A originalidade possível
Pedro J. Bondaczuk
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Os artistas – não importa qual seja a sua arte, seu local de
origem ou tempo em que viveram – têm, desde os primórdios da
civilização, uma obsessão que os acompanha a vida toda. Perseguem,
obstinada e incansavelmente, um “tosão de ouro” (como os
argonautas da mitologia grega), um “santo graal” (como os
cavaleiros da tavola redonda), que é a originalidade.
Na impossibilidade de escolherem temas que ninguém jamais abordou,
procuram ângulos novos, detalhes inusitados, nuances e minúcias de
assuntos batidos, mas que entendem nunca antes terem sido explorados.
E por melhores que suas obras venham a ser, frustram-se nesse
aspecto, que julgam fundamental.
Claro que não declaram sua frustração publicamente e não saem por
aí confessando que fracassaram. Carregam consigo, vida afora, como
um estigma de fracasso, essa decepção íntima, mesmo que sejam
bem-sucedidos em todos os aspectos. Nunca se sentem assim. A
insatisfação é o seu paradigma.
É possível o artista e – particularizando mais a questão – o
escritor serem originais, tendo em conta os milhões e milhões de
livros escritos tempo e mundo afora? O filósofo Will Durant entende
que não, embora abra duas exceções (com as quais sou induzido a
concordar). Afirma, no clássico “Filosofia da vida”: “Todas as
verdades são velhas e só os poetas e loucos podem ser originais”.
Ambos, aliás, guardam estreitíssima relação. E não têm o menor
pudor em dizer (e escrever) o que aos mortais comuns soe como
disparates, tolices, esquisitices, nonsenses, estapafurdices e
absurdos.
Vejam o caso do amor. Quanto já se escreveu, escreve e escreverá
sobre esse tema, tempo e mundo afora? Tanto que é impossível não
apenas contabilizar a quantidade de textos, mas até de se estimar
com razoável margem de precisão quantos foram. Neste preciso
instante, com certeza, milhares de escritores estão escrevendo sobre
o assunto, nos mais de 20 mil idiomas e dialetos existentes e nos 204
países que compõem o que se convencionou chamar de “humanidade”.
“Não é possível que com toda essa abrangência nenhum desses
homens de letras não seja original”, ponderará, com certeza, o
incrédulo leitor, levando em conta esse incontabilizável universo
de romancistas, contistas, cronistas, ensaístas e novelistas. Mas,
de fato, são? Nem é preciso conferir e comprovar (o que, ademais,
seria impossível), para garantir que não.
Por que? Porque, por mais subjetivo que o escritor possa ser, no
fundo, no fundo, foi condicionado a ser, sobretudo, objetivo. Sem
essa objetividade, não terá editor, leitor e, em suma, nem será
literato. Ademais, o amor é subjetivo. Racionalizado, não passa de
mero ato mecânico, voltado basicamente à cópula e, portanto, à
procriação. Vai daí... que todas as verdades, (ditas e escritas)
sobre esse sentimento são velhas. “Só os poetas e os loucos podem
ser originais” a respeito.
Desde que o homem começou a raciocinar – e ninguém tem a menor
noção de quando foi – inquire, imagina, especula e reflete sobre
as três questões essenciais a nosso propósito que ninguém
conseguiu, ainda, responder racional e indubitavelmente: o que sou?
De onde venho? Para onde vou?
Embora haja variações quase infinitas na forma de expressão das
tentativas de respostas, estas, invariavelmente, se repetem no
conteúdo, posto que por palavras e argumentos diversos. Querem
originalidade a esse propósito? Não a busquem em filósofos,
antropólogos, biólogos, romancistas, contistas e novelistas. Não a
busquem, pois não a encontrarão. Afinal, “só os poetas e os
loucos podem ser originais”.
Por mais que o instinto de sobrevivência induza, posto que em
intensidades variáveis, todas as pessoas a lutarem contra a
efemeridade humana, sua fragilidade física e, consequentemente, seu
aniquilamento, elas não se mostram eficazes, constantes e nem
originais nessas batalhas. Há, porém, duas exceções: os médicos
e os poetas. Todavia, faz-se necessário que o mesmo indivíduo
ostente essa dupla condição. Por que?
O jornalista David Nasser responde: “Médico e poeta – simboliza
nessa dupla condição, o inimigo jurado e ativo de qualquer
aniquilamento humano. O que não realiza a complexidade seca de um
diagnóstico, realiza-o muitas vezes a singeleza de um verso”.
Você, escritor amigo, anda à procura da originalidade? Busca algum
tema que ninguém, em tempo algum, jamais abordou? Acha que já
encontrou algum no “escaninho” da imaginação? Esqueça! Se
teimar certamente irá se frustrar.
A menos, é claro, que você seja poeta, ou, na pior das hipóteses,
louco Mas, neste último caso, não será, jamais, levado a sério.
“Só os poetas e os loucos conseguem ser originais”, acredite.
Não sou eu que digo, mas um dos mais reputados, respeitados e
originais (?) filósofos do século XX.
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