Saturday, October 11, 2014

Em maio será para negociar


Pedro J. Bondaczuk


O líder nacionalista negro sul-africano, Nelson Mandela, recebeu, ontem, a sua primeira homenagem pública internacional à qual pôde estar presente, que lhe foi tributada pela fibra e determinação que demonstrou durante os 27 anos em que esteve em cativeiro. Num estádio de Wembley, em Londres, superlotado, grandes astros de rock fizeram uma apresentação, de cinco horas de duração, em que demonstraram um pouco do carinho e da admiração que todos nós gostaríamos de mostrar a esse homem corajoso, que ousou enfrentar uma das maiores máquinas repressivas da história, somente com a convicção de suas idéias. Todavia, em sua breve passagem pela Grã-Bretanha, o vice-presidente do Congresso Nacional Africano, CNA, não se encontrou com uma personalidade controvertida, peça importante no drama vivido por ele e principalmente pela África do Sul. Referimo-nos à primeira-ministra Margaret Thatcher.

A premier britânica, com a popularidade descendo ladeira abaixo na atualidade, por causa de uma nova lei de impostos, sempre se opôs à aplicação de sanções econômicas ao regime segregacionista sul-africano, contribuindo para que o "apartheid" continuasse inabalável por tanto tempo. Aliás, as posições políticas (nacionais e internacionais) da dirigente conservadora, têm primado pela polêmica. Ainda recentemente, opinando sobre a reunificação das duas Alemanhas, Thatcher manifestou que o processo não pode seguir uma dinâmica independente, carecendo de aprovação prévia de várias outras partes interessadas em toda a Europa.

Isto valeu uma reação irritada dos alemães ocidentais. O jornal "Bild", num editorial de 12 de fevereiro passado, chegou a ridicularizar a proposta da primeira-ministra, de realização de uma ampla consulta sobre a união dos dois Estados germânicos. Num determinado trecho, o articulista escreveu: "Se a idéia de Thatcher for aceita, o sindicato dos motoristas de táxi de Londres, a Associação dos Criadores de Pombos do Soho, o 'lobby' do uísque escocês e até o Clube dos Observadores do Monstro de Loch Ness terão que opinar sobre a reunificação. O mundo se alegra diante da possibilidade de reunificação, enquanto Maggie continua a resmungar".

Mas a "dama-de-ferro" é uma política determinada também. Costuma sair de situações sumamente desvantajosas para o sucesso. Foi, aliás, o que ocorreu quando da última eleição geral em seu país. Até a véspera do pleito, estava abaixo dos trabalhistas em quase todas as pesquisas de opinião. Subitamente, reverteu a situação e obteve uma consagradora vitória. Mandela, certamente, sabe da sua importância e peso. Tem ciência da influência e da liderança da primeira-ministra. Daí ter pautado uma reunião com Thatcher para o mês que vem, quando for a Londres não mais para receber homenagens, mas para tratar do que interessa de fato à maioria negra sul-africana: do sepultamento definitivo da intolerável política do "apartheid".

(Artigo publicado na página 14, Internacional, do Correio Popular, em 17 de abril de 1990)


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