Inércia do Irã
Pedro J. Bondaczuk
O
seqüestro do Airbus A-300 da linha aérea do Kuwait, iniciado na terça-feira
quando o aparelho se dirigia ao Paquistão, e cujo desfecho está sendo sumamente
trágico, é o pior incidente desta espécie dos últimos tempos. Pelo menos em
termos de reféns mortos. O que causa uma certa estranheza, entretanto, nos
observadores é a imperícia com que as autoridades iranianas vêm conduzindo as
negociações com os terroristas, o que até certo ponto justifica as suspeitas de
alguns círculos da Casa Branca de que elas seriam coniventes com os piratas
aéreos. Ou, na pior das hipóteses, simpatizariam com eles.
O
gigantesco avião está estacionado no aeroporto Merhabad, em Teerã, há cinco
dias. É impossível que os estoques de alimentos do aparelho fossem suficientes
para tanto tempo. É óbvio que os seqüestradores estão recebendo ajuda externa.
De quem? O clima de tensão, principalmente entre os passageiros, (cidadãos
inocentes que nada tem a ver com as estrepolias, ditas políticas, dos responsáveis
pelo seqüestro), é certamente insuportável.
Além
do confinamento, obviamente indesejável, e dos naturais transtornos de uma
viagem tão abruptamente interrompida, os reféns ainda correm o risco real de
vida. Quatro deles, pelo menos, já foram sacrificados, vítimas do cego
fanatismo que não mede conseqüências para a consecução de seus atos. E nesse
período todo, autoridades acostumadas a lidar com situações dessa espécie
(aliás, ninguém tem mais "know-how" sobre reféns do que os iranianos,
recordistas mundiais de manutenção de pessoas seqüestradas em seu poder) não
conseguiram vislumbrar nenhuma solução? No mínimo, é um tanto insólito.
Pelos
informes disponíveis, os seqüestradores são libaneses, e não palestinos, como a
princípio se pensou. E a impressão que se tem é que esse grupo desconhecido até
aqui, chamado de "17 de Setembro", que teria assumido o ato, não
passa, na verdade, de disfarce da organização "Jihad", que estaria,
dessa forma, cumprindo a ameaça, feita no início de novembro, de atingir bens
ou cidadãos norte-americanos no Exterior.
Que
facções terroristas cometam tais desatinos, ainda se espera, pois esses
celerados pouco se importam com possíveis conseqüências. Provavelmente nem
atinam com o alcance daquilo que fazem. Mas que um governo, mesmo que por
simples omissão, facilite essa tarefa nefasta, é algo intolerável e contrário a
todas as normas de relacionamento internacional em períodos de paz.
Várias
evidências apontam que os seqüestradores pertencem à terrível "Jihad"
libanesa. Em primeiro lugar, a exigência dos piratas aéreos. Eles querem a
libertação de 21 terroristas, presos no Kuwait, condenados por ataques feitos
contra instalações norte-americanas e francesas. E essas ações foram realizadas
pelo grupo "Jihad". O segundo ponto que chama a atenção é o fato da
metade das vítimas fatais serem norte-americanas, e da maior parte dos 66
reféns, que estão em seu poder, serem da mesma nacionalidade.
É
do conhecimento de todos que o regime do Irã apóia (e há até suspeitas de que
participe) das atividades delituosas do "Jihad". Por todas essas
razões, a inércia das autoridades iranianas desperta, não apenas suspeitas, mas
a quase certeza da sua cumplicidade. E se isso se confirmar, não há dúvida, é
um flagrante ato de guerra contra os EUA, que pode ter até desdobramentos no
futuro.
(Artigo publicado na página 9,
Internacional, do Correio Popular, em 8 de dezembro de 1984)
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