A natural inconstância
Pedro J. Bondaczuk
As
palavras soem ser sumamente ambíguas e dificilmente podemos tomá-las
rigorosamente ao pé da letra para expressar o que quer que seja. Se
você quiser ser bem entendido, sem que restem dubiedades e nem “n”
interpretações ao que declara, explique tudo muito bem. Se for por
escrito, não se preocupe com a extensão do seu texto, desde que
seja objetivo e não fique pulando de um assunto para outro.
A
escrita sintética pode servir a caráter ao editor (embora nem
sempre), que tem que preencher espaços determinados de páginas de
jornais e revistas, sem que haja letras a mais e nem a menos. Mas
para o melhor entendimento do que se quer abordar, é a pior das
medidas.
Tomemos
como exemplo a palavra “constância”. Em primeiro lugar, os
dicionários lhe emprestam vários significados, e não um único, o
que a torna, liminarmente, “inconstante”. Isso, de cara, leva-o,
ao abordar essa atitude, a se explicar bem, para deixar claro o que
exatamente pretende dizer. Além dos significados que o termo de fato
tem, há outros tantos que não tem, mas que sugere ter. Por exemplo,
o constante nos remete ao que é “imutável”, ou seja, o que
sempre ocorre de um mesmo jeito.
Nada,
mas nada mesmo, todavia, tem essa imutabilidade. Pode haver algo que
demore a mudar, mas que um dia muda, disso não tenham dúvidas. Nós
mudamos, mesmo que não nos apercebamos disso, e não de um dia para
outro, mas de um minuto (ou menos) para outro. Desconhecemos o que se
passa no interior do nosso organismo e, notadamente, das nossas
células, que estão sempre se alterando: nascendo, crescendo, se
reproduzindo e morrendo.
Os
dicionários (com ligeiras variações de um para outro), definem
assim a palavra “constância”: “qualidade do constante, firmeza
de ânimo, perseverança, coragem, duração, persistência,
paciência”. Notaram quanta ambigüidade? Como falar, pois, sobre
esse conceito, sem deixar as coisas muito bem explicadinhas?
Como
ser constante, no que quer que seja, se as circunstâncias estão
sempre mudando? Como deixar de acompanhar a volubilidade da natureza
e da própria vida? Impossível. Podemos, sim, agir com constância,
mas a relativa. A absoluta, posso dizer, sem nenhum receio de
incorrer em exagero, simplesmente não existe.
A
natureza é constante? De forma alguma. Não há dois seres vivos (e
não me refiro somente a humanos ou a animais) rigorosamente iguais,
nos mínimos detalhes. Tome uma espécie de árvore qualquer. As
variações de espécimes serão infinitas. Escolha uma,
aleatoriamente. Você não encontrará nela duas folhas que sequer se
pareçam idênticas, quanto mais iguais. A natureza, pois, é
inconstante. Absoluta e rigorosamente inconstante.
Reitero
que me refiro, aqui, exclusivamente, à acepção de imutabilidade.
Os educadores recomendam, por exemplo, que sejamos constantes em
nosso processo de aprendizado. Embora não expliquem, claro que só
podem estar se referindo à constância relativa, ou seja, à
perseverança, à persistência de ação, à paciência.
Você
jamais poderá, em todos os dias da sua vida, aprender de forma
igual, pois você será diferente. O ambiente ao seu redor, embora
lhe pareça o mesmo, estará modificado. As circunstâncias estarão.
O tempo estará. A vida estará. Tudo, absolutamente tudo, estará.
Foi
nesse sentido que Aldous Huxley afirmou, no ensaio “Sobre a
democracia e outros estudos”: “A constância é contrária à
natureza, contrária à vida. As únicas pessoas completamente
constantes são os mortos”.
Porém,
como as palavras são ambíguas, esta declaração requer,
igualmente, explicações, para não gerar dubiedades e múltiplas
interpretações. O autor de “Admirável mundo novo” não se
referiu, aqui, à constância relativa, mas à absoluta, ou seja, à
imutabilidade (daí eu ter recorrido a ele para ilustrar estas
considerações).
Se
quisermos evoluir, quer mental, quer moral, espiritual e até
materialmente, devemos ser constantes, sim. E muito. Mas no sentido
da perseverança (quando o que estivermos fazendo for positivo e,
sobretudo, construtivo), persistentes (se possível às raias da
teimosia) e pacientes. Como se vê... tudo é relativo.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment