Torre
de marfim
Pedro J. Bondaczuk
Uma discussão interminável, que
já atinge algumas gerações e passa de um século, notadamente nos círculos
acadêmicos, é a que se refere ao papel do escritor na sociedade e, mais
especificamente, se ele deve, ou não, aderir a causas políticas ou defender
determinada ideologia.
Muitos entendem que não lhe cabe
transformar sua produção literária em mero material de propaganda. Não lhe cabe
mesmo. Mas nem por isso lhe deve ser vedada a livre participação política. Os
que integram esta corrente defendem que o escritor se encerre em uma “torre de
marfim” e somente traga à baila temas eternos e transcendentais. Que aborde os
problemas de relacionamento, os conflitos emocionais e os dramas psicológicos.
Mas que não se meta em assuntos que não sejam da sua seara.
Outros tantos, contudo, afirmam
que, antes de tudo, o escritor é um cidadão e que, portanto, tem não somente o
direito, mas o dever de participar da vida política do seu país e, por
extensão, do mundo.
Os dois lados, porém, erram, ao
quererem impor ao literato determinada conduta. A escolha do caminho a seguir
cabe-lhe com exclusividade, e somente a ele e a mais ninguém. Ou seja, a mesma
liberdade que ele defende para os outros, deve lhe ser concedida, para escolher o procedimento que melhor lhe
convier.
Escritores notáveis de todos os
tempos abraçaram grandes causas e nem por isso fizeram má literatura. Pelo
contrário. Entre estes, pode ser citado, por exemplo, Emile Zola, com seu
corajoso libelo acusatório intitulado “J’accuse”, publicado no jornal Aurore,
em defesa do Capitão Alfred Dreyfus, vítima de uma armação racista (era de
origem judia) que redundou em sua expulsão do exército francês e na sua prisão
na temível Ilha do Diabo, na Guiana Francesa.
Outro defensor de causa política
foi Victor Hugo, que acabou eleito senador na França e se destacou na vida
pública por sua probidade e clarividência. Não se pode esquecer de Máximo Gorky
e Vladimir Maiakowski, na ex-União Soviética. Ou, mais recentemente, nos Estados
Unidos, de Gore Vidal, corajoso e ousado em suas denúncias ao governo de George
W. Bush e suas mazelas, tendo em vista a redução de liberdades civis, em plena
pátria da liberdade. Nenhum desses escritores, porém, teve seu talento
contestado ou desmentido por causa disso.
Quanto aos que se encerraram em
“torres de marfim”, poderíamos citar mais de um milhar, que com sua
magistralidade e competência nos desvendaram mundos ideais e trouxeram à tona
mistérios e segredos da alma. Ambas as correntes, portanto, são válidas e
úteis. Ademais, o julgamento cabe (e sempre deve caber) ao árbitro supremo que
de fato importa ao escritor: o leitor.
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