Como é difícil ser simples!
Pedro J. Bondaczuk
A maioria das pessoas acha que é fácil ser simples. Tenho ouvido
argumentos de toda a sorte a respeito e o principal é o de que
“basta querer” para sê-lo. Equivocam-se os que pensam assim. Até
porque, esses mesmos arautos da simplicidade são, via de regra,
complicadíssimos, quer na sua forma de comunicação, quer nos
relacionamentos conjugais, profissionais, sociais ou de amizade, quer
na maioria dos atos da vida.
Há, principalmente, os que confundem esse princípio (ou seria
condição?). Acham que ser simples é ser simplório o que, até por
definição, são coisas muito diferentes. No primeiro caso, a
palavra sugere praticidade, busca de soluções óbvias, visão de
profundidade nos relacionamentos e ações.
Já no segundo... O termo remete (conforme o Dicionário Michaellis)
à ingenuidade. A pessoa simplória é a muito crédula, ou seja, a
que acredita em qualquer bobagem que ouve ou que lê, mesmo que seja
óbvio que isso que ouviu ou leu não passou de irrestrita tolice ou
de completa mentira. É a que se deixa enganar ou ludibriar com
facilidade, de quem, aliás, os espertalhões se aproveitam quando e
como lhes apraz.
Muitas vezes, os comportamentos e opiniões alheios nos impedem de
ser simples. Não raro, atribuem-nos intenções que nunca tivemos,
quer em nossas palavras, quer, e principalmente, em nossos atos. Vou
citar um exemplo, correndo o risco de ser mal interpretado.
Como esteta, sou admirador contumaz e compulsivo da beleza feminina.
Nem sempre essa admiração é de cunho, digamos, sexual. O fato de
admirar uma bela mulher, e de olhá-la o quanto possa, não implica
em dizer que pretendo levá-la para a cama e fazer sexo com ela.
Calma, devo confessar que tenho instintos normais. Sinto, óbvio,
atração sexual pelo sexo oposto. Minha libido está em ordem. Faz
parte da minha natureza de macho. Mas isso ocorre em ocasiões e com
pessoas específicas.
Na maioria dos casos, quando fito, demoradamente, uma fêmea
atraente, limito-me a admirar sua beleza, como faço com belas
paisagens, com flores, com obras de arte bem elaboradas e assim por
diante. E, claro, a menos que eu fosse um tarado sexual incorrigível,
não quero manter relações sexuais com essas coisas que me encantam
e embevecem.
O mesmo vale em relação a determinadas mulheres, notadamente
meninas bonitas, no verdor dos anos. Não sou, evidentemente,
pedófilo. Jamais, em circunstância alguma, senti atração sexual
por alguma criança. Gerei três filhas e tenho respeito absoluto
pelo sexo feminino. A simples ideia de que há quem macule essa
inocência e beleza desperta-me horror, asco e profundíssima
revolta. É instintivo.
Quando olho, demoradamente, para uma garotinha de seis, nove ou doze
anos, portanto, não estou pensando em sexo. Não se trata de atração
sexual, mas sensorial, que é muito diferente. O que procuro nessas
ocasiões é alimentar meu espírito, que tem insaciável “fome
estética”, de beleza, na sua mais lídima expressão.
Se revelar isso para algum parente muito chegado, ou para o amigo
mais íntimo que tenha, contudo, com toda a candura do mundo e com
verdadeira simplicidade, será que serei compreendido? Não, não e
não! Serei encarado com horror, se não com asco, como se tivesse
tendências inatas à pedofilia (mesmo sem tê-las) e teria muita
sorte se não acabasse preso, embora sem dever nada à justiça, por
não violar sequer qualquer norma moral, quanto mais legal.
Vamos a um exemplo mais concreto. Falemos da elaboração de um
texto. Os redatores, em sua imensa maioria, quando conseguem escrever
algo direto, sem rodeios ou floreados, compreensível tanto a um
físico nuclear quanto a um gari, rasgam de imediato o que
escreveram, mesmo que seja inteligente e não contenha um único
erro, quer de grafia de palavras, quer gramatical. Procuram, em
contrapartida, burilar o que escrevem, recorrendo a uma vazia, posto
que bombástica, pirotecnia verbal, que nada acrescenta em termos de
conteúdo ao texto, achando que isto sim é de “qualidade”. E, na
verdade, não é.
O escritor irlandês George Bernard Shaw, ganhador de um Prêmio
Nobel de Literatura, e que nos legou uma infinidade de magníficos
livros, quando já nonagenário, certa feita, desabafou: “A
simplicidade é o que há de mais difícil no mundo: é o último
resultado da experiência, a derradeira força do gênio”.
Dá para entender por que a maioria dos problemas do mundo se vê
agravada, por falta de solução? Porque as pessoas acham, até
subconscientemente, que aquilo que é simples não pode ser
verdadeiro. Entendem que é fácil demais para ser a solução. E o
que fazem? Complicam tudo! Emaranham-se, mais e mais, em esquisitas
teorias, apostam no insólito e os problemas, que em princípio
sequer eram tão grandes, adquirem dimensões gigantescas,
inimagináveis. Cá entre nós, portanto, queridos leitores: como é
difícil ser simples!
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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