Franceses
estão curados da febre cor de rosa
Pedro
J. Bondaczuk
O
presidente francês, François Mitterrand, estará jogando uma
cartada decisiva em sua carreira, envolvendo o futuro político do
Partido Socialista, nas eleições de amanhã, na França. Se vencer,
terá todas as condições de concluir um governo que até aqui
parece ter frustrado as expectativas da população. Se perder,
talvez se veja forçado a abrir mão dos dois anos que ainda faltam
para a conclusão do seu mandato, por ficar, literalmente,
impossibilitado de por em execução seus projetos. Desde que o atual
sistema, conhecido como a Quinta República, passou a vigorar na
França, no tempo do general Charles de Gaulle, nenhum presidente
teve3 contra si um Parlamento totalmente hostil. Segundo todas as
pesquisas de opinião, Mitterrand está caminhando para ser o
primeiro a ter que enfrentar essa situação.
É
verdade que as prévias eleitorais andam um tanto desmoralizadas
depois daquilo que aconteceu na Espanha nesta quarta-feira. Todas
elas apontavam que no plebiscito espanhol o eleitorado espanhol iria
rejeitar a permanência do país na Organização do Tratado do
Atlântico Norte. O que se viu foi exatamente o inverso. É verdade
que o número de votos favoráveis à tese defendida pelo governo do
primeiro-ministro Felipe Gonzalez foi menor que a quantidade dos que
sequer compareceram para votar. Ainda assim, as pesquisas não
deixaram de errar. Afinal, não conseguiram detectar a intenção
abstencionista do eleitorado.
Embora
pareça impossível, o mesmo fenômeno pode se repetir na eleição
de amanhã, para a renovação da Assembleia Nacional francesa.
Eleições não se ganham e nem se perdem na véspera. Se fosse
assim, não haveria, sequer, a necessidade das pessoas votarem.
Bastaria que algum instituto que mede a opinião pública fizesse um
levantamento por amostragem e que o preferido na pesquisa fosse
apontado, antecipadamente, como vencedor. É esse caráter de
imprevisibilidade que torna cada pleito eleitoral emocionante.
Entretanto,
tudo leva a crer que o presidente francês não conseguirá reverter
a situação que não lhe é favorável. E é nessa altura que o seu
rompimento com os comunistas, verificado em 19 de julho de 1984, pode
lhe ser fatal. O partido comandado por George Marchais, embora não
esteja vivendo dos seus momentos mais brilhantes, tem plenas
condições de pelo menos manter as 44 cadeiras de que dispõe. Ou,
na pior das hipóteses, no caso de um desastre eleitoral completo,
pode perder qualquer coisa como sete ou dez vagas. Ainda assim, se
não houvesse ocorrido o mencionado desacordo, uma composição das
forças da esquerda poderia garantir maioria, posto que frágil, aos
socialistas, em um governo de coalizão.
Se
as pesquisas de opinião forem confirmadas nas urnas, o melhor que
Mitterrand terá a fazer será antecipar em dois anos as eleições
presidenciais. Pelo sistema de governo francês, o parlamentarismo
misto, embora o presidente prepondere sobre o primeiro-ministro, é
este último que comanda a política interna. Ele que é o elo entre
a presidência e o Parlamento. A coligação centrista, favorita,
indicaria o novo premier e todo o gabinete. Em, logicamente, buscaria
impor o seu programa. Acontece que a sua plataforma é , em pelo
menos três ou quatro temas essenciais, diametralmente oposta à dos
socialistas em especial no que se refere à estatização de
empresas. Alguém teria que ceder para que não se instalasse o caos
e esse seria, forçosamente, quem dispusesse de menor respaldo
popular, no0 caso o presidente. A menos, portanto, que se esteja
desenhando uma nova “zebra”, furando todos os prognósticos dos
especialistas, tudo indica que o governo de François Mitterrand
esteja chegando ao fim. É um panorama bem diferente daquele
registrado em 1981, quando os franceses viveram a “febre cor de
rosa”, da qual parece terem se curado depressa demais.
(Artigo
publicado na editoria Internacional do Correio Popular, em 15 de
março de 1986).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment