Thursday, August 18, 2016

Tarefa facilitada

Pedro J. Bondaczuk


Ser escritor, hoje em dia, é muitíssimo mais fácil do que, digamos, há apenas trinta anos. Se recuarmos mais ainda no tempo, teremos que valorizar ainda mais quem se dedicava, então, a esta fascinante atividade de produzir livros. O advento do computador pessoal trouxe facilidades a quem vive de escrever que Honoré de Balzac, ou Leon Tolstoi, ou Victor Hugo não acreditariam que se tornassem possíveis, se algum “profeta” de sua época lhes dissesse que um dia estariam ao dispor dos seus sucessores.

Até praticamente fins do século XIX, por exemplo, não havia, ainda, sequer, máquina de escrever. Não tinha sido inventada. Os textos eram redigidos de forma manuscrita, arrancados na unha. Os redatores, não raro, até, tinham, por canetas, meras penas de aves (a preferida, parece, era a de ganso).

Para que a tinta não borrasse o papel, e não comprometesse o trabalho às vezes de um dia todo, os esforçados escritores de então recorriam a um pó secador especial. Isso, quem conhecesse o produto e pudesse comprá-lo. O advento da caneta-tinteiro foi considerado um avanço espetacular, quase que um “milagre”. Esferográfica? Nem pensar! Não havia, igualmente, sido inventada ainda.

As revisões dos textos, produzidos de forma tão rústica e artesanal, eram uma loucura! O redator rasurava todo o papel e, após cada correção, acréscimo e/ou supressão que fazia, tinha que copiar tudo de novo, agora com as devidas retificações. E fazia isso duas, três, cinco, dez vezes ou mais. Haja paciência! Os grandes clássicos da literatura mundial nasceram dessa forma. Qual o escritor da atualidade teria tanta paciência, e produziria obras tão marcantes, com as condições do seu colega do passado? Será que haveria algum capaz disso? Duvido!

E não era só a produção de textos que se tornava façanha digna dos “doze trabalhos de Hércules”. O escritor de antigamente não tinha (óbvio) a internet para divulgar o que havia escrito. Não contava, portanto, com o recurso do e-mail, por exemplo. Hoje, se eu quiser a opinião de alguém, sobre o que acabei de escrever, antes de sequer pensar em publicar em qualquer veículo ao meu dispor, é fácil e rápido. Basta encaminhar, pelo correio eletrônico, o texto a algum amigo (que entenda do riscado, claro) e rapidamente obterei a resposta. Os escritores de antigamente não tinham essa moleza (e nenhuma outra).

Ademais, tenho condições de divulgar fartamente o que escrevo, antes mesmo de ao menos cogitar e reunir tudo em livro. Conto com milhões de sites e blogs da internet (meu próprio ou dos outros) ao meu dispor. Só nesse aspecto, já levo uma vantagem monumental sobre os meus colegas de profissão do passado.

Quando a máquina de escrever foi inventada, e começou a se popularizar, foi comemorada como imenso “feito da tecnologia”. Os escritores celebraram o ingresso, finalmente, no que entendiam ser então a “modernidade”. Hoje... Convenhamos, esse instrumento, que nos foi tão útil há apenas duas décadas ou menos (alguns, que resistem à informática, ainda o utilizam) não passa, a rigor, de peça de museu. Torna-se a cada dia mais raro e logo, logo tende a desaparecer de vez.

Claro que, tanto em passado remoto, quanto na atualidade, o escritor, para se dar bem e obter razoável sucesso, devia e deve contar com um fator fundamental: o talento. Se não tiver... Melhor que procure outra atividade, para não ter que conviver com um rosário de fracassos e frustrações. Só que hoje, a informática liberou-o de uma infinidade de tarefas enfadonhas e rotineiras, proporcionando-lhe tempo e condições para se concentrar quase que exclusivamente no conteúdo do que vai escrever.

Por tudo isso, não são exageradas as reverências que prestamos a um Balzac, a um Zola, a um Hugo, a um Dostoievski e a tantos e tantos e tantos mestres da literatura mundial. Pelo contrário, eles mereceriam mais, muito mais do que isso. Além de criativos (diria, geniais), foram, sobretudo, pacientes. Suas obras, que hoje nos ilustram e servem de referenciais para tudo o que escrevemos, foram, literalmente, arrancadas a muque dos seus privilegiados cérebros.  


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