Emissoras prometem
mudanças em março
Pedro
J. Bondaczuk
A partir da próxima
semana, diversas emissoras de televisão prometem mudanças em suas programações,
dando início, assim, efetivamente, ao “ano letivo” do setor. Não se sabe por
quais cargas d’água os programadores cismaram que no período de férias
escolares não requer nenhuma atenção. Já a partir do início de janeiro retiram,
do fundo do baú, os velhos e surrados enlatados, mostrados exaustivamente e que
acabam sendo repetidos todos os anos. É a isso que chamam de “Festival de
Férias” ou algo parecido.
A Rede Globo é
especialista nisso. A maior parte dos filmes que foram exibidos por ela nesse
período foi mostrada tantas vezes que quase todo o mundo já conhece (até de
trás para a frente) cada enredo. Assim não dá”
Tradicionalmente, e não se sabe o por quê disso, os lançamentos são
reservados para o mês de março. E pelo que as diversas emissoras estão
anunciando, a programação, de nova, terá apenas o nome. Alguns programas serão
mostrados com outros títulos. Mas os esquemas continuarão sempre os mesmos. Os
tão batidos e repetitivos shows, seriados repletos de violência e de
ideologismos, fazendo a apologia do herói americano e colocando um pouco mais
de lenha na cansativa fogueira da “guerra fria” e uma ou outra produção
aceitável, tendente a ser retirada meses depois, sob a alegação de falta de
audiência.
Pelo menos em duas
áreas, porém, as emissoras não terão que inovar no corrente ano, por contarem
com um material que por si só é o espetáculo: na jornalística e na esportiva.
Bastará que trabalhem com competência e criatividade para a conquista de
índices expressivos de sintonia dos telespectadores. Na primeira, teremos as
eleições, e das mais importantes para a vida institucional do País. Todavia, o
tema que já deveria estar nas telas, sendo debatido pela sociedade e veiculado
exaustivamente pelos meios de comunicação, anda, estranhamente, esquecido.
Parece que há um certo interesse de determinados grupos para que o público não
se esclareça a seu respeito e continue fazendo as confusões que faz.
Referimo-nos à escolha da Assembléia Constituinte, que deverá ser eleita em
novembro próximo.
Nenhum canal teve a
visão de promover qualquer espécie de discussão em torno do assunto. Ninguém
trouxe ao vídeo, e portanto aos lares de todos os brasileiros, o pensamento das
lideranças das mais variadas correntes de opinião sobre como esses segmentos
desejam que seja a nossa próxima Carta Magna. Nenhuma emissora deu sequer
espaço, a não ser em algum pé de matéria fria, para os vários debates que já se
desenrolam em torno do tema. Estranho isso, não é mesmo? Estranho e
inquietante. Pelo que parece, o País vai ter outra Constituição elitista, que
não vai levar em conta a realidade nacional e só vai servir de detonadora de
novas crises institucionais no futuro.
A segunda área de farto
noticiário para as emissoras neste ano será a esportiva, com a disputa da Copa
do Mundo de Futebol no México. Nessa, ao contrário do que se verifica na
jornalística, a movimentação é das mais intensas. Afinal, o esporte predileto
do País, paixão maior de 135 milhões de brasileiros, hoje em dia é um negócio
multimilionário, envolvendo inúmeros setores: desde os próprios atletas
profissionais, as principais vedetes desse show de emoções, a empresas de
turismo, agências de publicidade, companhias de aviação, e assim por diante.
Por ser um bom negócio, o assunto Copa do Mundo sempre tem quem queira
patrocinar e por isso não faltam programas envolvendo a nossa Seleção.
Entretanto, se a
cobertura do Mundial do México for feita da mesma forma como as atividades de
treinamento dos 25 craques de Telê Santana estão sendo mostradas, coitado do
torcedor. Há gente fazxendo o possível e o impossível só para aparecer. Há
repórteres esquecendo-se que seu papel é captar e transmitir, com o maior rigor
e fidelidade possíveis a informação e não se transformarem na própria notícia.
Há comentaristas que julgam que o torcedor brasileiro é burro em matéria
futebolística, elaborando suas análises em cima do que o saudoso Nelson
Rodrigues classificava de “óbvio ululante”. Se na fase de treinos a coisa está
dessa maneira, o crítico fica imaginando com seus botões como será na hora do
vamos ver.
É verdade que a guerra
pela audiência, nesse setor, é das mais acirradas entre as várias emissoras. Afinal,
esse é o “filet mignom” de 1986 e ninguém deseja ficar para trás, sob o risco
de ver comprometido seu faturamento publicitário no ano. Mas é bom que as
emissoras se lembrem que o telespectador é caprichoso. Apega-se a detalhes, às
vezes muito sutis, para eleger seus preferidos. O caminho mais lógico e
coerente a seguir para a conquista desse público é dar-lhe um máximo de
informação, precisa, objetiva e bem editada, sem nenhum vedetismo por parte dos
profissionais encarregados desse trabalho. O desportista não está preocupado
sobre os dotes histriônicos deste ou daquele repórter, narrador ou
comentarista. Quer é saber das condições físicas e técnicas de um Zico, de um
Careca, de um Falcão ou de um Casagrande. Está curioso em esclarecer-se como
estão se comportando os novatos, como Müller, Silas, Elzo e Júlio César. O
resto é dispensável. Como o são, também, vários programas que há anos vêm
chateando o telespectador que investiu na compra de um receptor e que às vezes
se arrepende amargamente por não ter depositado esse dinheiro numa caderneta de
poupança.
(Comentário
publicado na página 22, Arte e Variedades, do Correio Popular, em 28 de
fevereiro de 1986).
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