Gorbachev
tem pouca chance
Pedro J. Bondaczuk
O
presidente soviético Mikhail Gorbachev, embora equilibrando-se precariamente
numa corda bamba, tendo milhões de cidadãos a exigir sua renúncia nas ruas das
grandes cidades, vendo seu projeto reformista sabotado por muitos e adulterado
por alguns, mantém-se determinado a promover uma revolução pacífica, sem
barricadas e sem sangue, em seu país.
As
pressões a que vem sendo submetido seriam suficientes para acabar com a
carreira de qualquer um que não tivesse a sua determinação e a sua convicção
nas idéias que prega. De um lado, os conservadores do Partido Comunista,
temendo perder os privilégios que maliciosamente, em nome da unidade
partidária, e de uma pretensa revolução mundial, se auto-atribuíram, fazem o
possível e o impossível para criar fatos novos, que conduzam ao fechamento do
regime. De outro, os militares insinuam que Gorbachev deve, simplesmente,
reprimir a oposição e tomar as rédeas do poder absoluto nas mãos,
ditatorialmente, ao estilo de Leonid Brezhnev ou até mesmo de Joseph Stalin.
Numa
direção oposta a esta estão os reformistas radicais, pretendendo demolir o
inseguro edifício socialista, com as bases apodrecidas pela arbitrariedade e
corrupção, pedra por pedra, ao invés de promover uma reforma. Esta facção é a
liderada pelo populista russo Bóris Yeltsin, hoje disparadamente o político
mais popular da União Soviética por falar a linguagem que o povo deseja ouvir,
mesmo que desacompanhada de atos concretos. Numa quarta vertente estão os nacionalistas,
que sequer desejam falar em união, mesmo que remodelada e integrada por Estados
soberanos.
A
tudo isso Gorbachev responde com a sua determinação de implantar, não à força,
mas através da persuasão, o projeto que o tornou famoso no mundo todo, mesmo
parecendo impossível, a esta altura, que ele consiga persuadir quem quer que
seja nesse autêntico "saco de gatos" em que a URSS se transformou.
Aos
conservadores disse, em junho passado, que, ou eles se modificam no
comportamento e no dogmatismo que os intoxica, ou ficarão à margem da
reconstrução do país para o transformar numa superpotência que realmente mereça
este nome.
Aos
militares, advertiu, num discurso pronunciado às Forças Armadas no início da
semana: "Se a adoção dessas medidas (para restabelecer a ordem) significa
um retorno aos velhos métodos, à repressão e à violência, então devo dizer
categoricamente que não pretendo recorrer a esses meios".
Os
reformistas radicais, o presidente sequer leva a sério, encarando Yeltsin como
mero "aventureiro", obcecado pela sede de poder pelo poder.
Aos
nacionalistas, finalmente, classifica como irresponsáveis e sem visão de
conjunto, escolhendo a indigência de Estados paupérrimos e economicamente
inviáveis à participação num projeto de construção de uma superpotência
exemplar e sobretudo democrática.
Todas
as cartas vencedoras, todavia, neste momento, estão com seus adversários, que
não são obrigados a agir, como Gorbachev é. A cada dia que passa, ao invés de
obter adesões ao seu projeto reformista, tem visto decepcionantes defecções de
setores que julgava leais.
Ajuda
do Exterior, por outro lado, não tem recebido muitas, pois apesar do apregoado
fim da guerra fria, o Ocidente continua ainda adotando não apenas a linguagem,
mas também o comportamento desse período. Sua situação, portanto, é não apenas
insustentável, como até mesmo desesperadora. A menos que retire, como tem feito
nestes últimos seis anos, algum novo "coelho da cartola" e reverta
todos os dados a seu favor, sua queda parece ser somente questão de tempo.
(Artigo
publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 6 de abril de
1991).
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