com que a sociedade se revoltou com a
recente chacina de Vigário Geral, deve reagir, com asco e com indignação, às
sucessivas demonstrações de atrevimento das várias quadrilhas de traficantes
locais, como no episódio ocorrido esta semana na Favela do Acari.
Por isso, é não somente louvável, mas, sobretudo,
indispensável, que o Exército, de fato, dê um basta nessa terrível situação,
mediante intervenção nas comunidades que são reféns dos bandidos. Não se pode
permitir que o Rio se torne uma extensão dos cartéis de Medellín, de Cali e do
Caribe que, reprimidos na Colômbia, seu país de origem, querem fazer da Cidade
Maravilhosa a sua sucursal.
Esta é uma guerra que o País não poder perder. Além
do tráfico (e provavelmente vinculada a ele) floresce, ali, a “indústria dos
seqüestros”. Na quarta-feira passada, por exemplo, o paisagista Burle Marx, de
85 anos de idade, escapou por puro acaso de ser feito refém, quando 15 homens
armados invadiram o seu sítio na estrada da Barra de Guaratiba. Só não foi
seqüestrado porque não se encontrava no local naquele momento.
A população carioca não merece o que está passando.
Chega de promessas, de falatórios e de demagógicas jogadas políticas. Trata-se
de uma guerra suja, não contra grupos ideológicos que intentem mudar o sistema,
mas contra criminosos comuns, oportunistas, cínicos, irrecuperáveis. Contra
indivíduos sem o mínimo senso de humanidade ou consideração com quem quer que
seja, que zombam da virtude, enxovalham as leis e só conhecem a linguagem da
violência. Que se resgate o Rio de Janeiro para todos os brasileiros e os
turistas que o queiram conhecer enquanto ainda há tempo.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio
Popular, em 1º de outubro de 1993)
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