Meio e finalidade
Pedro J. Bondaczuk
As
campanhas para as eleições municipais de 3 de outubro começam a
ganhar as ruas, embora ainda timidamente, e já se observa o mesmo
tipo de comportamento vicioso que caracteriza o processo eleitoral
nacional: uso da máquina estatal, aliciamentos e esbanjamento de
dinheiro.
Todavia,
esta é a melhor das oportunidades para que os cidadãos deem início
a um amplo processo de renovação da vida pública do País, não
somente em termos de nomes, mas, principalmente, de comportamentos.
Os
acontecimentos que o Brasil todo observa, estarrecido, na atualidade,
no chamado escândalo PC e em outros, com denúncias e mais denúncias
de corrupção, negociatas e transações ilícitas, mostram com
clareza que o brasileiro ainda não apurou os seus critérios de
escolha. Falta uma consciência mais clara do poder e da importância
do voto.
Há
os que ainda entendem que votar é uma forma de protesto, quando o
objetivo está muito distante de ser este. Boa parte dos eleitores,
nas últimas eleições que o País teve, abriu mão de sua cidadania
e se omitiu. Muitos votaram em branco e um número não menos
expressivo anulou seu sufrágio, escrevendo gracinhas nas cédulas,
como se estivessem prestando algum serviço à Nação.
Houve
quem transacionasse sua indicação de um representante, quer para o
Legislativo, quer para o Executivo. Estes, trocaram o voto por
promessas de empregos, por objetos ou por favores pessoais. Não
votaram, portanto, naqueles que a seu critério eram os melhores, mas
subornaram e se deixaram subornar. Praticaram, por isso, um ato de
corrupção, como os que tanto condenam, embora talvez sequer se
dessem conta disso.
Não
há oportunidade melhor para iniciar um processo de moralização, no
entanto, do que as eleições municipais. É nos municípios que os
homens com talento para a vida pública descobrem suas vocações e
as exercitam. Além disso, as pesquisas dos candidatos, a apuração
do seu passado, da sua conduta, da sua capacidade, são mais
facilmente exercitadas.
Quem
se candidata a um posto expõe-se, explicitamente, a essa devassa. E
é lícito e recomendável que os eleitores a façam. O padre Antonio
Vieira disse que “a gentileza de um voto consiste em duas
proporções: em proporcionar o meio com o fim, e em proporcionar o
instrumento com o meio”.
O
que isso significa? Qual a finalidade de se votar? Numa democracia,
tal exercício destina-se a escolher os representantes do povo para
atuar em seu nome. Ou seja, para serem o “instrumento” de
manifestação de suas vontades e opiniões.
Como
alguém pode ser representado por quem pensa de forma completamente
diversa da sua ou cujas ideias sequer conhece? Pois foi isto o que
aconteceu nas últimas eleições. Não é o sistema democrático que
não funciona, o que há é uma falta de consciência sobre a
importância e até a transcendência do voto.
A
propósito, para quem vota por amizade, simpatia ou numa barganha com
o candidato, o padre Vieira alerta: “Melhorou a fortuna o vosso
maior amigo, e ao outro dia já vos olha com outros olhos, já vos
fala com outra linguagem: o que ontem era amor, hoje é autoridade; o
que ontem era rosto, hoje é semblante. Pois, meu amigo, que mudança
é esta?”.
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 18 de julho
de 1992).
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