Questão subjetiva
Pedro J. Bondaczuk
Um dos maiores
problemas enfrentados pelos profissionais do texto (incluindo, aqui, e diria
que “principalmente”, o escritor) é a maneira como quem lê interpreta o que
escreveram. Muitas vezes você defende determinada tese e o leitor entende que a
atacou e vice-versa. Na maior parte desses casos, o fato se deve à falta de
clareza do redator. No entanto... nem sempre.
Há casos em que você é
conciso, direto, claro e objetivo e ainda assim lhe atribuem intenções que
você, na verdade, nunca teve. Não há como evitar. É um dos riscos que você
corre ao partilhar pensamentos, sentimentos e, sobretudo, opiniões, com pessoas
que você não conhece (e que provavelmente jamais conhecerá). Na maior parte das
vezes, essa interpretação equivocada não lhe traz nenhum prejuízo (a não ser um
ou outro pequeno aborrecimento). Contudo... há ocasiões em que isso se torna
grave, gravíssimo.
Farei com vocês uma
pequena provocação intelectual. Responda, sem precisar justificar: quem, no seu
entender, foi melhor escritor, Leon
Tolstoi ou Fedor Dostoievski? Estendo a pergunta para o plano local. Qual, a
seu critério, é o melhor romancista brasileiro de todos os tempos, Machado de
Assis ou Guimarães Rosa? Acho uma covardia esse tipo de pergunta. Em Literatura,
considerando os nomes mais representativos e consagrados dessa nobre atividade,
não há esse negócio de “melhor” e
“pior”. Cada qual tem lá seus méritos e seus deméritos. Ademais, depende
do gosto de quem julga. E este não se discute. O que há é escritor bom
(criativo, original, de estilo atrativo e perito no manejo do idioma) e escritor ruim (que não dispõe de nenhuma
dessas virtudes). E este último, salvo raríssimo acaso, é logo esquecido e não
“emplaca” seu nome e nenhum livro para posteridade. É verdade que muitos bons
também findam por serem esquecidos. Mas... Deixa pra lá!
O jornal Folha de S. Paulo, mais especificamente seu caderno “Mais!”,
em uma edição especial que circulou, se não me engano, em dezembro de 1999
(lá se vão bons dezesseis anos e cinco meses), fez uma enquete com vários intelectuais conhecidos (e respeitados por sua vasta
cultura, notadamente a literária). Perguntou-lhes quais eram, no seu entender,
os dez livros mais marcantes de todos os tempos. Como seria de se esperar, não
houve consenso a propósito (e nem poderia haver, óbvio).
Foram relacionadas diversas listas, uma de cada consultado. Raros
foram os livros que apareceram em todas as relações. Dos que foram citados,
nenhum merece a menor restrição. Todos são obras consagradas, hoje tidas e
havidas como clássicos da literatura mundial. O que me chamou a atenção não
foram os livros mencionados, mas os omitidos.
Milhares e milhares deles foram esquecidos por parte dos pesquisados.
E tenho absoluta certeza que, tão logo a edição especial foi publicada, os que
participaram dela se deram conta da omissão e ficaram aflitíssimos por isso.
Fosse feita uma relação pelo menos minimamente justa, dos livros que mereceriam
destaque nessa pesquisa, o caderno “Mais!” circularia com milhares e milhares
de páginas o que, óbvio, seria absolutamente inviável.
Entendam, não estou
criticando a referida enquete, embora não veja nenhuma utilidade dela. Eu não a
faria. Estou apenas demonstrando os riscos de se utilizar os adjetivos “melhor”
ou “pior” para avaliar livros (e seus autores, claro). Por várias razões, sou visceralmente contrário
a esse tipo de enquête. Creio que elas nada acrescentam à cultura literária e
apenas geram controvérsias. Claro que em papos informais, em mesas de botequim,
esse assunto rende magníficas discussões, regadas a chope bem gelado acompanhado
de tira-gostos. Mas jamais se chegará a uma
conclusão objetiva, consensual e minimamente justa.
A utilidade prática, portanto, desse tipo de consulta é zero. E é bom
que assim seja. Como curiosidade... vá lá... Mas... Afinal, quem sabe o seu livro, caríssimo
escritor que acompanha atentamente esse meu bla-bla-blá, não mereça (ou não
venha a merecer algum dia) constar de alguma lista dos melhores
e não conste de nenhuma? E
você, certamente, não gostaria que isso acontecesse, de se sentir injustiçado. Afinal, essa é uma
sensação horrível e intragável!
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