Thursday, January 30, 2014

Várias formas de analfabetismo

Pedro J. Bondaczuk

O Brasil é o oitavo país do mundo em número de analfabetos com mais de quinze anos de idade. É, pelo menos, o que leio em matéria da “Folha de S. Paulo” on line, na edição de 29 de janeiro de 2014. Mais esta! Esse é um ranking que gostaria que não figurássemos jamais. Ainda mais em uma posição tão desvantajosa e lamentável. É certo que o Brasil está nessa colocação por ser um dos cinco países mais populosos do mundo (é exatamente o quinto). Tanto que quem ocupa a liderança mundial nesse quesito é a Índia, seguida da China. Nesse caso, inverteram-se, apenas, as posições em relação ao número total de habitantes. Os indianos constituem o segundo maior contingente populacional do mundo e os chineses são os primeiros. O Paquistão, que é o terceiro em número de adultos analfabetos, leva desvantagem, pois tem população total bem menor que o Brasil.

Para nós, todavia, ganha relevância a situação brasileira. Ademais, não se trata, propriamente dito, de questão numérica, ou da posição que cada país ocupa nesse lamentável ranking. A existência de um único analfabeto já é preocupante. Imaginem 13,2 milhões (os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)!!!. Essas cifras, é verdade, podem ser menores, mas podem, também, ter crescido, já que se referem a 2012.

Com todas as possíveis atenuantes, todavia, essa quantidade de adultos analfabetos preocupa, e muito. Sobretudo, particularmente, a nós, que garantimos nossa sobrevivência econômica com a produção de textos. É óbvio que, quanto mais forem as pessoas que não saibam ler, menor será a quantidade de nossos leitores potenciais. E no caso brasileiro, estamos perdendo pelo menos 13,2 milhões deles. Claro que não somos apenas nós que perdemos com isso. Todos, absolutamente todos perdem, mesmo que muitos achem que não. Ninguém, rigorosamente ninguém sai ganhando. Em termos proporcionais, para um país de 202 milhões de habitantes, a cifra não chega a ser alarmante. Insisto, todavia, que não se trata de quantidade. Trata-se de um contingente nada desprezível de brasileiros que nada mais têm a oferecer à sociedade (sem contar às suas famílias) senão, e exclusivamente, a força muscular de seus braços (isso se a tiverem).

O levantamento da Organização das Nações Unidas para a Educação,  a Ciência e a Cultura (Unesco), não leva em conta o imenso contingente de analfabetos funcionais, nem no Brasil e nem no mundo. Deveria levar. Quem está nessas condições não sabe, de fato, ler e nem escrever. Analfabeto funcional, recordo, é aquele sujeito que sabe “escrever” (na verdade “        desenhar”) o nome, consegue juntar letras para formar palavras, mas não entende bulhufas do que lê. Pois então, onde a dúvida? Por que a diferença de classificação? É analfabeto, sim senhor, e ponto!!! Se formos considerar esse grupo, que em 2012 atingia 27,8 milhões de brasileiros, teremos um total de 41 milhões de nossos leitores potenciais a menos. É muita gente! É pouco menos do que o equivalente à população total da França!!!

Imaginem, então, se fôssemos adotar o critério de analfabetismo detectado por Mário Quintana! Para quem não sabe a que me refiro, informo que o poeta escreveu certa feita: “O pior analfabeto é aquele que sabe ler, mas não lê”. Por este parâmetro, as cifras de brasileiros nessas condições iriam às nuvens, talvez às estrelas. Chego a desconfiar que girariam ao redor dos 90%. Exagero meu? Nem tanto! É só atentar para as estatísticas de leitura. E estas indicam que o brasileiro lê, em média, dois livros por ano!!! Isso mesmo, apenas dois!!!. Essa quantidade é a mesma que muitos leitores compulsivos (pena que não sejam tantos quantos desejaríamos) lêem, e não muito raro, em somente um único dia. Já nem sonho com uma cifra astronômica dessas. Já me contentaria se a média de leitura dos brasileiros fosse de doze livros por ano, ou um por mês. É muito? Claro que não!!!

Fico imaginando quantos seriam os analfabetos, e não somente no Brasil (porém principalmente nele), mas no mundo, se o critério de analfabetismo fosse o proposto pelo escritor e futurólogo norte-americano, Alvin Toffler, que afirmou: “O analfabeto no século XXI não será aquele que não consegue ler nem escrever, mas aquele que não consegue aprender, desaprender e reaprender”. Quantos contam com essa habilidade? Poucos, pouquíssimos, talvez meia dúzia de gatos pingados. Este sim é monumental desafio para qualquer pessoa, incluindo intelectuais. Implica em reconhecimento de erro no aprendizado e em saudável e inteligente volta atrás. Só acho que Toffler foi otimista demais em sua previsão. Ela deixou implícito que neste século, que vai caminhando para sua segunda década, não teria mais ninguém que não soubesse ler e nem escrever. Enganou-se. Só de adultos, conforme a Unesco, ou seja, só de pessoas com mais de quinze anos de idade, o mundo tem 774 milhões de analfabetos (e isso sem contar os “funcionais”). Que atividade mais maluca é esta que escolhemos para assegurar nossa sobrevivência!!!


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