Há
algo de podre na nova era
Pedro
J. Bondaczuk
Os
escândalos na vida pública, principalmente os envolvendo corrupção,
são mais comuns do que a maioria das pessoas possa imaginar. Na
década de 70, por exemplo, estourou o célebre caso de suborno da
empresa de construção de aviões Lokheed, envolvendo diversas
personalidades públicas, entre as quais o ex-primeiro-ministro do
Japão, Kakuei Tanaka, que acabou preso, por sua ganância. Nessa
mesma época veio à tona o Watergate. Em 1987, o “Irã-contras”
permaneceu nas manchetes por muito tempo. Alemanha, França, União
Soviética, Estados Unidos… os casos de fraudes sucederam-se,
envolvendo pequenos e grandes países, ou seja, “peixinhos miúdos”
e gigantescos tubarões.
Todavia,
o escândalo do Banco de Crédito e Comércio Internacional, BCCI,
promete, pelo número de personalidades envolvidas, pela variedade
das irregularidades cometidas e pela quantidade de pessoas afetadas,
ser o maior de todos. O caso tem tamanhas proporções que chegou a
pegar de surpresa os meios de comunicação, que deram pouco espaço
para um noticiário tão picante e de tamanhas implicações. Lavagem
de dólares do narcotráfico, financiamento ilegal de guerrilhas,
suporte financeiro ao terrorismo e até mesmo custeio de programas
nucleares subterrâneos, destinados a dotar Argentina, Líbia e
Paquistão de bombas atômicas são algumas das sujeiras que o BCCI,
que tem filiais em 69 países, esteve por trás.
A
própria relação de seus clientes, que mantinham contas
rigorosamente secretas nessa instituição denominada de
“Supermercado do Crime” na revista Veja, em sua edição desta
semana, dá a exata dimensão da embrulhada em que muita gente
honesta se meteu, de boa fé, ao se tornar correntista da
organização. Pablo Escobar Gavíria, Ferdinand Marcos, Jean Claude
Duvalier, Manuel Antonio Noriega, Saddam Hussein, Abu Nidal, entre
outros, têm em comum, além do fato de serem odiados pelos seus
povos, o “prestígio” que deram ao banco. Quanto dinheiro sujo,
obtido às custas de seus respectivos povos , muitas vezes surrupiado
de cidadãos honestos jogados em alguma nauseabunda prisão, quando
não friamente assassinados, não circulou ali! E ninguém
percebeu?!!?
Teme-se
que, por enquanto, tenha surgido apenas a ponta do iceberg à tona.
Mesmo assim, conforme o promotor distrital de Nova York, Robert
Morgenthau, que na segunda-feira denunciou e indiciou dois dos
fundadores do BCCI, o paquistanês de 68 anos Agha Hasan Abedi e o
cidadão de Abu Dhabi, que integra os Emirados Árabes Unidos, xeque
Swaleh Naqvi, de 57 anos, a instituição – financeira ou
criminosa? - se envolveu em fraudes que ascendem a US$ 15 bilhões. O
banco esteve envolvido, de uma maneira ou outra, em tudo o que de
ruim aconteceu nos últimos tempos.
Embora
isso ainda não tenha sido demonstrado, suspeita-se que financiou boa
parte dos armamentos que Saddam Hussein utilizou para mover duas
guerras. “O BCCI operou vomo uma organização criminosa corrupta
ao longo de todos os seus 19 anos de história. Falsificou
sistematicamente seus registros, sabidamente se permitiu a lavagem de
rendas ilegais de traficantes de drogas e outros criminosos e pagou
subornos e favorecimentos a autoridades públicas”, denunciou
Morgenthau. Enquanto existirem pessoas e organizações desse tipo,
operando impunemente por quase duas décadas para subornar, corromper
e promover o vício e a violência, sinceramente, não se pode falar
em nova era sob o risco de provocar risos e cair no mais absoluto
ridículo.
(Artigo
publicado na editoria Internacional do Correio Popular, em 1º de
agosto de 1991).
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