Preservação da memória
Pedro
J. Bondaczuk
Poucas pessoas se
preocupam, de fato – mediante ações efetivas – com a preservação da memória.
Acontecimentos marcantes das famílias, por exemplo, são logo esquecidos e as
gerações seguintes, seus descendentes, pouco ou nada ficam conhecendo dos
feitos, sucessos e fracassos (estes também devem ser lembrados e com atenção
redobrada) dos que lhes deram carinho, afeto, educação e, sobretudo, a vida.
Como se vê, sequer
refiro-me, aqui, à memória nacional, a dos grandes vultos, dos líderes, dos
intelectuais, dos pesquisadores, dos construtores de cidades, tumbas e
monumentos etc., dos que contribuíram, com suas ações, para a grandeza e o
progresso do seu país. Destes, poucos são lembrados e reverenciados, como mereceriam,
meros meses (ou menos) após morrerem.
Nem mesmo lembranças
familiares são preservadas (salvo raríssimas exceções). É fato que a maioria
das famílias conta com álbuns de fotografias que registram momentos especiais
de suas vidas. Mas são imagens frias, sem referências, sem indicações de datas,
locais e circunstâncias em que foram tiradas e, com o passar dos anos, são
inúteis para de sequer sugerirem informações a respeito..
O que você conhece (a
fundo) sobre o seu avô, caríssimo leitor? Ou acerca de seu bisavô? Ou mesmo do
seu pai? Pouco, muito pouco, não é verdade? Raramente nos preocupamos em
preservar para a posteridade documentos e anotações sobre nossa família.
Achamos que é algo que importe apenas a nós. Nem sempre.
Explico por que. Tenho
a “mania” de pesquisar a vida e a obra de escritores pouco conhecidos, mas cuja
literatura seja de inegável valor estético. Ou seja, que tenha não apenas
forma, mas, principalmente, conteúdo. Para tanto, busco informações onde a
lógica sugere haver maior probabilidade de encontrá-las: as famílias dos
personagens de minhas pesquisas. Para minha surpresa, todavia, a imensa maioria
delas me fornece escassíssimas indicações a esse propósito. E não se trata de
má-vontade. Trata-se de ausência de documentação (e de memória).
O mais comum é que me
franqueiem toneladas de papéis mofados, amarelecidos pelo tempo e empoeirados
(uma tortura para os alérgicos), que as famílias desses escritores entendem que
sejam “documentos”. A maioria consiste, apenas, de recibos de aluguel, de notas
fiscais de aquisição de eletrodomésticos de todos os tipos, de canhotos de
passagens de avião ou de ônibus e assim por diante. Ou seja, nada,
absolutamente nada que seja aproveitável para o resgate da memória de um
literato.
Ainda se houvesse anotações
pessoais, rascunhos de textos literários, cartas, diários ou coisa que o valha,
haveria algum proveito nessa papelama. Como resgatar a memória de alguém,
todavia, apenas com essa papelada anônima, neutra, genérica e, portanto, sem
utilidade prática? Entrevistando os parentes, por outro lado, suas referências
tendem a ser as mais vagas possíveis, quando não contraditórias. Sai-se, desse
tipo de entrevista, conhecendo menos sobre a pessoa pesquisada do que quando se
entra nelas.
O quanto a sua esposa
conhece da sua atividade literária, escritor amigo? “Ah, mas ela não se
interessa por Literatura”, você poderá dizer. Seja didático e desperte o seu
interesse pelas letras ou, pelo menos, pelo que “você” escreve. O que seus
filhos sabem sobre os livros que você já publicou? Pelo menos os leram? Têm
noção da sua qualidade? Meus filhos, à exceção da minha primogênita, a Tatiana,
(infelizmente) conhecem pouco, pouquíssimo da minha obra.
Não podemos, contudo,
agir como se fôssemos viver para sempre. Não vamos! Temos que batalhar para que
o fruto do nosso talento e da nossa inteligência nos sobreviva e seja útil às
futuras gerações. Se não for para preservar nossas obras, respondam, com lógica
e tirocínio: para quê produzi-las? Para que tenham fugaz “brilhareco” (na
maioria, nem isso) e depois sejam esquecidas, como se nunca houvessem existido?
Isso vai contra todo o senso lógico e prático de que me julgo dotado!
O que você tem feito
para preservar a memória da sua família? Tem, pelo menos, conversado com os filhos,
sobre a trajetória familiar? Vem guardando documentos e referências que
permitam reconstituir, um dia – se não com precisão, pelo menos de maneira
bem próxima à realidade – aquilo que
você é e faz?
Não se trata, creia, de
mera vaidade. Longe disso. Trata-se de ser prático e de não deixar que
preciosas experiências e obras se percam por relaxo ou desinteresse. Se não
forem preservadas, certamente se perderão. Lembre-se que, na qualidade de
escritor, você é (mesmo que não se dê conta ou relute em aceitar) figura
pública e, portanto, potencialmente alvo do interesse geral. Não deixe sua
memória morrer!
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment