Sunday, August 07, 2016

Em busca do ser humano perfeito

Pedro J. Bondaczuk

O permanente desafio da habilidade física do homem,  que começou a se configurar, em 776 AC em Olímpia, lugarejo da Grécia considerado um bosque sagrado, na margem direita do Rio Alfeu, na antiga Élida, teve, nesta sexta-feira, 5 de agosto de 2016, seu momento de consagração. Refiro-me à abertura oficial, com toda a pompa e circunstância que o evento merece,  dos 31ºs. Jogos Olímpicos da Era Moderna, que começam a ser disputados na maravilhosa “Cidade Maravilhosa, na primeira Olimpíada a ser disputada na América do Sul".

Um número estimado entre quatro e cinco bilhões de pessoas mundo afora puderam assistir a um magnífico espetáculo em um palco nobilíssimo, que é o estádio do Maracanã, uma espécie de templo do futebol mundial. Mais de cinco mil atletas, de várias modalidades,estão congregados no Rio de Janeiro para uma "guerra" diferente, sem mortos, feridos e sem destruição, através da mística do esporte. Começa hoje o festival de graça, beleza, saúde, força e competência, que se repete a cada quatro anos (à exceção do período das duas guerras mundiais), há já mais de um século, representado pelo triplo desafio à habilidade do único animal racional da natureza: "mais alto, mais forte e mais rápido".

O evento revive, embora com características próprias, o congraçamento que ocorria aos pés do Monte Olimpo, na Grécia Antiga, há quase 2.500 anos. As modalidades esportivas em disputa, é verdade, são outras, bem diversas das Olimpíadas originais. A motivação também é bastante diferente, assim como a abrangência da competição. Trata-se de outra realidade, em novos tempos, com objetivos e motivações característicos da nossa era. O que não mudou, no entanto, foi o ideal: competir com lealdade, honra e respeito ao adversário, sem jamais considerá-lo inimigo.

Fosse possível reunir em um único homem (ou numa única mulher) as melhores habilidades  dos atletas ganhadores das medalhas de ouro em cada modalidade dos dias de hoje – alguém que corresse 100 metros em menos de 10 segundos, como Usain Bolt, nadasse a mesma distância em menos de 50, saltasse com vara mais de 6,10 metros, sem ela quase 9 metros, ou em três saltos ultrapassasse os 18 metros, ou em um só arranque levantasse mais de 500 quilos – esse seria um ser humano fisicamente perfeito.

Recordes que pareciam impossíveis de serem quebrados, foram há muito superados. Outras dezenas deles, certamente, vão cair nos próximos dias no Rio de Janeiro.  É o homem sempre em busca dos seus limites. São a garra, a lealdade, a disciplina, o "fairplay", a graça, a beleza, a força e a competência em exibição. De quatro décadas para cá, os Jogos mudaram, assim como o mundo. Embora muitos países ainda façam da competição (ou tentem fazer) veículo de propaganda de ideologias e sistemas políticos, o que conta, de fato, é o talento dos atletas. São o seu coração, a sua garra, o seu treinamento, o seu autodomínio e a sua capacidade de superação dos próprios limites. E os interesses em jogo mudaram.

As Olimpíadas perderam sua característica original, de mera competição esportiva. Tornaram-se, sobretudo, grande negócio, com as "bênçãos" dos novos e sofisticados meios de comunicação, como a televisão comercial, a TV a cabo e a Internet. E nem são mais os países que agora são defendidos pelos atletas. São as grandes corporações e os fabricantes de materiais esportivos (Nike, Olympikus, Diadora, Addidas etc.) que os patrocinam. 

Com a profissionalização, verificada de 1980 para cá, através de patrocínios oficiais ou privados, os participantes desse desafio esportivo quadrienal aproximam-se da perfeição, nas respectivas modalidades. Dedicam-se exclusivamente ao esporte e com isso aniquilam recordes e mais recordes, aparentemente impossíveis de quebrar, mas que continuam caindo.

Os Jogos da era moderna, principalmente desde Moscou, são caracterizados por espetáculos notáveis de música e coreografia, na abertura e no encerramento das competições. É possível que as Olimpíadas do futuro – quem sabe nas de 2096 – abram espaço para os "atletas do intelecto e da sensibilidade". Se isso acontecer, a juventude sadia e bonita do Planeta irá compor, de forma coletiva, o perfil do homem ideal: mente sã, num corpo absolutamente sadio.


Há distorções e burlas, evidentemente. São muitos, por exemplo, os que se valem de expedientes ilícitos, como o doping, sem medir conseqüências, no afã de vencer a qualquer custo. Quem sabe um dia seja instituída a Olimpíada da Solidariedade, reunindo não apenas um grupo de indivíduos fisicamente excepcionais, mas toda a humanidade, em que a força e a destreza sejam substituídas por virtudes infinitamente mais nobres e raras: bondade e fraternidade. Só então poderemos afirmar, com segurança, que esse animal fascinante e contraditório afinal aprendeu a domar seus instintos de fera e é, de fato, racional, civilizado, "Homo Sapiens". Até então...

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