Tuesday, August 29, 2017

Estamos perdendo até a privacidade

Pedro J. Bondaczuk

As maravilhas tecnológicas do mundo contemporâneo, que facilitam nossa vida (e algumas determinam, até, seu prolongamento), se mal aplicadas, podem acabar se tornando em instrumentos de dominação nas mãos de pessoas inescrupulosas. Um dos aspectos em que esta era, de engenhocas eletrônicas, mais agride o cidadão, é o da privacidade. Quando o escritor britânico, de origem indiana, Eric Arthur Blair, escreveu seu livro “1984”, hoje verdadeiro clássico publicado sob o pseudônimo de George Orwell, o Estado policial que descreveu, onipresente, que tudo sabia e tudo controlava, foi encarado como algo sumamente fantasioso para ser levado a sério. Dizia-se que era uma exacerbada ficção. Hoje, entretanto, com os inúmeros recursos de espionagem (antes usados, apenas, contra homens que ocupavam altos cargos governamentais) sendo voltados contra as pessoas comuns, essa tormentosa situação não está muito distante de se concretizar.

Bancos de memória de computadores dispõem, na atualidade, de quase tudo que se precise saber sobre cada um de nós, sob os mais variados pretextos. Nossos tropeços comerciais (como se alguém estivesse a salvo de atrasar alguma conta ou deixá-la de pagar por absoluta falta de recursos) permanecem gravadas “ad aeternum” a nos fecharem as portas nas transações e a causarem embaraços onde quer que estejamos. Nosso telefone pode estar “grampeado”, para conferir alguma eventual mera suspeita acerca da nossa conduta. O princípio básico da justiça, der que todos são inocentes até que se prove o contrário, foi drasticamente subvertido. Hoje se diz que toda pessoa é suspeita até que comprove sua inocência.

As revelações feitas por duas revistas norte-americanas acerca da vigilância que vários órgãos do governo dos Estados Unidos exerceram sobre grandes escritores do país, nos últimos 50 anos, reforça a nossa impressão de que o temido estado onisciente de Orwell não está muito distante de existir. E justo lá!A salvaguarda do direito de privacidade (como de tantos outros) na terra de Tio Sam ainda é a sua modelar imprensa. E a sábia Constituição que os construtores de sua independência elaboraram e legaram à posteridade, garantindo o direito sagrado e absoluto de informação. É nisso que os EUA diferem do “urso” soviético. Na URSS os meios de comunicação estão atrelados a essa entidade fictícia , monstro imaginário de mil garras e mil olhos, chamado de Estado. Falta-lhe independência para lutar por qualquer tipo de garantia de privacidade. Se um dia conseguirem calar a imprensa dos Estados Unidos… Nem é bom pensar!

(Artigo publicado na editoria Internacional do Correio Popular, em 1 de outubro de 1984).



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