Monday, August 07, 2017

Há algo de podre na nova era


Pedro J. Bondaczuk


Os escândalos na vida pública, principalmente os envolvendo corrupção, são mais comuns do que a maioria das pessoas possa imaginar. Na década de 70, por exemplo, estourou o célebre caso de suborno da empresa de construção de aviões Lokheed, envolvendo diversas personalidades públicas, entre as quais o ex-primeiro-ministro do Japão, Kakuei Tanaka, que acabou preso, por sua ganância. Nessa mesma época veio à tona o Watergate. Em 1987, o “Irã-contras” permaneceu nas manchetes por muito tempo. Alemanha, França, União Soviética, Estados Unidos… os casos de fraudes sucederam-se, envolvendo pequenos e grandes países, ou seja, “peixinhos miúdos” e gigantescos tubarões.

Todavia, o escândalo do Banco de Crédito e Comércio Internacional, BCCI, promete, pelo número de personalidades envolvidas, pela variedade das irregularidades cometidas e pela quantidade de pessoas afetadas, ser o maior de todos. O caso tem tamanhas proporções que chegou a pegar de surpresa os meios de comunicação, que deram pouco espaço para um noticiário tão picante e de tamanhas implicações. Lavagem de dólares do narcotráfico, financiamento ilegal de guerrilhas, suporte financeiro ao terrorismo e até mesmo custeio de programas nucleares subterrâneos, destinados a dotar Argentina, Líbia e Paquistão de bombas atômicas são algumas das sujeiras que o BCCI, que tem filiais em 69 países, esteve por trás.

A própria relação de seus clientes, que mantinham contas rigorosamente secretas nessa instituição denominada de “Supermercado do Crime” na revista Veja, em sua edição desta semana, dá a exata dimensão da embrulhada em que muita gente honesta se meteu, de boa fé, ao se tornar correntista da organização. Pablo Escobar Gavíria, Ferdinand Marcos, Jean Claude Duvalier, Manuel Antonio Noriega, Saddam Hussein, Abu Nidal, entre outros, têm em comum, além do fato de serem odiados pelos seus povos, o “prestígio” que deram ao banco. Quanto dinheiro sujo, obtido às custas de seus respectivos povos , muitas vezes surrupiado de cidadãos honestos jogados em alguma nauseabunda prisão, quando não friamente assassinados, não circulou ali! E ninguém percebeu?!!?

Teme-se que, por enquanto, tenha surgido apenas a ponta do iceberg à tona. Mesmo assim, conforme o promotor distrital de Nova York, Robert Morgenthau, que na segunda-feira denunciou e indiciou dois dos fundadores do BCCI, o paquistanês de 68 anos Agha Hasan Abedi e o cidadão de Abu Dhabi, que integra os Emirados Árabes Unidos, xeque Swaleh Naqvi, de 57 anos, a instituição – financeira ou criminosa? - se envolveu em fraudes que ascendem a US$ 15 bilhões. O banco esteve envolvido, de uma maneira ou outra, em tudo o que de ruim aconteceu nos últimos tempos.

Embora isso ainda não tenha sido demonstrado, suspeita-se que financiou boa parte dos armamentos que Saddam Hussein utilizou para mover duas guerras. “O BCCI operou vomo uma organização criminosa corrupta ao longo de todos os seus 19 anos de história. Falsificou sistematicamente seus registros, sabidamente se permitiu a lavagem de rendas ilegais de traficantes de drogas e outros criminosos e pagou subornos e favorecimentos a autoridades públicas”, denunciou Morgenthau. Enquanto existirem pessoas e organizações desse tipo, operando impunemente por quase duas décadas para subornar, corromper e promover o vício e a violência, sinceramente, não se pode falar em nova era sob o risco de provocar risos e cair no mais absoluto ridículo.

(Artigo publicado na editoria Internacional do Correio Popular, em 1º de agosto de 1991).



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