URV ainda é incógnita
Pedro J. Bondaczuk
O País, com a criação da
Unidade Real de Valor, acaba de embarcar numa nova experiência, cujo
resultado não se pode prever por enquanto, já que nada do gênero
havia sido tentado antes. Os trabalhadores de várias categorias
garantem que vão ter perdas, em decorrência da fórmula adotada
para a passagem de seus salários para a URV. Talvez.
O novo indexador, todavia, tem
o mérito de preservar a remuneração real, doravante, da voracidade
de uma inflação de 40% mensais. Nesse aspecto, não há dúvida,
tratou-se de um avanço.
O novo plano de estabilização
econômica vai dar certo? Trata-se de mais um estelionato eleitoral,
conforme acusações dos adversários do ministro da Fazenda,
Fernando Henrique Cardoso? Só o tempo poderá responder a essas
questões.
Nunca é demais reiterar que a
inflação nunca foi vencida por decreto. Caso a solução fosse tão
simples, muita gente já teria lançado mão dela, até para entrar
para a história.
Desta vez, pelo menos, não
houve confisco de poupança, nem congelamento (irreal) de preços, o
que seria impossível de fiscalizar num país de dimensões
continentais como o nosso, e nem qualquer quebra dos contratos
vigentes. Menos mau.
Para que o plano dê certo e a
inflação venha de fato a ser derrubada, é preciso que todos façam
a sua parte. Não se trata de aderir cegamente ao programa de
estabilização e certamente nem é isso o que Fernando Henrique
Cardoso pretende. Percebeu-se, nos últimos dias, que o ministro está
aberto a críticas, ao diálogo e até mesmo a correções de rumo
nas eventuais falhas que surgirem.
Também neste aspecto é
possível se vislumbrar mudança de mentalidade. Houve inegável
avanço. O Plano Cruzado naufragou exatamente porque seus condutores
não realizaram os ajustes que se faziam necessários, que eram
impopulares e poderiam fazer o PMDB perder as eleições de 1986. Por
não quererem ceder os anéis, na oportunidade, acabaram perdendo os
dedos.
Não compete, porém, apenas à
sociedade a tarefa de derrubar a inflação. Afinal, os empresários,
os banqueiros e os trabalhadores não emitem moeda. Apenas o governo
tem esse poder. Por tal razão, é preciso, e urgentemente, reduzir
as dimensões do Estado, para tornar a máquina estatal enxuta, ágil
e não tão perdulária quanto é atualmente.
É vital que o déficit
público seja de fato zerado. O processo de privatização, com as
devidas cautelas, para não se transformar em mera doação do
patrimônio público, tem que continuar e ser acelerado. O Congresso,
por seu turno, tem que ser corresponsabilizado.
Decisões demagógicas, como a
que os congressistas tentaram adotar, perdoando as dívidas dos
grandes latifundiários com o Banco do Brasil, não podem mais ser
toleradas.
Nunca é demais ressaltar que
a alta de preços não é a inflação, mas apenas seu reflexo. A
população está extremamente desinformada a esse respeito. O
processo inflacionário é sempre deflagrado pelo governo, que é o
único com o poder de emitir moeda.
Trata-se de emissão de meio
circulante, sem lastro na produção, feita, geralmente, para cobrir
despesas excessivas do Estado, muitas das quais (diríamos, a
maioria) supérfluas. No próximo mês, o quadro econômico, com a
introdução da URV, estará mais claro, possibilitando uma avaliação
mais criteriosa dos resultados. Por enquanto, só resta torcer para
que o plano dê certo.
(Artigo publicado na página
2, Opinião, da Folha do Taquaral, em 5 de março de 1994).
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