Falta
só bom-senso
Pedro J. Bondaczuk
A tensão do Golfo Pérsico, agora agravada com o
lamentável incidente ocorrido na sexta-feira na cidade de Meca, quando 600
peregrinos foram mortos pela polícia saudita após um tumulto ocorrido nesse
centro mais sagrado da religião muçulmana (caso não surja um providencial
bombeiro que apague o fogo das paixões, com uma farta dose de bom-senso), tende
a afetar a, praticamente, todo o mundo.
O líder religioso dos xiitas, aiatolá Ruhollah
Khomeini, havia prometido, no início da semana passada (portanto, antes dos
fatos verificados na sexta-feira, na Arábia Saudita), que deflagraria uma crise
de petróleo, de caráter global, se o seu país não fosse deixado em paz. Mais
motivo ele tem agora para agir assim.
Não foi sequer necessário que o fizesse. O próprio
mercado, sensível ao extremo a variações políticas bruscas nas zonas de
produção, reagiu, ontem, de forma quase que imediata, mas esperada, desenhando
um quadro inquietador. O preço do barril de petróleo começou a subir
vertiginosamente.
Em Londres, o óleo extraído do Mar do Norte teve a
sua maior alta em 18 meses, saltando para a casa dos US$ 20,85 e ameaçando
seguir, nos próximos dias, nessa escala ascendente. Em Nova York, o petróleo
tipo Texas, referencial norte-americano, foi ainda mais para cima. Atingiu os
US$ 22,33.
Estamos, portanto, ao que tudo indica, às vésperas
de um novo choque envolvendo essa cada vez mais escassa e vital matéria-prima.
Os que mais sofrem em situações como essa, obviamente, são países que não têm
auto-suficiência do produto, como é o caso do Brasil.
A cada novo centavo de dólar que se acrescentar nos
custos unitários do barril de óleo, serão centenas de milhões a mais que
teremos que gastar das nossas já escassas reservas de divisas, complicando
ainda mais uma situação já por si só grave.
Nós já fomos colhidos em cheio pelas duas crises
anteriores do produto. Elas foram as grandes responsáveis pela dívida externa
brasileira ter saltado, bruscamente, de US$ 6,6 bilhões, em setembro de 1972, para
US$ 112 bilhões, atualmente. E todos sabem, por terem sentido na própria carne
(e ainda estarem sentindo tais efeitos), o quanto de sofrimento tudo isso já
representou.
Faltou bom-senso, desde o início, em toda essa
questão, envolvendo a guerra do Golfo Pérsico. As providências para conter o
conflito deveriam ter sido tomadas há sete anos, quando ele começou, e não
agora, quando o Irã acredita que pode vencer.
Os potenciais bélicos dos dois beligerantes foram
subestimados até muito recentemente. Muitos entendiam que o confronto se
extinguiria, mecanicamente, quando os contendores se exaurissem. Obviamente,
não se extinguiu.
Outros, apostavam numa contra-revolução iraniana,
que depusesse o regime de Khomeini, o que foi fruto de pura desinformação. Nada
disso, como se sabe, sequer esteve próximo de acontecer.
Ainda há tempo para se evitar o pior. Mas é preciso
que a diplomacia prevaleça sobre os inconseqüentes atos de valentia que
assistimos nos últimos dias. O remédio para evitar essa crise que se avizinha,
portanto, é um só: bom-senso.
(Artigo publicado na página 14, Internacional, do
Correio Popular, em 4 de agosto de 1987)
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment