Tuesday, July 29, 2014

Camaradagem entre superpotências



Pedro J. Bondaczuk


O clima de distensão entre as superpotências, erigido laboriosamente em três reuniões de cúpula entre o presidente norte-americano, Ronald Reagan, e o líder soviético, Mikhail Gorbachev, vem se mantendo intacto, e até se ampliando, a despeito das desavenças existentes nas negociações de Genebra, sobre um acordo para a redução em 50% dos mísseis ofensivos de longa distância dos Estados Unidos e da URSS.

Isto ficou bastante evidenciado, ontem, no encerramento da visita do secretário de Estado, George Shultz, a Moscou. O encontro desse funcionário com o dirigente do Cremlin foi marcado por amabilidades e até por algumas brincadeiras, como que a refletir uma certa “camaradagem” desenvolvida entre ambos, impossível de se prever há ainda pouco tempo.

O chefe da diplomacia norte-americana, por outro lado, saiu de vários encontros que manteve com as autoridades russas mais convencido do que nunca de que a retirada do Afeganistão é algo iminente. Se ela de fato acontecer, com certeza a confiança mútua entre os líderes das superpotências tende a crescer bastante, facilitando, destarte, a solução de inúmeros outros problemas pendentes no mundo, como as guerras civis de Angola, do Camboja, da América Central, da Etiópia e de tantos outros recantos miseráveis, onde povos sofredores pagam um preço muito alto pelo conflito ideológico entre Leste e Oeste.

Em raras ocasiões foi possível sentir tamanho otimismo nas declarações de algum secretário de Estado dos Estados Unidos, de regresso de Moscou, como o expressado por Shultz, em sua entrevista coletiva de ontem. Esse clima favorável, com toda certeza, deverá se refletir em todas as partes onde os dois gigantes mundiais têm interesses.

Ou seja, virtualmente, em todo o Planeta. Os “refuseniks” soviéticos, por exemplo, serão os beneficiários mais imediatos, recebendo maior quantidade de vistos para irem para Israel. A própria população da URSS vai se beneficiar, mediante um respeito maior às suas liberdades individuais e aos seus direitos humanos por parte das autoridades.

Oxalá nenhum incidente banal, desses que costumam acontecer ao acaso ou ser provocados pelos que vêem apenas no confronto o único caminho para as superpotências, não venha a arruinar um laborioso trabalho diplomático, desenvolvido nos últimos três anos. Que a pequenina abertura para a paz existente agora seja ampliada, até se tornar uma estrada ampla, por onde toda a humanidade possa trafegar.

(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 23 de fevereiro de 1988).


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