Síndrome da indecisão
Pedro J. Bondaczuk
O secretário especial de
Política Econômica do Ministério da Fazenda, Winston Fritsch, em
entrevista publicada no jornal “Folha de S. Paulo”, frustrou as
expectativas dos que esperam uma substancial queda da inflação
neste segundo semestre. Ressaltou que as taxas inflacionárias,
pressionadas pela recomposição das tarifas públicas, tendem, isto
sim, a subir mais alguns pontinhos.
Péssima notícia para o
trabalhador, que é o mais penalizado por essa disfunção econômica.
Terá que continuar fazendo incríveis malabarismos para a travessia
do que resta do corrente ano. A declaração do secretário, embora
sombria, reflete uma mudança de enfoque do governo. Ou seja, passou
a adotar a postura de não despertar falsas expectativas na
sociedade.
As manchetes dos jornais,
todavia, chamam a atenção do leitor para um aspecto que vem
caracterizando o brasileiro há muito, desde a redemocratização do
País: a indecisão. Por exemplo, a entrega da proposta de cortes
orçamentários ao presidente Itamar Franco foi adiada mais uma vez.
Outro adiamento refere-se à
posição governamental acerca do reajuste mensal de salários, cujo
projeto foi aprovado pela Câmara dos Deputados. A regulamentação
do Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira tramita com
uma enervante morosidade no Senado. Parece que o brasileiro adquiriu
um enorme pavor de decidir qualquer coisa. Daí a enxurrada de
comissões, estudos, relatórios e outras medidas protelatórias para
assuntos dos mais simples aos complexos.
Outro dia, no intervalo do
cafezinho, em conversa informal com o editor e editorialista de
Correio Popular, Roberto do Valle, este levantou uma tese
interessante e consistente a esse propósito. Argumentou que toda uma
geração ficou marcada pelos 22 anos de autoritarismo que o País
atravessou. Daí o pavor de decidir qualquer coisa.
Essa indecisão reflete-se nos
mínimos atos das pessoas. Valle destacou que isso ficou mais uma vez
evidente, por exemplo, na eliminação da seleção de futebol pela
Argentina, na Copa América. A derrota, como em 1986, na Copa do
Mundo do México, ou como no Mundial de Juniores de 1992, foi na
cobrança de penalidades máximas. A responsabilidade pesou demais
nos jogadores.
Nas repartições públicas,
questões extremamente simples levam tempo enorme para serem
decididas, pois os funcionários subalternos se recusam a assumir
determinadas decisões, que deveriam ser rotineiras. Encaminham a
papelada, invariavelmente, às chefias, abarrotando a mesa dos
chefes.
Nas empresas esse
comportamento também caracteriza o relacionamento profissional. Por
vias tortuosas, formam-se milhões de miniditaduras consensuais. Até
no âmbito familiar essa incapacidade de decidir manifesta-se
diariamente.
Uma das características da
liderança é, exatamente, a disposição, a coragem, a competência
e o senso de oportunidade na tomada de decisões. Em 1988 escrevemos,
no Correio, toda uma série de 22 ensaios, abordando a importância e
a necessidade desse exercício.
Se o leitor atentar bem, desde
o fim do regime militar, todos os nossos governos foram
caracterizados pela indecisão (e outros defeitos mais, que seria até
redundante relembrar). O presidente Itamar Franco, portanto, não é
o único e nem o mais indeciso dos nossos governantes. Por isso, um
dos caminhos para a saída da crise (não o único, é evidente) é o
brasileiro combater e debelar o mais rápido a “síndrome da
indecisão” que o caracteriza há tanto tempo.
(Artigo publicado na página
2, Opinião, do Correio Popular, em 1º de julho de 1993)
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment