Tuesday, August 30, 2016

O pouco lembrado pai do Verismo


Pedro J. Bondaczuk

O leitor já leu algum livro, ou pelo menos ouviu falar, do escritor italiano Giovanni Verga? Caso a resposta seja negativa (o que, sem duvidar de sua cultura literária, não me causa nenhuma surpresa) não se sinta diminuído. Pouquíssimas pessoas aqui no Brasil conhecem esse autor. Procurei, por exemplo, em livrarias, em sebos, em bibliotecas e até nas internet qualquer livro dele, em vão. E olhem que escreveu dezenas deles, Desconfio que nada, da sua imensa (e excelente) obra tenha sido traduzido para o português e lançado por aqui por alguma das nossas centenas de editoras. Uma pena e uma injustiça. O sujeito é muito bom. Posso estar enganado, mas não creio. Por pura teimosia, encontrei alguns livros de Giovanni Verga, mas em italiano e em espanhol. Adquiri-os e deliciei-me com sua leitura, super surpreso por ninguém se propor a divulgá-lo no Brasil.

O volume que ensejou minha “descoberta” desse escritor italiano (notadamente siciliano, ilha em que nasceu e onde morreu, depois de perambular por Florença e por Milão), é “A vida nos campos”, publicado na Itália em 1880, reunindo uma coletânea de histórias curtas tratando de pessoas e coisas de sua Sicília natal. Cheguei a esse nome meio que por acaso, mais especificamente, por sugestão de um leitor, o que já se tornou rotina. Aprendo muito com vocês, embora minha proposta, um tanto atrevida, seja a de ensinar-lhes alguma coisa. Não sei se estou conseguindo. Espero que sim.

O leitor Giuseppe Martoni, que afirmou estar acompanhando minha série de comentários versando sobre como o tema “epidemias” foi tratado na Literatura através do tempo, sugeriu-me o livro em questão. Procurei-o, reitero, por todas as partes, em vão. Comuniquei-lhe que não achei essa obra, ao que ele me sugeriu que tentasse adquirir uma edição já antiga, em espanhol. E... bingo! Consegui encontrar e  comprar “A vida nos campos”. Interrompi, temporariamente, a série que vinha escrevendo, para descobrir onde e como Giovanni Verga tratou do tema “epidemia”. Encontrei o que procurava em uma das oito histórias do livro, intitulada “Guerra dos santos”, que li, reli, fiz anotações e meditei muito a respeito. É dela, pois, que me proponho a tratar. Mas não hoje. Antes, impõem-se alguns comentários sobre esse escritor e explicações sobre por que ele é tão importante.  

Giovanni Carmelo Verga nasceu, em 2 de setembro de 1840, na cidadezinha siciliana de Vizzini, província de Catania, no seio de uma próspera família de proprietários rurais. Produziu seus primeiros textos literários quando tinha, apenas, dezesseis anos de idade. Mas seu talento aflorou quando estudava Direito na universidade da cidade em que nasceu. Publicou, inicialmente, vários romances históricos. Sua importância maior, no entanto, não se deve a esses primeiros livros, embora muito bons. Depois de uma passagem de três anos por Florença, aos 29 anos de idade, ele mudou-se, de “mala e cuia”, para Milão, onde viveu por vinte e um anos e onde consolidou sua vitoriosa carreira.  Nessa importante cidade da Lombardia, Verga não tardou a fazer amizade com um ilustre conterrâneo, o romancista Luigi Capuana. Este fato viria a mudar sua forma de entender e de fazer literatura.

Por influência direta do novo amigo, Giovanni escreveu suas obras mais notáveis e bem sucedidas. E mais, junto com o amigo, fundou uma nova escola literária, tipicamente italiana, posto que inspirada no realismo francês de Balzac e de Zola: o Verismo. As principais características dessa nova corrente literária incorporavam vários postulados do positivismo. Entre estes, podemos destacar: absoluta fé na razão e na ciência, adoção do método experimental na produção dos textos e irrestrita confiança na infalibilidade dos instrumentos de pesquisa. O Verismo é marcado pelo realismo – por vezes sórdido ou violento – das descrições da vida quotidiana, especialmente das classes sociais mais baixas, rejeitando os temas históricos, míticos e grandiosos do Romantismo.

A corrente, da qual Verga foi co-fundador – assinou o manifesto de criação junto com Luigi Capuana -  não se restringiu, apenas, à Literatura. Também se manifestou na ópera italiana, a partir de 1890, com a Cavalleria Rusticana – aliás baseada num conto do mesmo nome do escritor siciliano – de Pietro Mascagni. Suas obras foram levadas, ainda, ao teatro e ao cinema (como o filme “A terra treme”, dirigido por Luchino Visconti), daí ser estranho o fato dele ser tão pouco conhecido, ou virtualmente desconhecido no Brasil.  Giovanni Verga, que também se destacou no jornalismo, sendo fundador de alguns jornais, voltou a morar em sua cidade natal em 1893, onde viveu por mais quase três décadas, na mesma casa onde nasceu, e morreu de uma trombose cerebral, em 27 de janeiro de 1922, aos 81 anos de idade. “A vida nos campos” pode nem ser sua obra-prima, mas que é um livro instigante disso o leitor pode ter certeza.


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