Guerra que extrapola fronteiras
O terror voltou a agir,
desta vez em dois atentados sincronizados, realizados nos aeroportos Leonardo
da Vinci (conhecido carinhosamente por Fiumicino pelos romanos) na capital
italiana e de Schwechat, em Viena, na Áustria. Numa demonstração cabal de
insânia absoluta, 17 pessoas inocentes, entre as quais uma criança de onze
anos, filha de um jornalista norte-americano, foram mortos em ambos os locais,
sendo 14 no primeiro ataque e três no segundo.
Cento
e dez outras vítimas tiveram um pouco mais de sorte e apenas sofreram
ferimentos. Mas dez estão em estado grave e podem vir a engrossar o número de
vítimas fatais de mais esse episódio sangrento. Confirmam-se, dessa forma, as
previsões feitas por alguns analistas de que os extremistas voltariam a atacar
com dureza, para vingar alguns revezes sofridos no ano.
O
interessante de se observar é que não faltou quem prevenisse as autoridades
para essa possibilidade. Antes do Natal, a Interpol havia comunicado o pessoal
de segurança de diversos aeroportos, alertando quanto à possível ocorrência de
algum ataque terrorista no período dos festejos natalinos. Eles aconteceram
dois dias depois.
O
que o observador fica a se perguntar é: como foi possível o ingresso de
extremistas nos dois locais atingidos, armados como estavam, sem que nenhuma
autoridade policial percebesse? É necessário que os governos, especialmente os
europeus, se compenetrem que a guerra do Oriente Médio extrapolou, há tempos,
os meros limites daquela região.
Hoje
ela tem caráter total e é inconcebível que se abram brechas, por descuido ou
por desleixo, para que os guerrilheiros atuem. O resultado sempre acaba sendo
trágico e justamente para pacatos cidadãos, alheios às transas ideológicas ou
às questiúnculas territoriais que deflagraram esse processo de violência.
Nos
dois atentados de ontem, o alvo evidente foi Israel, representado por sua
empresa aérea El Al, atacada tanto em Roma quanto em Viena. E as autoridades
israelenses não ficaram alheias a isso. Tanto que o ministro da Defesa desse
país, Yitzhak Rabin, comentou ontem mesmo sobre os ataques e acusou a
Organização para a Libertação da Palestina por eles. Isso, mesmo os líderes
dessa entidade, nas capitais italiana e austríaca, apressando-se em negar
qualquer participação da OLP nessas ações e em condenar os atos de violência.
Consoante
a política israelense no trato com o terrorismo, é bastante previsível qualquer
ataque retaliatório do Estado judeu nas próximas horas. Como o deflagrado em 1º
de outubro passado, quando Phantoms F-16 de Israel voaram 2.400 quilômetros
para arrasar o quartel-general da OLP num subúrbio da capital tunisina.
Naquela
oportunidade, a ação foi para punir um seqüestro de um iate particular em
Lanarca, no Chipre, com três mortos. Imaginem agora que as vítimas fatais foram
17 e que mais de uma centena de pessoas foram feridas!
Até
que ponto vai essa guerrinha particular e quais os países que ela irá atingir,
é algo que fica por conta do imponderável. O próximo ataque tanto pode ser em
Paris, quanto em Londres, Copenhague, Haia ou Bruxelas. Será onde as
autoridades se descuidarem mais da segurança, confiando numa possível
imunidade, que de fato não existe,
O
número de cidadãos inocentes atingidos também é outra incógnita, podendo ser
20, 50, 70 ou até mesmo algumas centenas. E o pior de tudo é que não há como
evitar essas carnificinas, a não ser redobrando a vigilância, assim mesmo sem
nenhuma garantia de que essa atitude surta efeito.
Pelo
menos nesse aspecto, o do terrorismo, as previsões para 1986 não são para
entusiasmar ninguém. Fica, pois, provado, de uma vez por todas, que a força,
por maior que seja, tem suas limitações que às vezes chegam a ser até
insuperáveis.
(Artigo
publicado na página 8, Internacional, do Correio Popular, em 28 de dezembro de
1985).
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