Esperança supera o medo
Pedro J. Bondaczuk
O presidente Luís Inácio
Lula da Silva, que assume o poder como o terceiro governante eleito
pelo voto direto desde o fim da ditadura militar, disse, tão logo
tomou conhecimento da sua consagradora vitória nas urnas, ainda na
noite de 27 de outubro do ano passado, em discurso que improvisou na
Avenida Paulista, em São Paulo –, onde os correligionários
festejavam a sua chegada à Presidência da República, após três
tentativas anteriores frustradas –, uma frase que caracterizou a
caráter não apenas o seu êxito eleitoral, mas todo o transcorrer
do surpreendente 2002: “A esperança venceu o medo”.
Claro que sua expressão tinha
endereço certo, político, voltado aos adversários, que na reta
final da campanha, buscaram atemorizar os eleitores, pintando
cenários assustadores, caso ele fosse o escolhido. O recado era
voltado, mais especificamente, à atriz Regina Duarte e ao candidato
que derrotou, José Serra, que lançou mão desse artifício em
desespero de causa, para tentar reverter um quadro que no final das
contas provou ser irreversível .
Dias antes, a famosa artista
do teatro e da televisão havia expressado (com todas as letras,
acentos e pontos), o seu temor diante da possibilidade do fundador do
PT, que àquela altura já era iminente, de vencer as eleições (se
sincero ou não é impossível de se avaliar, já que aquilo que ela
declarou entrava no nebuloso campo dos sentimentos e no das
presunções sobre sinceridade ou falta dela). Mas a resposta de Lula
valeu, não somente para os adversários, mas para toda a sociedade.
E, sobretudo, para caracterizar 2002.
Em todos os campos de
atividade, o ano começou entremeado pelo medo e pela esperança,
simultaneamente. Em alguns momentos prevalecia um, em outros, o
outro. Mas ambos estavam sempre presentes nos pensamentos e nos
corações. Por exemplo, a Seleção Brasileira de futebol, que se
classificou para a Copa do Mundo (que seria disputada, de forma
compartilhada, na Coréia e no Japão), em cima da hora, na chamada
“bacia das almas”, estava cercada de unânime descrédito
popular.
Era palpável o temor dos
torcedores por um àquela altura provável vexame dos nossos craques
(então desacreditados, execrados e até ridicularizados) nos campos
asiáticos. Mas havia, também, em cada brasileiro, uma tênue
“pontinha” de esperança, de que na hora “h”, iria prevalecer
a tradição do nosso futebol e ocorrer uma reversão de
expectativas, quando não um “milagre”.
E a esperança venceu o medo!
Os comandados de Felipão, mesmo jogando somente o trivial, o “feijão
com arroz”, superaram todo o descrédito que os acompanhava e
conquistaram o quinto título da história para a nossa Seleção.
Além disso, ninguém partiu para a Copa mais desacreditado do que
Ronaldinho, o “Fenômeno” (que mais do que nunca, justificou, ao
longo da competição, esse apelido).
Havia um clamor nacional pela
convocação de Romário em seu lugar, com interferência (sutil, é
verdade), até do então presidente Fernando Henrique Cardoso nesse
sentido. No entanto, o garoto humilde, oriundo do subúrbio de Bento
Ribeiro, no Rio, pivô da derrota, quatro anos antes, na França, com
o até hoje não explicado episódio das “convulsões”, não
somente ajudou a Seleção a ganhar o Mundial como, de quebra, foi o
artilheiro dele! Outra vitória, portanto, da esperança sobre o
medo.
Dezenas de outros episódios,
na política, na economia e na vida, opuseram esses dois sentimentos
–, que parecem antagônicos, mas que, no entanto, quase sempre se
manifestam de forma simultânea –, no correr de 2002, quer no plano
individual, quer coletivamente. Sua menção é até desnecessária.
Cada um dos leitores, se forçar um bocadinho só a memória,
certamente vai se lembrar de vários casos, pessoais ou coletivos,
desse confronto. É certo que a esperança não prevaleceu em todas
as circunstâncias. Em algumas, as pessoas deixaram de obter
marcantes conquistas, inibidas pelo “medo de tentar”.
A vitória de Lula despertou
na população um clima de inusitado otimismo, mesmo com a escalada
da inflação, com as incertezas no cenário internacional
(econômicas e também políticas, com os rumores sobre a iminência
de nova guerra no Golfo Pérsico) e, principalmente, com o alto
índice de desemprego no País. Não é por acaso que ele é o
presidente eleito com o maior índice de aceitação da História
brasileira: 74%, de acordo com o Ibope.
Nota-se um sentimento coletivo
diferente, de solidariedade, de abnegação e de consciência social,
não apenas por parte das pessoas, mas principalmente das empresas.
Inúmeras delas organizaram, no Natal passado, campanhas de coleta de
alimentos entre seus funcionários, fornecedores e clientes (e entre
estas, que me vêem de imediato à memória, poderia citar a
Volkswagen e a Eaton, de Vinhedo), para proporcionar um período de
festas sem o “fantasma” da fome” a algumas famílias carentes,
que foram beneficiadas.
Que bom seria se “todas”
as pessoas necessitadas, por este vasto Brasil, pudessem ser
atendidas! No entanto, a abnegada semente, lançada há algum tempo
pelo saudoso sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, parece, enfim,
ter caído em solo fértil! É, mais uma vez, a esperança vencendo o
medo.
Oxalá nos próximos 365 dias,
e mais do que isso, nos próximos 365 anos, seja este o resultado
desse perpétuo confronto de sentimentos tão díspares no coração
humano! Feliz governo, pois, para o operário, para o metalúrgico,
para o homem do povo Luiz Inácio Lula da Silva, cujo sucesso vai
significar, também, felicidade, progresso e tranqüilidade para
todos nós. Não é por acaso que se diz que a profissão por
excelência do brasileiro é a esperança. Que Deus o abençoe e
ilumine, caro presidente da República! E há de abençoar, estamos
certos disso.
(Artigo publicado no Jornal
Roteiro, em 27 de dezembro de 2002)
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