Motor do espírito
Pedro
J. Bondaczuk
“A curiosidade é a mãe da sabedoria”, diz
conhecido dito popular. Trata-se de verdade óbvia, da qual poucos se
dão conta. Quem não é curioso, no bom sentido, não se sente
motivado a aprender coisa alguma, por mais que necessite desse
aprendizado, mesmo que invista nele todos os recursos de que dispõe.
Até aprende, mas com inaudito sacrifício, com muito esforço e, não
raro, com imenso sofrimento.
Este deveria ser, portanto, princípio básico da
educação. A criança precisa, desde tenra idade, ter sua
curiosidade despertada, espicaçada e estimulada, em relação a tudo
o que a cerca, não importa se a coisas concretas ou a ideias
abstratas, se a pessoas ou a objetos, se a acontecimentos ou se a
princípios. Não é, infelizmente, o que ocorre.
A curiosidade ilimitada, a ânsia
por descobrir novidades a cada instante da nossa vida (úteis ou
inúteis, não importa, já que saber não ocupa lugar), é fonte
inesgotável de experiências e de sabedoria. Nossa existência é
relativamente curta e precisaríamos ter milhares de vidas para
aprender, e entender, tudo o que o mundo tem a nos ensinar.
Há quem busque tolher essa
volúpia por informações, entendendo que se trata de um defeito.
Não posso concordar com quem age assim. Temos que fazer de cada
instante um renascimento, sem deixarmos tempo livre para emoções
negativas, como a cobiça, a inveja, a ira, a vingança e tantas
outras que só tendem a levar sofrimento aos outros.
A vida consiste em uma contínua
descoberta, desde o nascimento até a morte. A partir do útero
materno, quando nosso sistema nervoso e, por consequência, nosso
cérebro estão formados, já temos consciência, embora sem
possibilidades de externar esse conhecimento, de que existimos e nos
encontramos em um ambiente muito bem protegido e acolhedor. Pelo
menos é o que dizem os especialistas.
Aliás, isto é comprovável,
mediante o processo da regressão. Trata-se da primeira descoberta de
uma sucessão que cada indivíduo terá no correr de sua existência,
de acordo com a sua realidade e sua personalidade. E todas são
frutos desse poderoso motor do espírito, que é a curiosidade. Ao
morrer, descobriremos o quanto foram tolos os dogmas e valores aos
quais nos aferramos. Mas então já será tarde…
Por ser curioso, o ser humano
conquistou o átomo, embora não tenha feito sempre o melhor uso
dessa ciência. Pela mesma razão, descobriu e mapeou os códigos
genéticos, responsáveis pelas características de todos os seres.
Também movido por esse “motor”, aprendeu a duplicar animais e
vegetais.
O casal primitivo desobedeceu o
Criador e comeu o fruto da Árvore do Bem e do Mal. Por que? Foi,
também, por “curiosidade”, posto que mórbida, para ver o que
acontecia, mesmo intuindo qual seria o resultado. Perdeu a inocência
original, embora conquistasse o potencial de saber de tudo. Ou quase
tudo.
Só um conhecimento, e para o seu
próprio bem, lhe foi vedado (e para sempre): O do mistério da
essência da vida. Caso o conhecesse, provavelmente conduziria à
extinção da espécie. Tentaria imitar o Criador e certamente
criaria monstros que o destruiriam.
Algumas verdades, preexistentes,
mas que por alguma razão, não conseguimos alcançar em determinado
período da nossa trajetória vital, de repente, emergem diante de
nós, se desnudam aos nossos olhos, se revelam à nossa consciência.
Muitas são óbvias, mas
encaramo-las dessa maneira apenas depois de consumadas. Esta
consumação, em geral, ocorre com a aquisição da experiência, que
é resultado de muitos anos de empirismo, de sucessivas tentativas e
erros. E de uma permanente sede de saber, uma constante, incalculável
e persistente curiosidade. Às vezes, isso nos redime, às vezes, nos
decepciona, deprime e condena.
Uma descoberta, por exemplo, que é
complicada quando a fazemos, por ferir nosso amor próprio, é a das
nossas limitações. Mas ela é importante. Se quisermos empreender
conquistas, é indispensável sabermos onde estamos, o que somos, o
que queremos e o quanto podemos, até para podermos escolher a
estratégia e os meios para a nossa evolução.
Não é necessário, todavia,
alardear nossas deficiências. Mas é indispensável que as
identifiquemos e nos disponhamos a corrigir o que estiver incorreto.
O dramaturgo Auguste Strindberg sintetiza essa postura: "Para
mim, a alegria de viver está na dura e cruel luta pela vida. O
aprender algo é para mim uma alegria". Mas para que esse
aprendizado se torne possível, e, sobretudo alegre, é preciso
manter sempre ligado esse poderoso “motor” do espírito, que é a
curiosidade.
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