Sunday, July 06, 2014

Vitória sem comemorações

Pedro J. Bondaczuk

A torcida brasileira tem motivos, óbvios, para comemoração. Afinal, a seleção pentacampeã do mundo galgou mais um degrau da escada metafórica que conduz a outro título, o sexto da história das copas. Agora só faltam mais dois. São íngremes e dificílimos, é verdade. Mas estão, teoricamente, ao alcance. Todavia... vejo poucas e discretas comemorações. Isso não se deve a eventual má performance dos comandados de Felipão, que aliás fizeram um Primeiro Tempo brilhante na vitória por 2 a 1 contra a Colômbia, na tórrida Fortaleza. É certo que a principal estrela da companhia, Neymar, não luziu. Provavelmente sentiu ainda os efeitos das várias pancadas que recebeu no jogo contra o Chile. Nem foi preciso que “tirasse algum coelho da cartola”, que protagonizasse algum dos lances mágicos com que costuma encantar a torcida e superar a vigilância das defesas adversárias.

A zaga brasileira resolveu a parada. Foi eficiente na sua função específica, a de evitar o sucesso do oponente. Mas foi além. Os dois gols que garantiram a vitória brasileira foram de nossos competentes zagueiros: Thiago Silva e David Luiz. Há, como se vê, motivos concretos para comemorações. Todavia... não estamos comemorando. Não com a euforia e a intensidade que a façanha merece. O clima, na torcida e no grupo da seleção, é de velório, ou quase. Afinal, o maior craque dessa equipe inexperiente e visceral, que chora e que ri. foi absurda e covardemente agredido por um defensor adversário, pelo ala colombiano Zuniga, e... está fora da Copa. Isso mesmo, Neymar sofreu fratura em uma vértebra e está fora do Mundial.

Que o futebol, de uns tempos para cá, se tornou mais físico, mais viril e ríspido e menos técnico, é público e notório. Porém, não se pode confundir virilidade com violência. Os defensores europeus, por exemplo, são intensos em seu empenho para pararem os principais e mais hábeis atacantes do mundo, mas, salvo uma ou outra exceção, raramente os alijam de alguma partida e muito menos de determinada competição. Todavia, na América do Sul ainda impera o malfadado “espírito de Libertadores”. Conforme essa (estúpida) mentalidade, vale tudo para se obter a vitória, não importa se o expediente adotado é lícito ou não, se é aético ou desonesto. Neymar foi vítima dessa excrescência, que não tem nada a ver com esporte e, portanto, com o futebol.

Eu tinha a intuição que isso poderia acontecer. O jovem e talentoso astro brasileiro vinha sendo caçado em campo há tempos, sob olhares complacentes de árbitros incompetentes e preguiçosos. Torcedores estúpidos, que não abrem mão de paixões clubísticas nem quando o assunto é seleção, pespegaram-lhe o rótulo de “cai cai” (que os argentinos caracterizam com o termo, em espanhol, “piscinero”). Ou seja, de contumaz simulador de faltas, para ludibriar a arbitragem. Quem assiste, porém, suas atuações com isenção de ânimo, sem considerar Neymar como “inimigo” só porque ele nunca vestiu a camisa do seu time de coração, sabe que noventa e nove por cento das pancadas que parece levar leva de fato. Caso eventualmente simule alguma falta, nenhuma dessas simulações é em quantidade e intensidade maiores do que qualquer outro atleta.

Confiando nessa (injusta e despropositada) fama, muitos e muitos defensores, sobretudo sul-americanos, sentem-se liberados para caçar o menino de vinte e dois anos, distribuindo-lhe pancadas, como se algo justificasse essa deslealdade e tamanha violência. Contam, para isso, com a complacência de árbitros preguiçosos, lenientes, ruins e despreparados, que fazem vistas grosas ao que lhes cabe coibir. Até água mole em pedra dura de tanto que bate em algum momento a fura. Pois é... Bateram, bateram e bateram tanto em Neymar, e não de agora, até que alguém conseguiu o que vários tentaram em vão: tirar o craque de atividade... E da Copa. E olhem que ele teve sorte em não ter que encerrar prematuramente uma carreira que tinha (e tem) tudo para ser brilhante.

E o que vai acontecer com o agressor? Nada?! Não é possível!. As imagens são claríssimas. Zuniga entrou na maldade sobre Neymar. Não foi, como tenta argumentar, lance de jogo. Foi nítida agressão. E mais, feita pelas costas, o que não deu à vítima a mais remota possibilidade de defesa. Não se tratou de acidente de trabalho, como muitos argumentam. Quem acha que foi, ou não assistiu as imagens e, portanto, é desonesto em opinar sobre o que não viu. Ou é sumamente maldoso e mal intencionado. Se a mordida de Luís Suarez no zagueiro Chielini lhe valeu nove jogos e quatro meses de suspensão, além de multa, utilizando idêntico critério, qual a punição que Zuniga merece?

A esse propósito, concordo com um jornalista uruguaio, em entrevista que deu aos canais de TV a cabo Fox Esportes, cujo nome não consegui memorizar. Ele comparou as duas infrações. Disse: “Suarez mordeu, é verdade, o zagueiro italiano, que não precisou, sequer, de atendimento médico. Prosseguiu no jogo, sem nenhuma seqüela. Neymar, todavia, não somente teve que sair de campo para ir direto para um hospital. Foi tirado da Copa”.

Suarez errou, óbvio, e foi severamente punido. Mesmo sem deixar seqüela alguma em Chielini. E Zuniga? Ficará impune? Afinal, seu ato covarde e despropositado, trouxe prejuízos, não apenas técnicos, e não só para o Brasil. Lesou a própria Fifa, promotora do Mundial. Tirou da Copa do Mundo uma de suas principais atrações. Ou estou errado? Por isso, a torcida não está comemorando, não com a euforia que o feito da Seleção merece: a classificação brasileira para as semifinais. Esse ato violento e absurdo pode distorcer – possibilidade sumamente real – o próprio resultado final da  competição. E daí?!


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