Friday, May 13, 2016

Sombras sobre o Rio



Pedro J. Bondaczuk


A violência urbana, o tráfico de drogas, a corrupção e a insegurança generalizada dos cidadãos estão mudando o perfil do Rio de Janeiro. Não faz muito, a cidade era caracterizada por suas belezas naturais, pela alegria e cordialidade do seu povo, por sua hospitalidade e pelo positivo espírito crítico do carioca.

Atraía gente de todo o País e do mundo, pelo encanto de suas praias, pelo Cristo Redentor, pelo Pão de Açúcar, pela Baía da Guanabara e por tantas outras coisas positivas. Poetas e compositores imortalizavam a sua magia em poemas e canções inesquecíveis. Tais virtudes, é óbvio, não se acabaram (ainda). Mas uma sinistra sombra paira sobre a cidade, espantando os que pretendem usufruir das suas delícias.

O crime organizado estende, cada vez mais, seus terríveis tentáculos sobre o Rio, dominando comunidades inteiras, desafiando a polícia de armas nas mãos e transformando num inferno a já por si só difícil vida dos moradores de suas favelas.

Traficantes estabeleceram ali um poder paralelo, contando com um arsenal de fazer inveja a qualquer agente da lei. Os bandidos dispõem de armamentos sofisticadíssimos, alguns de última geração, com os quais, literalmente, escravizam, sem o mínimo escrúpulo, aterrorizados pais de família, semeando o vício, a insegurança, a morte e a dor.

A Cidade Maravilhosa, em conseqüência disso, transformou-se em “perigosa”, num lugar altamente arriscado para se viver ou se visitar. É verdade que seu encanto e sua magia são tão grandes, que mesmo numa situação anômala, é impossível a quem a visite não se apaixonar por ela.

É por isso que a restauração da ordem e da segurança no Rio deve ser uma bandeira não somente de seus habitantes, mas de todos os brasileiros, pelo que ele representa em termos de histórias, de cultura e de turismo para o País. Da mesma forma com que a sociedade se revoltou com a recente chacina de Vigário Geral, deve reagir, com asco e com indignação, às sucessivas demonstrações de atrevimento das várias quadrilhas de traficantes locais, como no episódio ocorrido esta semana na Favela do Acari.

Por isso, é não somente louvável, mas, sobretudo, indispensável, que o Exército, de fato, dê um basta nessa terrível situação, mediante intervenção nas comunidades que são reféns dos bandidos. Não se pode permitir que o Rio se torne uma extensão dos cartéis de Medellín, de Cali e do Caribe que, reprimidos na Colômbia, seu país de origem, querem fazer da Cidade Maravilhosa a sua sucursal.

Esta é uma guerra que o País não poder perder. Além do tráfico (e provavelmente vinculada a ele) floresce, ali, a “indústria dos seqüestros”. Na quarta-feira passada, por exemplo, o paisagista Burle Marx, de 85 anos de idade, escapou por puro acaso de ser feito refém, quando 15 homens armados invadiram o seu sítio na estrada da Barra de Guaratiba. Só não foi seqüestrado porque não se encontrava no local naquele momento.

A população carioca não merece o que está passando. Chega de promessas, de falatórios e de demagógicas jogadas políticas. Trata-se de uma guerra suja, não contra grupos ideológicos que intentem mudar o sistema, mas contra criminosos comuns, oportunistas, cínicos, irrecuperáveis. Contra indivíduos sem o mínimo senso de humanidade ou consideração com quem quer que seja, que zombam da virtude, enxovalham as leis e só conhecem a linguagem da violência. Que se resgate o Rio de Janeiro para todos os brasileiros e os turistas que o queiram conhecer enquanto ainda há tempo.       

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 1º de outubro de 1993)


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