Tuesday, August 23, 2016

Lucro fica com mercadores de armas


Pedro J. Bondaczuk


O pior conflito regional registrado desde o fim da Segunda Guerra Mundial está chegando ao fim, com o anúncio, feito ontem, em Nova York, de que o cessar-fogo no Golfo Pérsico vai  entrar em vigor no dia 20 próximo. Agora é hora dos dois beligerantes fazerem as suas contas e contabilizarem os imensos prejuízos que tiveram num confronto que, mesmo tendo menor duração, causou um número de vítimas bem superior do que o do Vietnã.

E no Sudeste asiático havia uma superpotência envolvida, os Estados Unidos, contando com armas sofisticadas e realizando bombardeios de saturação contra o território norte-vietnamita como poucas vezes se viu na história.

Ainda assim, essa guerra fez menos vítimas do que a do Golfo. Os dois países somente conseguiram, com a sua intransigência e teimosia (e com a complacência de praticamente toda a comunidade internacional) um saldo raramente visto antes de dor, miséria e devastação.

Essa conflagração foi particularmente perversa por envolver táticas de praticamente todos os conflitos deste século. Por exemplo, o uso de armas químicas, pelos dois lados, que estão proibidas desde a Convenção de Genebra de 1925. A utilização mútua de mísseis, para alvejar populações civis. O intenso ataque das partes às frotas mercantes de países que nada tinham a ver com as hostilidades de iranianos e iraquianos. Os maus-tratos a prisioneiros de guerra, por parte de ambos os lados. E até a utilização de guerrilhas, com os persas explorando a animosidade dos curdos contra o Iraque e este se valendo dos guerrilheiros do Mujaheddin Khalk para atacar a República Islâmica.

Foi apenas por um milagre que outros países, do Golfo ou de fora dele, não entraram na conflagração, principalmente as superpotências. A sorte foi que na fase mais agitada das hostilidades, a União Soviética já estava passando por um processo agudo de transformação, que vem se refletindo, positivamente, por toda a parte, com o término das mais complicadas questões do nosso tempo (como Angola, Camboja e Afeganistão) ou, pelo menos, com um encaminhamento para isso.

Estivesse um Leonid Brezhnev à frente do Cremlin, quando o “USS Stark” foi atacado por mísseis iraquianos, ou quando o Airbus A-300 iraniano foi abatido pelo cruzador “USS Vincennes”, e provavelmente o mundo todo estaria metido num magnífico imbróglio.

O saldo final do conflito revela que ambos os beligerantes, a despeito de saírem com honra da peleja, foram derrotados. Somente os grandes comerciantes internacionais de armas (essas aves de rapina que farejam a morte para se alimentar de dólares) é que saíram ganhando. E muito dinheiro!

Para eles, pouco importam as viúvas, os órfãos e os mutilados iranianos e iraquianos, que cessados os clamores de guerra, esquecidas a propaganda militar e as marchas marciais, vão, certamente, perambular pelas ruas de Teerã e de Bagdá mendigando o seu sustento. Não é isso o que sempre acontece com os combatentes de todos os conflitos?


(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 9 de agosto de 1988).

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