Tuesday, August 16, 2016

Falta só bom-senso



Pedro J. Bondaczuk


A tensão do Golfo Pérsico, agora agravada com o lamentável incidente ocorrido na sexta-feira na cidade de Meca, quando 600 peregrinos foram mortos pela polícia saudita após um tumulto ocorrido nesse centro mais sagrado da religião muçulmana (caso não surja um providencial bombeiro que apague o fogo das paixões, com uma farta dose de bom-senso), tende a afetar a, praticamente,   todo o mundo.

O líder religioso dos xiitas, aiatolá Ruhollah Khomeini, havia prometido, no início da semana passada (portanto, antes dos fatos verificados na sexta-feira, na Arábia Saudita), que deflagraria uma crise de petróleo, de caráter global, se o seu país não fosse deixado em paz. Mais motivo ele tem agora para agir assim.

Não foi sequer necessário que o fizesse. O próprio mercado, sensível ao extremo a variações políticas bruscas nas zonas de produção, reagiu, ontem, de forma quase que imediata, mas esperada, desenhando um quadro inquietador. O preço do barril de petróleo começou a subir vertiginosamente.

Em Londres, o óleo extraído do Mar do Norte teve a sua maior alta em 18 meses, saltando para a casa dos US$ 20,85 e ameaçando seguir, nos próximos dias, nessa escala ascendente. Em Nova York, o petróleo tipo Texas, referencial norte-americano, foi ainda mais para cima. Atingiu os US$ 22,33.

Estamos, portanto, ao que tudo indica, às vésperas de um novo choque envolvendo essa cada vez mais escassa e vital matéria-prima. Os que mais sofrem em situações como essa, obviamente, são países que não têm auto-suficiência do produto, como é o caso do Brasil.
A cada novo centavo de dólar que se acrescentar nos custos unitários do barril de óleo, serão centenas de milhões a mais que teremos que gastar das nossas já escassas reservas de divisas, complicando ainda mais uma situação já por si só grave.

Nós já fomos colhidos em cheio pelas duas crises anteriores do produto. Elas foram as grandes responsáveis pela dívida externa brasileira ter saltado, bruscamente, de US$ 6,6 bilhões, em setembro de 1972, para US$ 112 bilhões, atualmente. E todos sabem, por terem sentido na própria carne (e ainda estarem sentindo tais efeitos), o quanto de sofrimento tudo isso já representou.

Faltou bom-senso, desde o início, em toda essa questão, envolvendo a guerra do Golfo Pérsico. As providências para conter o conflito deveriam ter sido tomadas há sete anos, quando ele começou, e não agora, quando o Irã acredita que pode vencer.

Os potenciais bélicos dos dois beligerantes foram subestimados até muito recentemente. Muitos entendiam que o confronto se extinguiria, mecanicamente, quando os contendores se exaurissem. Obviamente, não se extinguiu.

Outros, apostavam numa contra-revolução iraniana, que depusesse o regime de Khomeini, o que foi fruto de pura desinformação. Nada disso, como se sabe, sequer esteve próximo de acontecer.

Ainda há tempo para se evitar o pior. Mas é preciso que a diplomacia prevaleça sobre os inconseqüentes atos de valentia que assistimos nos últimos dias. O remédio para evitar essa crise que se avizinha, portanto, é um só: bom-senso.  

(Artigo publicado na página 14, Internacional, do Correio Popular, em 4 de agosto de 1987)


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