Em busca do ser humano perfeito
Pedro
J. Bondaczuk
O permanente desafio da
habilidade física do homem, que começou
a se configurar, em 776 AC em Olímpia, lugarejo da Grécia considerado um bosque
sagrado, na margem direita do Rio Alfeu, na antiga Élida, teve, nesta
sexta-feira, 5 de agosto de 2016, seu momento de consagração. Refiro-me à
abertura oficial, com toda a pompa e circunstância que o evento merece, dos 31ºs. Jogos Olímpicos da Era Moderna, que
começam a ser disputados na maravilhosa “Cidade Maravilhosa, na primeira
Olimpíada a ser disputada na América do Sul".
Um número estimado
entre quatro e cinco bilhões de pessoas mundo afora puderam assistir a um
magnífico espetáculo em um palco nobilíssimo, que é o estádio do Maracanã, uma
espécie de templo do futebol mundial. Mais de cinco mil atletas, de várias
modalidades,estão congregados no Rio de Janeiro para uma "guerra"
diferente, sem mortos, feridos e sem destruição, através da mística do esporte.
Começa hoje o festival de graça, beleza, saúde, força e competência, que se
repete a cada quatro anos (à exceção do período das duas guerras mundiais), há
já mais de um século, representado pelo triplo desafio à habilidade do único
animal racional da natureza: "mais alto, mais forte e mais rápido".
O evento revive, embora
com características próprias, o congraçamento que ocorria aos pés do Monte
Olimpo, na Grécia Antiga, há quase 2.500 anos. As modalidades esportivas em
disputa, é verdade, são outras, bem diversas das Olimpíadas originais. A
motivação também é bastante diferente, assim como a abrangência da competição.
Trata-se de outra realidade, em novos tempos, com objetivos e motivações
característicos da nossa era. O que não mudou, no entanto, foi o ideal:
competir com lealdade, honra e respeito ao adversário, sem jamais considerá-lo
inimigo.
Fosse possível reunir
em um único homem (ou numa única mulher) as melhores habilidades dos atletas ganhadores das medalhas de ouro
em cada modalidade dos dias de hoje – alguém que corresse 100 metros em menos de
10 segundos, como Usain Bolt, nadasse a mesma distância em menos de 50,
saltasse com vara mais de 6,10 metros, sem ela quase 9 metros, ou em três
saltos ultrapassasse os 18 metros, ou em um só arranque levantasse mais de 500
quilos – esse seria um ser humano fisicamente perfeito.
Recordes que pareciam
impossíveis de serem quebrados, foram há muito superados. Outras dezenas deles,
certamente, vão cair nos próximos dias no Rio de Janeiro. É o homem sempre em busca dos seus limites.
São a garra, a lealdade, a disciplina, o "fairplay", a graça, a
beleza, a força e a competência em exibição. De quatro décadas para cá, os
Jogos mudaram, assim como o mundo. Embora muitos países ainda façam da
competição (ou tentem fazer) veículo de propaganda de ideologias e sistemas
políticos, o que conta, de fato, é o talento dos atletas. São o seu coração, a
sua garra, o seu treinamento, o seu autodomínio e a sua capacidade de superação
dos próprios limites. E os interesses em jogo mudaram.
As Olimpíadas perderam
sua característica original, de mera competição esportiva. Tornaram-se,
sobretudo, grande negócio, com as "bênçãos" dos novos e sofisticados
meios de comunicação, como a televisão comercial, a TV a cabo e a Internet. E
nem são mais os países que agora são defendidos pelos atletas. São as grandes
corporações e os fabricantes de materiais esportivos (Nike, Olympikus, Diadora,
Addidas etc.) que os patrocinam.
Com a
profissionalização, verificada de 1980 para cá, através de patrocínios oficiais
ou privados, os participantes desse desafio esportivo quadrienal aproximam-se
da perfeição, nas respectivas modalidades. Dedicam-se exclusivamente ao esporte
e com isso aniquilam recordes e mais recordes, aparentemente impossíveis de
quebrar, mas que continuam caindo.
Os Jogos da era
moderna, principalmente desde Moscou, são caracterizados por espetáculos
notáveis de música e coreografia, na abertura e no encerramento das
competições. É possível que as Olimpíadas do futuro – quem sabe nas de 2096 –
abram espaço para os "atletas do intelecto e da sensibilidade". Se
isso acontecer, a juventude sadia e bonita do Planeta irá compor, de forma
coletiva, o perfil do homem ideal: mente sã, num corpo absolutamente sadio.
Há distorções e burlas,
evidentemente. São muitos, por exemplo, os que se valem de expedientes
ilícitos, como o doping, sem medir conseqüências, no afã de vencer a qualquer
custo. Quem sabe um dia seja instituída a Olimpíada da Solidariedade, reunindo
não apenas um grupo de indivíduos fisicamente excepcionais, mas toda a humanidade,
em que a força e a destreza sejam substituídas por virtudes infinitamente mais
nobres e raras: bondade e fraternidade. Só então poderemos afirmar, com
segurança, que esse animal fascinante e contraditório afinal aprendeu a domar
seus instintos de fera e é, de fato, racional, civilizado, "Homo
Sapiens". Até então...
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment