Thursday, July 24, 2014

Inimigo subestimado


Pedro J. Bondaczuk


O problema das drogas, que não é novo, mas que se agravou bastante, em especial na presente década, raramente mereceu das autoridades mundiais a atenção que deveria ter merecido. É verdade que as polícias da maioria dos países mais destacados do mundo pela sua riqueza fizeram o que estava ao seu alcance e, algumas vezes, até o além dele.

Foram inúmeras as operações que desmantelaram redes do tipo “Conexão França”, e outras mais. Todavia, o que faltou foi continuidade desse trabalho. Foi respaldo das autoridades para que as ervas daninhas extirpadas não voltassem a brotar, e com força crescente. Foi um esforço conjunto e inteligente, em nível internacional, visando interromper o diabólico ciclo que se inicia com a produção e termina com inúmeros jovens transformados em zumbis.

Hoje, a questão das drogas, em virtude desse desleixo, já deixou de ser um problema meramente policial. Extrapolou os becos escondidos de favelas e as ruas das grandes cidades para infiltrar-se, praticamente, em todas as camadas da sociedade, e em todas as atividades.

De um negócio marginal, próprio para bandidos, ganhou status, alcançou classes mais abastadas e intelectualizadas e hoje é, ao lado da Aids, da guilhotina nuclear, da explosão populacional, da depredação ambiental, da miséria e do terrorismo, um dos maiores problemas de toda a humanidade.

A polícia até que vem fazendo a sua parte. Não passa um único dia em que não haja alguma informação dando conta da apreensão de gramas, quilos ou até mesmo toneladas de cocaína, ou de maconha, ou de heroína, e da prisão dos respectivos traficantes. Mas sua função é limitada. Restringe-se quase que somente a isso. A apreender e prender.

Quando os responsáveis por esse comércio nefasto são levados perante a Justiça – isso quando o são – as penas que recebem chegam a ser ridículas (quando não são absolvidos), de tão irrisórias, na maioria dos países. Há exceções, é claro, mas estas são muito raras. E, quase sempre, quem acaba sendo preso é o peixinho, a conhecida mula, ou seja, o indivíduo que é pago somente para transportar o produto. O cabeça, permanece resguardado e anônimo. .

Os barões das drogas, do tipo Lehder Rivas e outros grandes capitães do Cartel de Medellín, raramente caem nas mãos das autoridades. Aliás, na Colômbia, a prática de extraditar os grandes traficantes para os Estados Unidos criou um grande problema nacional.

Ninguém quer ser juiz de tribunais que precisem tomar uma decisão desse tipo, tamanhas são as ameaças que pesam sobre os magistrados, por parte das organizações criminosas. É claro que muito pouco desse exercício coercitivo vem a público. E a polícia fica de mãos amarradas, sem poder agir, em tais casos.

Como se vê, o problema já extrapolou, em muito, a mera ação policial. Está exigindo o engajamento de outras forças, mais poderosas, e que sejam mais eficientes, para atacar as fontes de produção e de refino da droga. Para a coibição do tráfico. E para evitar, principalmente, que tantos jovens, brilhantes e promissores, se deixem tapear pelos agentes do vício, para que não caiam nessa escravidão perpétua.

A quantidade de tóxicos produzida é de tal ordem, que qualquer estimativa que se faça corre o risco de se tornar ridícula, tamanha seria a sua subestimação. Pelas apreensões policiais, efetuadas em duas épocas distintas, dá para o leitor avaliar a dimensão dessa catástrofe mundial.

Em 1975, foram apreendidas, apenas de cocaína, três toneladas. Dez anos depois, em 1985, a polícia conseguiu tirar 56 toneladas da droga de circulação. Ou seja, dezenove vezes mais. E essa quantidade, em relação ao total produzido, não passou de mera gota de água num oceano.

Por isso, é para lá de urgente que todos se conscientizem das dimensões reais do problema. E que a humanidade combata, sem tréguas e nem vacilações, de maneira incansável, este que já se tornou o inimigo número um da espécie humana.

(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 18 de junho de 1987).


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