Monday, February 12, 2018


Maçãs podres do Senado


Pedro J. Bondaczuk


O atual Congresso, cujo mandato se encerra no fim deste mês --- já que a nova legislatura começa em fevereiro com a posse dos eleitos e reeleitos em 3 de outubro de 1994 --- conclui suas atividades (ou inatividades?) da mesma forma lamentável que o caracterizou. Claro que não se deve generalizar, pois há parlamentares que mostraram constância, responsabilidade, patriotismo e principalmente serviço, independente de partidos ou ideologias, nos últimos quatro anos. Mas a imagem que vai ficar para a opinião pública da instituição, difícil de ser apagada, será das mais negativas, em virtude dos inúmeros escândalos que suas "maçãs podres" protagonizaram, sobejamente conhecidos e que culminaram com um novo, e não menos revoltante, caso.

Para encerrar a sucessão de deslizes e equívocos, cometidos por um Congresso que não honrou suas tradições de lisura, eis que o Senado --- felizmente a menor parcela dele --- resolveu juntar, às várias irregularidades já cometidas, uma nova: a da chantagem. Um grupo de senadores, boa parte não reeleita (graças a Deus) para a função, decidiu não dar quorum para a confirmação do economista Pérsio Arida para a presidência do Banco Central. Não que o referido funcionário tenha algo que o desabone ou não esteja habilitado para o cargo. Nada disso.

Os parlamentares impõem como condição para a aprovação, que em circunstâncias normais seria líquida e certa, que a Câmara dos Deputados aprove uma descabida anistia para os que tiveram sua eleição vetada pelo Tribunal Superior Eleitoral por abuso do poder econômico! Ou seja, por utilização da gráfica do Senado para a impressão de propaganda política considerada ilegal. O que Pérsio Arida tem a ver com isso? Nada! O que o País tem a ver? Absolutamente nada!

O episódio enseja uma série de considerações. Por exemplo, algo que incomoda muito no caso, fora a questão óbvia da ausência de ética, é a incoerência. O que os legisladores pretendem é arranjar um subterfúgio para burlar a própria lei que elaboraram. Ainda se essa atitude tivesse uma finalidade nobre, embora continuasse condenável, teria uma atenuante. Mas não tem. É o caso típico de representantes do povo, agindo em nome deste, no cumprimento de um mandato que o eleitor lhes conferiu, legislando em causa própria!

Outro pecado capital, inconcebível num político que mereça tal designação, é a estratégia adotada. Com a estranha "greve", feita pelo grupo de senadores que perdeu completamente de vista a relevância, finalidade e nobreza de suas funções, se nega a trabalhar, o que se conseguiu, até agora, foi só o repúdio da opinião pública. E não apenas em relação à sua atitude, mas também à causa que a motivou. Nessas circunstâncias, o deputado que aprovar a anistia vai estar desgastando --- sem qualquer necessidade --- sua imagem (que nunca foi das melhores, frise-se) perante o eleitorado. Cometerá suicídio político.

A "chantagem" está conseguindo, na verdade, despertar a antipatia popular contra o senador Humberto Lucena, ao invés da solidariedade. E provavelmente ele é o menos culpado em todo esse lamentável "affaire", já que o indecoroso projeto não é de sua autoria. Os senadores que participam do boicote estão praticando a antipolítica. Sua obrigação é a defesa dos interesses dos País, que são muito maiores e mais relevantes do que os pruridos corporativistas, que tratam o instituto da representatividade como se fosse mera ação entre amigos e não o cerne da democracia que é. Ainda bem que a maioria desses "chantagistas" não estará mais no Senado a partir de fevereiro.

Aliás, já nem era para estar, não fora a convocação de sessões extraordinárias --- que não estão sendo realizadas --- no período de recesso. Ocorre que os parlamentares estão recebendo para trabalhar. E não trabalham. Sequer um tema não polêmico, como a mera confirmação de um presidente do Banco Central, consegue reunir quorum, não importa a razão. O eleitorado deve atentar para o nome dessas "maçãs podres", para banir de vez da vida pública quem não sabe fazer honrar a confiança depositada.

(Artigo publicado na página 2, de Opinião, do Correio Popular, em 9 de janeiro de 1995)



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