País do desperdício
Pedro J. Bondaczuk
O
Brasil é o país do desperdício. E não somente de escassos recursos e de bens
materiais, mas sobretudo de talentos, de vidas e de oportunidades. Esses
fatores, somados a uma das mais perversas e injustas distribuições de renda do
mundo, estão na raiz de mais esta crise --- das tantas que os brasileiros já
tiveram que suportar ao longo da nossa acidentada trajetória histórica ---
caracterizada, sobretudo, por uma falência ética, pela ausência de liderança e
por um oportunismo estúpido e criminoso.
A
atual geração vai passar para a história (salvo exceções, naturalmente, já que
as generalizações são sempre inconvenientes) como uma das piores de todos os
tempos. Especialmente no que diz respeito aos homens públicos, aos políticos.
Sobre
os desperdícios materiais que ocorrem num país com 34,6 milhões de indigentes,
nos últimos dias a imprensa revelou fatos estarrecedores. Alimentos, materiais
de construção, energia elétrica, água tratada e tantas outras coisas essenciais
à vida moderna são jogados fora, inadvertidamente, por um povo que nunca
desenvolveu, ou se habituou, à autodisciplina.
Essas
perdas, conforme estimativas levantadas na semana passada, num simpósio
realizado em Brasília para analisar o problema, ultrapassam os US$ 50 bilhões
anuais. Apenas este dado deveria ser suficiente para que a população realizasse
uma "cruzada santa" pela economia de recursos, de esforços e de
capitais.
Mas
a irresponsabilidade vai mais longe. O País desperdiça, por exemplo, sua
juventude, largada nas ruas, à mercê de todos os vícios, corrupções e
explorações possíveis, numa fábrica imensa e surrealista de marginais. Atira à
lata de lixo a experiência de milhares de profissionais que, ao atingirem a
fase mais criativa, a faixa dos 40 anos, são considerados
"ultrapassados" pelo mercado de trabalho e não conseguem mais
colocação. Ou seja, o "fruto" é descartado quando fica maduro, quando
a mínima das lógicas diz que seria o ponto ideal para o consumo.
Desse
rosário de desperdícios, todavia, o pior deles é o das oportunidades. O Brasil
teve chances --- ufanismos à parte --- de chegar a ser, inclusive, uma potência
mundial, caso promovesse indispensáveis ajustes econômicos, sociais e sobretudo
comportamentais na fase que ficou conhecida como "milagre econômico".
Não
fez, obviamente, nada disso. Investiu mal o dinheiro alheio, emprestado em
péssimas condições de resgate, e hoje paga um preço alto demais por essa
insensatez. Perdeu a oportunidade de fazer mudanças positivas quando da
redemocratização.
O
populismo exacerbado das lideranças políticas deixou escapar chances preciosas
de reformas quando, durante o Plano Cruzado, o governo de José Sarney recebeu o
apoio que até então nenhum outro presidente havia logrado obter e provavelmente
ninguém voltará a conseguir.
Outra
chance jogada fora foi com a eleição de Collor, um imenso estelionato
eleitoral. A propalada tentativa de matar o "tigre da inflação" com
um único tiro deu no que deu: taxa inflacionária acumulada, de março de 1990 a
maio de 1993 de 133.295,46% (conforme dados da Fundação do Instituto de
Pesquisas Econômicas da USP).
Finalmente,
Itamar Franco está jogando fora nova oportunidade para que o País (que tem
recursos naturais, território, solo, clima e povo favoráveis) retome a trilha
do desenvolvimento auto-sustentável com justiça social. Este é, ou não,
portanto, o paraíso do desperdício?!
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 8 de junho de 1993).
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