O problema da moradia
Pedro
J. Bondaczuk
A
pujança de uma cidade não se mede pela quantidade dos seus
habitantes, mas pelo padrão de vida que estes ostentam. Há, hoje em
dia, dezenas de grandes aglomerados urbanos, que são como
gigantescos e caóticos acampamentos de refugiados, com absurdas
carências de toda a sorte dos seus moradores, que vegetam, em vez de
viver. Um desses casos, que pode ser citado apenas a título de
exemplo, é o de Calcutá, na Índia. Claro que não é a única das
"megalópolis" problemáticas e talvez sequer seja a pior.
Em
Campinas, uma discussão que se arrasta há tempos é se a cidade já
tem ou não um milhão de habitantes. O último censo conclui que
não. Muitos, no entanto, duvidam e ficam até indignados, como se o
fato do município não ser tão populoso quanto queriam, fosse um
demérito. Não é. Antes não tivesse nem os 968 mil moradores,
detectados pelo IBGE, que de fato tem! Não, pelo menos, nas
condições atuais.
Campinas,
literalmente, "inchou", nas duas últimas décadas, com um
fluxo quase incontrolável de migrantes, vindos de todas as partes do
País, obcecados pela miragem do pleno emprego, no auge da sua
industrialização e, por consequência, na expectativa de condições
de vida dignas do Primeiro Mundo. Ao chegarem aqui, decepção! A
cidade não estava preparada para acolher tamanho contingente de
excluídos. Por isso, hoje paga altíssimo preço por sua
generosidade (ou desleixo?).
De
repente, o problema de habitação, que nem era dos maiores, assumiu
dimensões assustadoras. Para se ter uma ideia, basta dizer que o
número de favelas no Município saltou de 74, em 1991, para 117 em
2000. Hoje, esses núcleos habitacionais, tão carentes, abrigam um
contingente populacional de mais de 160 mil pessoas. Ou seja, 16,5%
da população da cidade.
É
como se no meio de Campinas, houvesse uma Americana, toda constituída
por insalubres e sombrios barracos, com ausência das mínimas
condições de saneamento (água tratada, esgoto, etc.) e assistência
social. Mas a coisa não para por aí. Há outro fenômeno, até
pior: o das invasões. E estas já chegam a 121, envolvendo 22 mil
famílias, ou cerca de 88 mil pessoas. Perto delas, as favelas são
um luxo, tão carentes esses núcleos caóticos e improvisados são.
Para
resolver o problema (que veio de fora, é mister ressaltar), a cidade
depende também de recursos de outras esferas, que não os próprios,
dos quais é carente (tem uma dívida em torno de R$ 1,5 bilhão):
dos governos do Estado e do federal. Sem essa ajuda, a situação só
tende a se agravar, sem nenhuma perspectiva de solução, mesmo a
longo prazo.
Campinas,
para que se tenha uma ideia, já é a sexta cidade do País em número
de favelados, superando, inclusive, 21 capitais estaduais. Entre
favelas e ocupações, são 238 núcleos, com 248 mil pessoas, o que
representa 25,62% dos habitantes, mais de um quarto da população
total da cidade.
Para
resolver o problema da violência urbana, destaque-se, não basta um
aumento de contingente de policiais, guardas armados nas ruas, etc.,
embora, sem dúvida, isso atenue a criminalidade. É indispensável,
sobretudo, melhorar a qualidade de vida, e incluir na sociedade esses
248 mil excluídos, carentes, muitos deles famintos (50 mil pessoas
passam fome em Campinas), doentes e sem perspectivas de futuro. Caso
contrário... Não adianta tapar o sol com a peneira!
(Editorial
publicado na página 2, Opinião, do jornal Campinas Hoje, em 25 de
outubro de 2001).
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