Praça jamais vai ser a mesma
Pedro J. Bondaczuk
A Praça da Paz Celestial de Pequim, a maior do mundo,
depois dos sangrentos acontecimentos de que foi palco nos últimos três dias,
jamais poderá voltar a ter esse nome, sob pena de se querer fazer ironia com as
mais de três mil pessoas que ali perderam a vida, covardemente chacinadas por
soldados do 27º Exército chinês, que cumpriram ao pé da letra as ordens do
radical primeiro-ministro Li Peng, para pôr fim ao pacífico movimento
estudantil que ali se desenvolvia.
Toda a comunidade internacional
ficou surpresa, e chocada, com a brutal reação dos radicais da China a algo que
eles próprios estimularam e que não tiveram competência para gerir. Antes dos
últimos e dramáticos acontecimentos, as autoridades marxistas, lideradas pelo
macróbio Deng Xiaoping, posavam de “boazinhas”, de liberalizantes, de
reformistas perante o mundo todo.
É preciso, agora, expor ao leitor
qual a nova imagem que elas passaram a ter? E o Exército de Libertação Popular
(ou pelo menos a parte dele que participou do dantesco massacre do fim de
semana)? Que vexame! Que falta de consciência do seu próprio papel!
Como poderá, doravante, usar a
denominação que tem, sem que desperte amargos risos dos parentes dos que foram
trucidados por seus membros? Que espécie de “libertadores” são estes que atiram
contra seu próprio povo desarmado?
Ter “amigos” como estes, torna
dispensável a existência de quaisquer inimigos. Como pode uma organização,
sustentada pelos cidadãos comuns, investir de armas em riste contra estes? Não,
este não é, nunca foi e nem deveria ser jamais o papel dos militares em nenhuma
sociedade, mesmo que esta não passe de um Estado policial, travestido de um
“regime de justiça social”, como é o caso chinês.
Como afirmamos no início destas
considerações, o célebre logradouro público de Pequim, orgulho dos moradores da
cidade, deveria chamar-se, doravante, de “Praça do Conflito Infernal”. Ou
“Praça dos Mártires da Democracia”, o que seria mais adequado.
Quem represa, durante anos, a
liberdade tem que ter competência para manter indefinidamente essa situação,
mesmo que ela não seja a mais desejável. É como os grandes diques que existem
na Holanda, represando as águas do mar. Um furo, por menor que seja, na muralha
monolítica, em questão de horas se transforma em rombo, numa torrente
incontrolável e irresistível que lança a barreira, fatalmente, por terra.
E o anseio de ser livre é o maior
de todos os que o homem possui. A “brecha” do processo liberalizante chinês
começou a ser alargada pelos estudantes. O massacre de Pequim, ao invés de
tapar o “buraco”, tenderá a derrubar a muralha, levando de roldão o fracassado
regime que lançou mão dessa odiosa truculência. É só esperar para conferir.
(Artigo publicado na página 15, Internacional, do Correio Popular, em 6
de junho de 1989).
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