Sunday, January 12, 2014

Prolífico escritor grapiuna

Pedro J. Bondaczuk

A trajetória literária de Adonias Filho foi das mais férteis e vitoriosas da Literatura brasileira. Em seus quase 75 anos de vida (nasceu em Itajuipe, na Bahia, em 27 de novembro de 1915 e morreu, em sua fazenda Iracema, em Inema, Sul do Estado, em 2 de agosto de 1990), legou à posteridade 21 livros, entre romances, ensaios, novelas e crítica, foi guindado (em 1965) à Academia Brasileira de Letras, na cadeira de número 21 da casa fundada por Machado de Assis, além de ter obras traduzidas para vários idiomas, entre os quais inglês, francês, alemão, espanhol e eslovaco. Foi, portanto, um dos escritores de maior relevo da Bahia, do Brasil e, por que não, do mundo.

Não por acaso Adonias Aguiar Filho teve o privilégio de abrir a antologia “Histórias da Bahia” (Edições GDR Rio de Janeiro, 1963), com o conto “O Brabo e sua índia”,  que tomei como referencial para esta informal série de estudos a propósito dos ficcionistas baianos. E mais, dada sua projeção, já na ocasião do lançamento da citada obra, coube-lhe a tarefa de redigir o prefácio, o que o fez com perícia e exatidão. Recorde-se que na época da publicação do livro, o escritor grapiuna, embora já contando com reconhecimento público e dos mais eruditos e prestigiosos círculos literários, ainda não era membro da Academia Brasileira de Letras, reconhecimento que viria, apenas, dois anos depois.

Há tempos que eu pretendia escrever sobre Adonias Filho, em cuja obra me debruço há já cerca de vinte anos, mas outros assuntos, talvez nem mesmo tão urgentes, foram se atropelando em minha pauta e não encontrava pretexto adequado para fazê-lo. Até que cismei em reler esta preciosa antologia de contos, “Histórias da Bahia”, que adquiri quando do seu lançamento, em 1963, posto que feita sem nenhum estardalhaço. Na época da primeira leitura desse livro, não lhe dei maior importância, mesmo me deliciando com seu conteúdo. Até que, semanas atrás, cismei em relê-lo e, coincidentemente, tal releitura ocorreu cinqüenta anos após sua publicação.

Convenhamos, embora em termos históricos, meio século seja um tempo até irrisório, na vida e na carreira de qualquer pessoa é bastante relevante.  Em um período, como este, de cinco décadas, muita “promessa” se confirma ou se frustra, muita experiência pode (e geralmente é) ser adquirida e muitas circunstâncias, favoráveis ou contrárias, ocorrem para confirmar ou derrubar expectativas a propósito de quem quer que seja. E Adonias Filho apenas confirmou (e em muitos aspectos superou) o que se esperava dele, nos anos posteriores a 1963, quando tinha 48 anos de idade. E teve que viver exatos 50 anos para ter seus inegáveis e indiscutíveis méritos literários plenamente reconhecidos, ao ponto de se tornar “imortal” da ABL.

A maior parte da sua carreira, o escritor baiano, e mais, um “grapiuna” – designação dada ao característico tipo da região cacaueira do Sul da Bahia, tal qual Jorge e James Amado e Jorge Medauar – desenvolveu no Rio de Janeiro, então capital federal do País, para onde se mudou em 1936, quando concluiu o curso secundário, feito em Salvador, no raiar dos seus 21 anos de idade. A essa altura, já havia iniciado, na terra natal, promissora carreira jornalística, à qual deu continuidade na Cidade Maravilhosa, aprendendo coisas novas e adquirindo experiência em redações recheadas de “monstros sagrados” do jornalismo.  Teve a cautela, porém, de concentrar-se no que se constituía na sua paixão e que sabia fazer muito bem: a Literatura. Tornou-se respeitado crítico literário.

No Rio, trabalhou no Correio da Manhã. Não tardou em ter suas críticas literárias requisitadas por grandes jornais paulistas, nos cadernos da “Hora Presente” de São Paulo, em 1937 e no “A Manhã”, em 1944 e 1945. Anos depois, já bem mais experiente e tarimbado e, sobretudo, com prestígio de crítico plenamente firmado, atuou nessa função no “Jornal de Letras” (de 1955 a 1960) e no “Diário de Notícias” (de 1958 a 1960). Mas colaborou, com bastante assiduidade, no tradicional “O Estado de São Paulo” e na “Folha da Manhã”. Nesse ínterim, é mister que se ressalte, publicou sete livros, a saber: “Renascimento do homem” (ensaio, 1937, sua obra de estréia), “Tasso da Silveira e o tema da poesia eterna” (ensaio, 1940), “Os servos da morte” (primeiro romance, 1946), “Memórias de Lázaro (segundo romance, 1952), “Jornal de um escritor (romance, 1954), “Modernos ficcionistas brasileiros” (ensaio, 1958) e “Cornélio Pena” (crítica, 1960).

Note-se que nessa fase sobressaiu o Adonias ensaísta, a despeito do estrondoso sucesso de crítica e de vendas do “Memórias de Lázaro”. Todavia, em meio a tantas atividades, sempre encontrava tempo para escrever e publicar em jornais e revistas diversos contos. O curioso é que, apesar de ser considerado (e de fato ser) um dos mais criativos, observadores e refinados contistas brasileiros, jamais publicou um único livro que fosse desse gênero. Sua obra ficcional foi inspirada em fatos e personagens da zona cacaueira próxima a Ilhéus, na Bahia, cenário da sua terra de nascimento e, sobretudo, de sua infância. Não por acaso, a despeito de sua erudição, ficou conhecido no mundo literário como “escritor grapiuna”. E que escritor!!!


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