Wednesday, October 15, 2014

Vitória sobre inflação faz esquecer escândalos


Pedro J. Bondaczuk


O presidente argentino, Carlos Menem, é protótipo do populista peronista, bem na linha do criador do justicialismo, Juan Domingo Perón, embora sem ostentar aquela postura de "pai dos pobres" do falecido caudilho. Pelo contrário, busca passar a imagem do "bom vivant", do esportista, do amante de festas, de música e de belas mulheres.

Isto, embora descontente os eternos guardiões da moral pública, impressiona bem o cidadão comum, que gostaria, evidentemente, de estar em seu lugar. Escândalos, neste ano, envolvendo a figura do presidente e as pessoas que o cercam, não faltaram. Como o do suposto suborno de seu cunhado, Emir Yoma, a uma subsidiária de uma empresa norte-americana. Como o caso da Ferrari presenteada a Menem por empresários italianos. E, principalmente, como o suposto envolvimento de sua cunhada, Amira Yoma, na lavagem de dinheiro do narcotráfico, para citar somente os de maior evidência.

Mesmo assim, embora a popularidade pessoal do presidente tenha oscilado no período, seu partido chega às eleições provinciais novamente em posição de favorito. Seu grande trunfo é o ex-chanceler e atual ministro de Economia, Domingos Cavallo, e principalmente o êxito de sua estratégia econômica.

Para um governo que assumiu antecipadamente o poder, com o país atravessando um clima de convulsão social por causa da hiperinflação, caracterizado por saques a estabelecimentos comerciais e ameaça de guerra civil, obter uma taxa inflacionária como a do mês passado, de 1,3%, característica de países europeus de Primeiro Mundo, é lícito festejar. O argumento é irresistível. O êxito chega a beirar o milagre.

Os argentinos estão pouco se importando com o diz-que-diz-que que cerca seu presidente. É verdade que a vitória sobre a inflação teve um custo social que só com o tempo poderá ser avaliado. Mas o clima na Argentina já é de esperança, chegando mesmo à euforia em alguns círculos, o que o recente "boom" da bolsa de valores comprova.

Menem vem conseguindo reunir o carisma de Perón ao charme dos boêmios portenhos, decantados em verso e prosa em tangos que se tornaram legendários. Com escândalos ou sem eles, o fato é que sempre está em evidência. Como bom populista, sabe dar o passo certo na hora adequada. Mostrou isso quando resolveu mandar dois navios argentinos para o Golfo Pérsico durante a guerra contra Saddam Hussein, quando seus vizinhos ficaram "em cima do muro". E quando se tornou necessário, não teve escrúpulos até de lançar mão de teses típicas da direita, como a sua proposta de instituir a pena de morte.


(Artigo publicado na página 24, Internacional, do Correio Popular, em 8 de setembro de 1991).

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