Maçãs podres do Senado
Pedro J. Bondaczuk
O atual Congresso, cujo
mandato se encerra no fim deste mês --- já que a nova legislatura
começa em fevereiro com a posse dos eleitos e reeleitos em 3 de
outubro de 1994 --- conclui suas atividades (ou inatividades?) da
mesma forma lamentável que o caracterizou. Claro que não se deve
generalizar, pois há parlamentares que mostraram constância,
responsabilidade, patriotismo e principalmente serviço, independente
de partidos ou ideologias, nos últimos quatro anos. Mas a imagem que
vai ficar para a opinião pública da instituição, difícil de ser
apagada, será das mais negativas, em virtude dos inúmeros
escândalos que suas "maçãs podres" protagonizaram,
sobejamente conhecidos e que culminaram com um novo, e não menos
revoltante, caso.
Para encerrar a sucessão de
deslizes e equívocos, cometidos por um Congresso que não honrou
suas tradições de lisura, eis que o Senado --- felizmente a menor
parcela dele --- resolveu juntar, às várias irregularidades já
cometidas, uma nova: a da chantagem. Um grupo de senadores, boa parte
não reeleita (graças a Deus) para a função, decidiu não dar
quorum para a confirmação do economista Pérsio Arida para a
presidência do Banco Central. Não que o referido funcionário tenha
algo que o desabone ou não esteja habilitado para o cargo. Nada
disso.
Os parlamentares impõem como
condição para a aprovação, que em circunstâncias normais seria
líquida e certa, que a Câmara dos Deputados aprove uma descabida
anistia para os que tiveram sua eleição vetada pelo Tribunal
Superior Eleitoral por abuso do poder econômico! Ou seja, por
utilização da gráfica do Senado para a impressão de propaganda
política considerada ilegal. O que Pérsio Arida tem a ver com isso?
Nada! O que o País tem a ver? Absolutamente nada!
O episódio enseja uma série
de considerações. Por exemplo, algo que incomoda muito no caso,
fora a questão óbvia da ausência de ética, é a incoerência. O
que os legisladores pretendem é arranjar um subterfúgio para burlar
a própria lei que elaboraram. Ainda se essa atitude tivesse uma
finalidade nobre, embora continuasse condenável, teria uma
atenuante. Mas não tem. É o caso típico de representantes do povo,
agindo em nome deste, no cumprimento de um mandato que o eleitor lhes
conferiu, legislando em causa própria!
Outro pecado capital,
inconcebível num político que mereça tal designação, é a
estratégia adotada. Com a estranha "greve", feita pelo
grupo de senadores que perdeu completamente de vista a relevância,
finalidade e nobreza de suas funções, se nega a trabalhar, o que se
conseguiu, até agora, foi só o repúdio da opinião pública. E não
apenas em relação à sua atitude, mas também à causa que a
motivou. Nessas circunstâncias, o deputado que aprovar a anistia vai
estar desgastando --- sem qualquer necessidade --- sua imagem (que
nunca foi das melhores, frise-se) perante o eleitorado. Cometerá
suicídio político.
A "chantagem" está
conseguindo, na verdade, despertar a antipatia popular contra o
senador Humberto Lucena, ao invés da solidariedade. E provavelmente
ele é o menos culpado em todo esse lamentável "affaire",
já que o indecoroso projeto não é de sua autoria. Os senadores que
participam do boicote estão praticando a antipolítica. Sua
obrigação é a defesa dos interesses dos País, que são muito
maiores e mais relevantes do que os pruridos corporativistas, que
tratam o instituto da representatividade como se fosse mera ação
entre amigos e não o cerne da democracia que é. Ainda bem que a
maioria desses "chantagistas" não estará mais no Senado a
partir de fevereiro.
Aliás, já nem era para
estar, não fora a convocação de sessões extraordinárias --- que
não estão sendo realizadas --- no período de recesso. Ocorre que
os parlamentares estão recebendo para trabalhar. E não trabalham.
Sequer um tema não polêmico, como a mera confirmação de um
presidente do Banco Central, consegue reunir quorum, não importa a
razão. O eleitorado deve atentar para o nome dessas "maçãs
podres", para banir de vez da vida pública quem não sabe fazer
honrar a confiança depositada.
(Artigo publicado na página
2, de Opinião, do Correio Popular, em 9 de janeiro de 1995)
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