Saturday, May 07, 2016

Informações da guerra não são confiáveis


Pedro J. Bondaczuk


Os historiadores do futuro, se tiverem que escrever sobre o início da Guerra do Golfo Pérsico baseados apenas nas informações divulgadas de quarta-feira para cá, terão dificuldades enormes para conciliar os fatos e dar uma conformação lógica ao seu texto.

Foram ditas e escritas tantas bobagens a respeito da batalha aérea nos céus de Bagdá, a maior da história pelo volume de aeronaves empregadas, que dificilmente o pesquisador irá utilizar as fontes convencionais para realizar o seu trabalho.

Há determinadas notícias acerca da luta que são de tamanha inverossimilhança, que sequer é necessário que alguém tivesse estado presente no cenário do acontecimento para intuir que ele não pode ter ocorrido conforme foi narrado.

Por exemplo, não se concebe que numa ofensiva envolvendo cerca de 1.300 caças e bombardeiros, contra um país de 18,3 milhões de habitantes e com 1,1 milhão de homens em armas, uma, somente uma única e solitária aeronave tenha sido abatida pelas baterias anti-aéreas iraquianas.

É até possível que as pessoas, por distração ou desinformação, o que é mais provável, tenham aceitado esta versão, sem se deter para refletir. Será, porém, que o historiador do futuro irá registrar este fato, sem procurar verificar a sua exatidão, de tão insólito que ele é? Informação é algo muito sério para ser tratada descuidadamente. Quanto mais exata ela for, maiores condições a opinião pública terá para fiscalizar os excessos dos desequilibrados e dos irresponsáveis que eventualmente assumam os nossos destinos.

Respeita-se a necessidade de sigilo em algumas questões, por razões estratégicas. Nestes casos, porém, é preferível o silêncio do que o exagero que, por ser inverdade, tende a provocar o descrédito. A guerra é um fenômeno que, embora desgraçadamente comum na história da humanidade, às vezes se torna inevitável, como é o caso da legítima defesa de um povo diante da iminência de sua destruição.

Mas não é uma diversão, um show, um mero jogo. Albert Schweitzer, Prêmio Nobel da Paz de 1952, assinalou que “quem quer que se regozije com a vitória (numa guerra) pode regozijar-se também com o assassínio”.

Nenhuma circunstância é capaz de tornar o ato de tirar vidas moral. A notícia inverossímil tende a abrir espaço para boatos, que por sua vez fermentam inquietações sociais e podem provocar explosões populares de pânico. E isto representa muito maior risco para as pessoas e as comunidades do que o fornecimento correto de baixas registradas no decorrer de um determinado confronto.

(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 19 de janeiro de 1991).


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