Impaciência
ameaça a glasnost
Pedro J. Bondaczuk
A abertura política em andamento na União Soviética,
comandada pelo presidente Mikhail Gorbachev, tem propiciado um volume de
informações tão grande, sobre a superpotência do Leste europeu, como nunca, em
tempo algum no pós-guerra, ocorreu.
Regiões completamente desconhecidas para o grande
público, como os enclaves de Nagorno-Kharabalkaskaya e da Abkhazia, de repente,
acabam ficando populares, por causa dos conflitos étnicos que lá ocorrem.
Repúblicas antes só conhecidas em livros de geografia, como a Armênia, o
Azerbaijão, o Kazaquistão, o Uzbequistão, a Geórgia e a Bielo-Rússia, da noite
para o dia passaram a ser mencionadas nas ruas, até por pessoas de cultura
mediana, quando não sofrível.
O mais notável, em trudo isso, é a forma como
Gorbachev vem conduzindo o processo de abertura, normalmente traumático, após
tanto tempo de repressão. Mesmo enfrentando distúrbios, sucessivas greves,
manifestações de protesto e até atentados terroristas, em momento algum do
líder do Cremlin ameaçou os desafetos com eventual e brusco fechamento do
regime ou com retrocessos institucionais, como os do tempo de Stalin, como,
aliás, fez o seu colega chinês, Deng Xiaoping, que mostrou não ter nervos de
aço para conduzir tarefa de tamanha envergadura.
É verdade que o presidente soviético foi à
televisão, em rede nacional, e em várias oportunidades, para apelar por bom
senso dos opositores e até de correligionários mais afoitos. Mudar de uma hora
para outra uma estrutura envelhecida e ineficiente, bruscamente, de repente,
não é um primor de sensatez. Pode gerar o caos, caso as rédeas do processo
escapem das mãos do condutor do processo.
Ninguém, por maior má vontade que possa ter em
relação a Gorbachev, pode negar que ele revolucionou (e vem revolucionando) a
União Soviética. Desmascarou os que asseguravam que o país era uma espécie de
paraíso na Terra. Não é e nunca foi! Pelo contrário!
O presidente soviética, por exemplo, reformou a vida
política do país, instituindo um Parlamento com personalidade, que deixou de
ser um mero o boizinho de presépio do déspota de plantão que sempre foi.
Promoveu eleições nacionais com mais de um candidato, novidade na URSS e teve
grandeza suficiente para respeitar a vontade popular, que exilou da política
muitos dos barões assinalados do regime soviético.
Por outro lado, retirou as tropas do seu país do
Afeganistão e expandiu os contatos diplomáticos em todas as direções. Enfim,
começou a inserir, finalmente, a superpotência oriental na comunidade mundial,
não mais como uma ameaça à liberdade dos povos ou, principalmente, à
sobrevivência da espécie humana, mas na qualidade de um importante parceiro na
busca de soluções para os gigantescos problemas com os quais todos convivemos.
O que se espera, somente, é que os soviéticos tenham
cabeça, nesse momento decisivo da sua história, e não tumultuem um processo que
tem tudo para dar certo, se a impaciência e as tentativas de sabotagem dos
conservadores de linha-dura puderem ser contidas, e sem o uso da violência.
(Artigo publicado na página 15, Internacional, do
Correio Popular, em 27 de julho de 1989)
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